O Brasil registrou no ano passado o maior avanço nas emissões de gases de efeito estufa em quase 20 anos. O país emitiu 2,42 bilhões de toneladas brutas de CO2 equivalente, o que representa um aumento de 12,2% em comparação com as 2,16 bilhões de toneladas de 2020.
Publicados às vésperas da COP27, a conferência do clima da ONU, os dados mostram o tamanho do desafio do Brasil para cumprir suas metas de redução de emissões e para recuperar sua imagem como um país competitivo na esfera climática perante a comunidade internacional.
Como em 2003, ano do recorde histórico, o número foi puxado justamente pela disparada no desmatamento na Amazônia. A mudança do uso da terra respondeu por 49% das emissões do país em 2021.
Os números fazem parte do relatório anual do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima.
“Fica muito claro que neste momento temos um governo que se revelou uma bomba climática, uma máquina de gerar carbono para a atmosfera”, afirmou Márcio Astrini, secretário-executivo da entidade.
Com exceção do setor de resíduos, quase todos os outros relevantes nas emissões nacionais apresentaram altas significativas. Os maiores crescimentos foram registrados em geração de energia (12,2%) e processos industriais e uso de produtos (8%).
A explicação, nesse caso, se deve em parte à retomada econômica depois do desaquecimento econômico causado pela pandemia. No mundo todo, as emissões de CO2 tinham caído 4,7% em 2020 e voltaram a subir no ano passado.
Mas a emergência sanitária, entretanto, está longe de ser o único fator responsável, afirmam os autores do levantamento.
No que diz respeito à energia, além de mais consumo houve mais geração de eletricidade usando fontes sujas — manchando uma das principais credenciais do Brasil, que é justamente a matriz formada por renováveis.
A crise hídrica do ano passado obrigou o governo a acionar usinas termelétricas. Enquanto o consumo de eletricidade cresceu 4%, as emissões da geração subiram 46%. A seca também teve impacto na produção de cana, o que elevou o preço do etanol e reduziu a participação desse combustível limpo nos transportes.
Desmatamento
Como nos anos anteriores, a mudança no uso da terra é a principal fonte dos gases de efeito estufa liberados na atmosfera pelo país.
A destruição da vegetação dos biomas brasileiros foi responsável pelo lançamento de 1,19 bilhão de toneladas brutas de CO2 na atmosfera. Esse total é maior que todas as emissões do Japão (1 bilhão de toneladas em 2020).
O aumento foi de 18,5% em relação ao ano anterior, um salto somente superado pelos 30% verificados em 2003.
A área que mais contribuiu para as emissões de mudanças de uso da terra foi a Amazônia, com 77% do total. “O desmatamento no ano passado foi o maior desde 2006, quando estava em franco descréscimo”, disse Bárbara Zimbres, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Em números absolutos, a agropecuária, outra atividade relevante no balanço de carbono brasileiro, registrou o maior valor desde que começou a série histórica do SEEG.
Foram 601 milhões de toneladas de gases que causam efeito estufa. Se fosse um país, o setor ocuparia a 16ª posição no ranking dos maiores emissores globais, à frente da África do Sul.
O maior vilão do campo brasileiro é a pecuária, mais precisamente o metano liberado na digestão bovina. O rebanho bovino aumentou 3,1% em 2021, um crescimento seis vezes superior à média dos últimos 18 anos.
“Considerando as metas de redução das NDCs [os compromissos nacionais do Acordo de Paris], o patamar atual torna o alcance dessas metas cada vez mais distantes”, afirma Renata Potenza, coordenadora de clima e cadeias agropecuárias do Imaflora.
Resíduos
A única boa notícia do relatório veio do setor de resíduos, que apresentou uma queda de 0,12%, uma melhora inédita. O recuo foi explicado pela melhoria na disposição final de resíduos sólidos e de aproveitamento do metano gerado em aterros.
O balanço geral aponta uma década perdida no combate à poluição climática, afirma Tasso Azevedo, coordenador do SEEG. “Estamos patinando desde a regulamentação da Política Nacional sobre Mudança do Clima, em 2010.”
As políticas públicas e a tecnologia existem, o que falta é encarar o problema como prioridade, diz o pesquisador. “Governo e sociedade precisam entender que [o controle das emissões] é fundamental para dar segurança à população em tempos de eventos extremos e também para alavancar a economia.”