Há um ano, Larry Fink disse na sua tradicional carta aos CEOs das empresas investidas que o aquecimento global traria uma ‘mudança fundamental para as finanças’.
Doze meses e uma pandemia depois, o CEO da maior gestora de ativos do mundo saiu da fase da catequese sobre os benefícios da sustentabilidade e partiu para o pragmatismo: quer que as empresas divulguem planos específicos de como seus modelos de negócio se alinham com uma economia neutra em carbono até 2050.
“Esperamos que vocês divulguem como esse plano é incorporado para sua estratégia de longo prazo e revisado pelo conselho de administração”, escreveu, deixando claro que espera mais que cartas de intenções.
Parece um pedido — mas, mais do que isso, é um poderoso recado.
A BlackRock tem um poder singular de influenciar as companhias no mundo todo, decidindo onde e como aloca os seus US$ 9 trilhões sob gestão.
E, mais do que a carta aos CEOs, uma série de compromissos assumidos hoje pela própria gestora reforçam como ela pretende exercer essa influência.
A Blackrock se comprometeu a ajustar o processo de investimento nos seus fundos de gestão ativa com o que chamou de “modelo de escrutínio de alto grau” para mudança climática, o que inclui “colocar os ativos em observação para potencial saída”. Em outras palavras, quem não se adequar pode sair do universo investível.
Além disso, a gestora se comprometeu a aumentar o foco do seu engajamento — o chamado ‘stewardship’ — com as companhias em direção à sustentabilidade. Em bom português: deve turbinar sua atuação nas assembleias de acionistas para votar contra propostas em desacordo com o combate à mudança climática.
Em 2020, a Blackrock votou contra propostas levadas em assembleia por 69 empresas e contra a recondução de 64 conselheiros por questões relacionadas ao clima. Ameaçou fazer o mesmo com 191 empresas que foram colocadas ‘em observação’.
Outros compromissos miram a fatia de fundos passivos, que seguem índices, da gestora e são um alvo constante de críticas em relação ao engajamento. Boa parte deles segue índices como o S&P 500 ou o MSCI World, compostos por empresas muito intensas em emissões de carbono.
Nesse sentido, a gestora está cada vez mais apostando na criação de ETFs de sustentabilidade, nos quais tem discricionariedade sobre quais companhia incluir ou excluir.
Para 2021, quer tornar o net-zero uma estratégia investível: a companhia se comprometeu a lançar produtos de investimento com objetivos explícitos de alinhamento à meta de limitar o aumento da temperatura na Terra, incluindo produtos alinhados ao caminho da neutralidade em carbono.
A BlackRock também pretende desenvolver uma métrica de alinhamento de temperatura para o portfólio de ações e bonds, “onde houver disponibilidade de dados suficiente”. Na mesma linha, comprometeu-se a publicar a proporção dos ativos sob gestão que atendem atualmente à neutralidade em carbono e anunciar uma meta intermediária na proporção dos ativos que estarão alinhados com o net zero em 2030.
Transparência
Na carta aos CEOs, Fink sublinha que 2020 deixou claro que não há trade-off entre sustentabilidade e retorno. Muito pelo contrário.
“Dentro de setores — de automóveis a bancos a companhias de petróleo e gás — estamos vendo outras divergências: empresas com melhores perfis ESG estão performando melhor que seus pares, se aproveitando de um prêmio de sustentabilidade”, escreveu. “Quanto mais as empresas abraçarem a mudança climática e as oportunidades que ela traz, mais o mercado as recompensará com valuations mais altos”.
O executivo defendeu ainda ao aumento da transparência, cobrando uma postura pró-ativa das empresas em relação aos riscos e oportunidades trazidos pela mudança climática. “As empresas têm que se mover rapidamente para lidar com essas questões, em vez de esperar que os reguladores as imponham.”
Desde o ano passado, a BlackRock vem cobrando das investidas o alinhamento ao Task-Force on Climate Related Disclosures (TCFD), e ao Sustainability Accounting Standards Board (SASB), que traz as questões ESG consideradas mais importantes para cada setor.
Para além do clima, CEO da BlackRock defendeu a importância da diversidade e da inclusão.
“Nos relatórios de sustentabilidade, pedimos que as divulgações sobre estratégia de talentos reflitam seus planos de longo prazo para melhorar diversidade, equidade e inclusão, como for apropriado por região”, apontou.
E lembrou que no ESG, mais que atribuir cada fator a uma caixinha específica, é importante ter uma estratégia holística que tenha como fim gerar valor para todos os stakeholders envolvidos.
“A mudança climática, por exemplo, já está tendo um impacto desproporcional sobre as comunidades de baixa renda ao redor do mundo — isso seria uma questão ‘E’ ou ‘S’? O que importa menos é a categoria em que colocamos essas questões, mas a informação que temos para entendê-las e como elas interagem umas com as outras”.