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Lula apela para países apresentarem metas climáticas: “Não é uma opção”

Presidente brasileiro destacou que metas atualizadas são essenciais para as negociações na COP30 

Lula apela para países apresentarem metas climáticas: “Não é uma opção”

Nova York – A menos de dois meses da COP30, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e o secretário-geral da ONU, António Guterres, cobraram que os países apresentem suas metas atualizadas de redução de emissões de gases de efeito estufa, as NDCs. 

“A apresentação de Contribuições Nacionalmente Determinadas não é uma opção, como deixou claro a Corte Internacional de Justiça: é uma obrigação”, afirmou Lula nesta quarta-feira (24), em conferência sobre ação climática na ONU, em Nova York. 

Ele se referiu à decisão histórica do tribunal da ONU deste ano de reconhecer que os Estados têm a obrigação legal de proteger o clima e cumprir seus compromissos assumidos, entre eles os de descarbonização.

Até o momento, 50 países apresentaram suas metas – o prazo inicial era fevereiro, mas foi adiado para 30 de setembro. Esses compromissos, porém, alcançam apenas 24% das emissões globais, segundo a World Resources Institute (WRI). Apenas neste mês, 16 países apresentaram suas propostas, entre eles Austrália, Angola e Chile.

Durante a conferência, a China anunciou que pretende reduzir entre 7% e 10% suas emissões até 2035, em relação ao pico, em uma meta considerada conservadora por observadores internacionais. 

Outra decepção foi com a União Europeia, que não vai entregar sua NDC dentro do prazo e apenas divulgou uma “declaração de intenções”. Candidata a sediar a próxima COP, a Austrália apresentou nesta semana uma meta de cortar emissões entre 62% e 70% até 2035, em relação aos níveis de 2005.

Lula criticou a falta de cooperação internacional no enfrentamento à crise climática. “Vivemos um negacionismo multilateral. Muros nas fronteiras não vão conter secas e tempestades.” Ele destacou que o sucesso da COP30 em Belém depende desse compromisso coletivo. 

Alerta da ciência

Com a presença de outros chefes de Estado e mais de 100 países confirmados, a conferência começou com um senso de urgência em meio a alertas de cientistas sobre o ritmo insuficiente das ações climáticas. 

O pesquisador sueco Johan Rockström, diretor do Instituto de Potsdam, disse que o planeta já está a caminho do aquecimento de 3°C nos próximos 75 anos, caso nada mude. “O aquecimento global está acelerando, com impactos cada vez mais rápidos e fortes”, disse Rockström. 

Apesar do diagnóstico sombrio, o cientista destacou que ainda existe um “caminho estreito” para manter vivo o compromisso de limitar o aquecimento a 1,5°C, desde que a transição energética comece imediatamente, com foco na substituição dos combustíveis fósseis. Segundo ele, isso exigirá não apenas cortes radicais nas emissões, mas também remoções de carbono em escala.

Mas este não é o caminho para onde o mundo está indo: a produção de combustíveis fósseis esperada em 2030 é 120% maior do que seria compatível com o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C, segundo o relatório Production Gap Report, divulgado nesta semana pela Stockholm Environment Institute. Ele, inclusive, aponta a postura “ambígua” do Brasil em relação ao tema, uma vez que o país planeja elevar a produção de petróleo em 56% até 2030, em relação a 2023. 

Em coletiva de imprensa após falar na conferência, Lula defendeu ampliar a exploração de petróleo sob o argumento (considerado contraditório por ambientalistas) de financiar o próprio abandono das fontes fósseis.

De acordo com a UNFCCC, os planos nacionais atuais cortariam as emissões globais em apenas 2,6% até 2030, em comparação aos níveis de 2019, uma pequena fração da redução de 43% que os cientistas dizem ser necessária para manter a temperatura global abaixo de 1,5 grau. 

Guterres cobra urgência

O secretário-geral da ONU, António Guterres, cobrou maior ambição dos países em suas metas. “Os governos precisam ir muito mais longe, muito mais rápido em suas NDCs.”

Ele destacou cinco frentes críticas que precisam avançar ainda nesta década: transição energética, cortes nas emissões de metano, estancamento do desmatamento de florestas, redução de emissões nas indústrias de aço, cimento e transporte marítimo e financiamento para justiça climática.

“Para manter a meta de 1,5°C ao nosso alcance, o mundo precisa de reduções rápidas nos investimentos em carvão, petróleo e gás, redirecionando esses recursos para uma transição energética que priorize equidade e justiça”, afirmou Guterres.

Apesar do apelo, a União Europeia sinalizou que não cumprirá o prazo de submissão de sua nova NDC, que termina neste mês. Os ministros do Meio Ambiente dos 27 países do bloco disseram que tentariam reduzir as emissões entre 66,3% e 72,5% até 2035, em comparação aos níveis de 1990. 

A decisão frustrou a expectativa em torno da conferência, uma vez que a UE tem se posicionado como líder climática. “Com tantos países olhando para a Europa para decidir suas NDCs, isso foi uma oportunidade perdida”, disse Shirley Matheson, coordenadora de aprimoramento de NDC na WWF, ao Financial Times. “Esta declaração de intenções é uma ginástica diplomática para evitar o constrangimento de chegar à COP de mãos vazias.”

Metano no foco

O corte das emissões de metano são cruciais para o mundo, porque ele tem um potencial de aquecimento 80 vezes maior que o carbono.

Além de Guterres, a primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, reforçou a necessidade de avançar além do acordo voluntário firmado em Dubai, durante a COP28, que previa redução de emissões de metano em 30% até 2030 – em relação aos níveis de 2020. “Precisamos de um acordo global e vinculante”, afirmou. 

O tema é sensível para o Brasil, pois é uma das maiores fontes de emissão do país. As emissões de metano brasileiras aumentaram 6% em 2023, em relação a três anos antes, e totalizaram 20,8 milhões de toneladas, segundo o Observatório do Clima. A maior parcela é da pecuária, principalmente da fermentação entérica, o arroto do boi. Em 2023, o setor foi responsável por 75% das emissões nacionais do gás.

Financiamento climático

Os compromissos de financiamento climático também foram cobrados. O secretário-geral da ONU disse que os apoios atuais aos países em desenvolvimento ainda estão muito aquém do necessário. 

“Precisamos chegar a US$ 1,3 trilhão anuais até 2035”, disse Guterres. Ele destacou que esses recursos devem priorizar adaptação, resiliência e uma transição justa.

O secretário-geral criticou o fato de parte significativa dos subsídios públicos globais ainda ser destinada à expansão da infraestrutura fóssil, com risco de criação de ativos encalhados. “É hora de redirecionar fluxos financeiros e regulatórios para soluções que resistam ao tempo”, afirmou.

* O jornalista viajou a convite da Hydro