Com CRA verde, Tobasa quer expandir bioindústria do babaçu

Emissão de R$ 32 milhões vai financiar produção baseada em extrativismo sustentável e que favorece integração lavoura-pecuária-floresta

Coco de babaçu e produtos derivados do fruto, como palha e álcool, expostos em uma mesa de forma circular.
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Encravada no norte de Tocantins, a Tobasa fornece desde óleo e farinhas para a indústria alimentícia até carvão ativado para filtros de água residenciais e industriais. Tudo a partir do coco de babaçu – e sem derrubar uma árvore sequer. 

Fundada há 54 anos, a companhia desenvolveu uma tecnologia para aproveitamento integral do fruto, obtido com uma rede de cerca de 1,5 mil famílias extrativistas, que recolhem o coco que cai dos babaçuais num raio de 300 km do Bico do Papagaio, que se estende também por Maranhão e Piauí.

Agora, acaba de captar R$ 32 milhões com um Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) para escalar sua produção, numa operação inédita no mercado de capitais voltada para financiar a bioeconomia e o extrativismo sustentável. 

A emissão, estruturada pela Ecoagro, foi ancorada pela gestora JGP. O título tem vencimento em cinco anos e juros de CDI + 5% ao ano. 

“Os recursos do CRA vão permitir a inclusão de mais famílias agroextrativistas no processo de produção e ampliação de áreas florestais conservadas”, afirma o CEO da companhia, Edmond Baruque Filho, filho do fundador da companhia, que faleceu no ano passado, aos 94 anos. 

Edmond Baruque, o pai, foi um pioneiro: fundou a companhia em 1968 para industrializar o óleo da amêndoa do fruto obtido nas comunidades de quebradeiras de coco. 

Por aproximadamente duas décadas, foram dois os principais produtos comercializados pela Tobasa: o óleo, voltado para a indústria alimentícia e substituto do óleo de palma – um dos principais vetores do desmatamento de florestas tropicais –, e a torta proteica, usada para enriquecer ração animal e alimentos para o consumo humano. 

Isso representava um aproveitamento de apenas 6% do coco de babaçu. 

Ao longo dos anos, a empresa foi desenvolvendo tecnologias para fazer o aproveitamento integral do fruto. Hoje, saem do complexo de quatro fábricas em Tocantinópolis, que emprega 200 funcionários, também farinhas, biomassa e, como carro-chefe, carvão ativado. 

A técnica para produzir esse último produto foi uma revolução no aproveitamento do babaçu.

A Tobasa é dona do maior parque de produção de carvão ativado da América Latina, que atende a indústria de filtros de água e saneamento básico – e é mais sustentável que a alternativa mineral. 

Tradicionalmente, o carvão era obtido a partir das cascas do babaçu. O pulo do gato da empresa foi fabricá-lo a partir do endocarpo, a parte interna que representa 60% do coco. 

Além disso, Baruque Filho, que se formou mestre e doutor em engenharia química, levou a tese industrial para a academia, onde foi desenvolvido o processo de destilação do álcool do coco de babaçu, utilizado na indústria cosmética, de beleza e perfumaria, na produção de bebidas finas e até de biocombustível automotivo.

Dentro da filosofia de aproveitamento integral, a companhia utiliza ainda a biomassa do fruto para produzir parte da energia que consome no seu complexo industrial, gerando calor para abastecer suas caldeiras. 

Integração lavoura-pecuária-floresta 

A Tobasa atua numa região de transição entre o Cerrado e o bioma amazônico, essencial para conter o desmatamento na floresta. 

A matéria-prima vem principalmente de áreas de pecuária – os fazendeiros recebem um valor para liberar a circulação e atuação dos extrativistas. 

“O pequeno e médio pecuarista também se fortalece com a bioindústria e é beneficiário da coleta do coco de babaçu, que garante o manejo sustentável da floresta nativa”, afirma Baruque Filho. “A bioindústria do babaçu possibilita a integração harmoniosa entre lavoura, pecuária e floresta.”

O coco, que cai de palmeiras em uma área de 200 mil hectares de floresta, é coletado por aproximadamente 1500 agroextrativistas. Eles ganham individualmente cerca de R$ 1 mil a R$ 3 mil mensais durante o período de coleta do coco – que vai de julho a dezembro – para complementar a renda obtida com a agricultura familiar. 

Lideranças locais são identificadas pela Tobasa para administrar a atividade extrativista nas comunidades. “Treinamos esses líderes para que eles tenham capacidade de gestão e se tornem microempreendedores, com capital de giro e meios de produção próprios”, diz Baruque. 

Cada liderança coordena o trabalho de aproximadamente 50 famílias e se torna intermediário comercial dos agroextrativistas. Ao todo, são 30 líderes, um para cada região em que o território de atuação da empresa foi subdividido. 

Cabe a eles organizar e levar a coleta para caçambas em entrepostos da Tobasa, que, por sua vez, faz o transporte dos cocos para a fábrica. 

A empresa tem ainda quatro funcionários que atuam como coordenadores de campo. “Eles circulam pelas fazendas para garantir que a coleta seja feita da maneira mais respeitosa e humana possível”, diz o executivo. 

Acesso a financiamento 

O dinheiro captado com o CRA será utilizado para quitar dívidas de empréstimos mais antigos e mais caros e ampliar a produção.  A empresa, que faturou R$ 34 milhões em 2021, planeja um crescimento de 50% na receita nos próximos cinco anos, com o início da exportação de carvão ativado. 

Em 2016, a companhia captou R$ 8 milhões em debêntures com um fundo voltado à sustentabilidade da Amazônia do BNDES, administrado pela firma de private equity Kaeté Investimentos. 

Os juros eram de IPCA mais 10% e davam direito a participação de 45% no lucro líquido da companhia. 

Os recursos se somaram a R$ 5 milhões levantados com a Caixa Econômica Federal e foram alocados no período de 2016 a 2021 para expansão e modernização da fábrica, além da ampliação da área florestal abrangida. 

Nesse período, a empresa triplicou de tamanho, saiu de prejuízo para lucro, e passou a gerar caixa – o que lhe abriu as portas para o refinanciamento da dívida. 

“Com reduções em despesas, a margem Ebitda saiu de 20% em 2018 para 26% em 2021, preservando sua consistência de resultados e inelasticidade de demanda em meio a dois anos de pandemia”, ressaltou a JGP em relatório. 

“Produtos desse tipo [como o CRA] serão mais constantes em nossas carteiras ESG e serão essenciais para cumprirmos os compromissos de neutralidade de carbono em 2040 e desmatamento zero a partir de 2025”, afirmou a gestora em relatório enviado a clientes.