O presidente da Argentina, Javier Milei, ordenou que os negociadores de seu país deixassem a Conferência do Clima das Nações Unidas, que ocorre no Azerbaijão. A COP29 está apenas em seu terceiro dia e deve seguir até a próxima sexta-feira, 22.
Nenhuma justificativa para a decisão foi apresentada ao público até o momento.
Em meio aos eventos climáticos extremos, como a seca que afetou o Brasil e a Argentina, “qualquer redução nos esforços para cumprir os compromissos do Acordo de Paris é uma declaração contra o equilíbrio climático, mas também um enfraquecimento da proteção da vida, dos sistemas agrícolas, dos sistemas energéticos”, disse Marina Silva, ministra do Meio Ambiente do Brasil, em declaração à Climática, após ouvir sobre a retirada da delação argentina. “Por consequência, são geradas perdas econômicas, sociais e ambientais incalculáveis e irreparáveis.”
A notícia imediatamente gerou memes, como o “dólar Milei”, que foram compartilhados a partir de Baku.
Paris em xeque?
A ordem de Milei se refere apenas às duas semanas de negociações e não houve menção ao Acordo de Paris, segundo diferentes autoridades argentinas.
Ainda assim, à sombra da eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, paira sobre a conferência uma preocupação sobre o futuro do acordo climático e a já difícil missão de limitar o aquecimento global a 1,5ºC. O republicano retirou o país do acordo quando foi presidente pela primeira vez e pode fazê-lo de novo.
Existe ainda o temor de que outros líderes, como o próprio Milei, sigam Trump pela porta de saída. O presidente argentino já fez ameaças do tipo durante a corrida eleitoral.
Os dois presidentes, negacionistas da mudança climática, devem se encontrar ainda nesta semana, na mansão do republicano em Mar-a-Lago, na Flórida.
Milei já afirmou, em outras ocasiões, que a crise climática é uma “mentira do socialismo” e que são falsas as afirmações de que os humanos são os culpados pelo aquecimento global – algo que é amplamente fundamentado pela comunidade científica, inclusive pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que apoia a ONU em dados sobre mudanças do clima.
“A decisão da Argentina de deixar as negociações de Baku é um afastamento brusco de sua política climática tradicional, o que não é uma surpresa sob o governo de Milei, que pressionou diplomatas argentinos a tomar posições insustentáveis no passado. Esta decisão é puramente ideológica e vai contra os melhores interesses do país, cuja economia foi severamente impactada pela crise climática”, diz Oscar Soria, CEO do think thank The Common Initiative.
No ano passado, a Argentina foi um dos seis países que não assinou o Pacto para o Futuro da ONU, que traz compromissos para o desenvolvimento sustentável e segurança internacional. À época, Milei criticou a “agenda ideológica” das Nações Unidas.
Acordo de Paris sem Paris
O presidente francês, Emmanuel Macron, já havia informado que não iria à COP29. Hoje, no entanto, a França decidiu que não mandará nenhum político de alto nível para Baku, após acusações feitas pelo presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, durante a conferência.
Esta será a primeira vez desde o Acordo de Paris, firmado em 2015, que a França não terá um representante político.
Aliyev criticou a França e a Holanda por seu suposto “neocoloniasmo” e disse que o governo francês provocou degradação ambiental na Polinésia Francesa e na Algéria ao realizar testes nucleares. Ele também acusou o governo de Macron de ter sido responsável pela violência em Nova Caledônia, em maio deste ano, após mudanças na Constituição.
A França, por sua vez, afirmou que o Azerbaijão e a Rússia estariam alimentando a confusão ao reforçar o discurso de colonialismo.
Apesar de Aliyev conectar as críticas a questões climáticas, as discordâncias entre os países têm raízes mais profundas, com o apoio militar de Paris à Armênia, rival histórica do Azerbaijão, como mostra o Político.
A ministra da Transição Ecológica da França, Agnès Pannier-Runacher, declarou que não irá mais representar seu país em Baku na próxima semana, uma vez que as falas do presidente anfitrião foram “inaceitáveis” e “injustificáveis”.
O esvaziamento da COP29 pelos líderes mais altos de alguns países já era fato conhecido antes de seu início. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não foi à conferência, assim como o alemão Olaf Scholz, o americano Joe Biden e Ursula von der Leyen, líder da Comissão Europeia.