Mais da metade da carteira de crédito corporativo dos bancos brasileiros está exposta ao risco de mudanças climáticas e cerca de 44% têm exposição relevante a riscos ambientais além do clima, aponta um levantamento feito pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
Os dados, referentes a 2020, fazem parte de uma nova taxonomia verde desenvolvida pela entidade de classe para identificar riscos e oportunidades socioambientais, num momento em que a agenda climática ganhou força e entrou de vez na agenda de regulação do Banco Central.
Segundo a nova classificação, 21,75% do crédito concedido a pessoas jurídicas no ano passado foram destinados para a chamada ‘economia verde’. Em números absolutos, foram R$ 376 bilhões de um total de R$ 1,73 trilhão em crédito corporativo.
Mas, como em toda a taxonomia, há limitações relevantes — e para ter uma compreensão mais ampla do resultado, é preciso ler as letras miúdas.
Para enquadrar as atividades, a Febraban utiliza como base a Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE), desenvolvida pela Receita Federal e aplicada por todo o sistema estatístico nacional. É o mesmo modelo utilizado pela União Europeia para a sua taxonomia verde.
Mas, apesar de facilitar a harmonização e padronização, em alguns casos, a CNAE não permite qualificar a atividade do ponto de vista de seu perfil sustentável.
É o caso de ‘geração de energia’, categoria que não faz distinção entre fontes fósseis ou renováveis. Na taxonomia da Febraban, a atividade foi enquadrada na ‘economia verde’, considerando que a maior parte da geração no Brasil advém de fontes limpas.
“Vamos começar um engajamento com a Concla, que é quem faz a classificação dos CNAEs, para pleitear uma mudança ao menos em setores relevantes, como o de energia”, afirma Beatriz Secaf, assessora de sustentabilidade da Febraban.
Por outro lado, como a avaliação hoje abarca apenas o crédito para pessoas jurídicas, a taxonomia pode subestimar alguns setores relevantes para a economia verde, como linhas voltadas para pessoa física em agricultura sustentável.
A intenção, diz a Febraban, não é determinar uma taxonomia estanque, mas dar um norte para o setor.
“Nosso objetivo é acompanhar os fluxos de crédito sob o olhar socioambiental, com uma visão de carteira, que pode ser posteriormente aprofundada. No entanto, é importante dar transparência ao trabalho, inclusive para que possa ser adaptado para uso por outros agentes do mercado”, disse o presidente da Febraban, Isaac Sidney, em nota.
Além de dar um raio-X do setor, a ideia é que os bancos redobrem a atenção com atividades consideradas de alto risco ambiental e climático, aplicando filtros adicionais capazes de avaliar o risco específico de cada projeto.
Cinquenta tons de verde
Apesar de ser batizada de verde, a classificação da Febraban envolve tanto aspectos ambientais quanto sociais e o conceito de ‘economia verde’ engloba setores com contribuição alta ou moderada para ao menos um desses aspectos.
Na prática, dos R$ 376 bilhões concedidos para ‘economia verde’ no ano passado, 28% foram para setores de alta contribuição social ou ambiental. Aqui, as rubricas com maior contribuição são ‘atenção à saúde humana’, ‘transporte aquaviário’ e ‘educação’.
Os 72% restantes, ou R$ 269 bilhões, ficaram para setores de contribuição moderada, sendo que mais da metade, ou R$ 147 bilhões, foram para ‘eletricidade, gás e outras utilidades’. Aqui, ficaram de fora atividades como produção e exploração de gás, que tem um CNAE separado. Mas o transporte de gás e transmissão de energia foi mantido.
Aperfeiçoando o modelo
A Febraban já tinha um modelo para classificar atividades expostas à economia de baixo carbono e expostas a riscos ambientais desde 2015, mas a nova versão é turbinada.
Com apoio da Sitawi, a nova taxonomia da Febraban incorporou diversas referências internacionais, como a Task-Force on Climate Related Disclosures (TCFD), padrão global para reporte de riscos e oportunidades climáticas, a classificação da União Europeia, além dos Climate Bonds Standards e do Social Bond Principles, que balizam as emissões de títulos verdes e sociais.
Esses parâmetros permitiram incluir a categoria de “exposição a mudanças climáticas”, que antes não existia, além de aperfeiçoar a avaliação de exposição a riscos ambientais — em linhas gerais, empreendimentos que, por lei, dependem de licenciamento ambiental.
Além disso, a abrangência da análise é maior. Antes, a metodologia consolidava apenas as informações enviadas por bancos que aderiam voluntariamente e representavam cerca de 86% do mercado de crédito para clientes pessoa jurídica.
Agora, a base de dados inclui todas as operações de crédito PJ registradas no Sistema de Informações de Crédito, o SCR, do Banco Central.
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