Onde estão os créditos de carbono brasileiros? Este painel aponta

Ferramenta reúne em um único lugar projetos de conservação e restauro florestal que negociam créditos no mercado voluntário

Onde estão os créditos de carbono brasileiros? Este painel aponta
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Sobre o Apoio

Estimativas não faltam sobre o potencial bilionário dos créditos de carbono florestais e a oportunidade do Brasil como um dos grandes vendedores desses ativos naturais.

Saber quais são e onde estão os projetos de proteção e restauro de vegetações nativas é outra história. Ou era.

Um painel interativo lançado hoje reúne pela primeira vez em um lugar só todas as informações publicamente disponíveis sobre as iniciativas que geram (ou pretendem gerar) carbono florestal no Brasil.

A iniciativa foi do Idesam, entidade sem fins lucrativos com atuação na Amazônia e que defende o sistema de compensações voluntárias – diferente do mercado regulado, em discussão no Congresso – como uma fonte importante de recursos para a proteção da natureza.

A ferramenta inclui apenas os créditos de padrão Verra para atividades como desmatamento evitado (também conhecidos como REDD+), restauro florestal e agricultura, mas esse recorte contempla a imensa maioria dos projetos do país.

Hoje, estes são alguns dos grandes números do mercado voluntário brasileiro compilados pelo Painel de Carbono Florestal:

  • 139 projetos
  • 33 já emitiram créditos
  • 96 têm algum co-benefício socioambiental
  • 60 desenvolvedores
  • 99% dos créditos emitidos vêm da Amazônia Legal
  • 95% dos projetos são realizados em áreas privadas
  • 1,8 bilhão de créditos estimados entre 2020-2050

A interface também mostra a localização de cada um deles no mapa (foto acima) e detalhes como os responsáveis, o tamanho da área coberta e a produção esperada – cada crédito de carbono equivale a uma tonelada de CO2 que deixou de ser emitida ou foi retirada da atmosfera.

Não há dados sobre valores, pois as transações são privadas. Uma possibilidade é incluir no futuro os créditos que foram aposentados, ou seja, tirados de circulação, pois o benefício climático foi contabilizado pelo comprador.  

Trabalho manual

A maior parte do trabalho foi manual, diz Victoria Bastos, líder da área de serviços ambientais do Idesam. “A única maneira de saber mais sobre os projetos era entrar na plataforma da Verra, baixar planilhas e outros documentos e ler tudo, um por um.”

As informações são públicas, mas navegar pelo site da certificadora e saber onde encontrar os vários indicadores não é trivial para os leigos (e mesmo os entendidos reclamam da usabilidade do site da Verra).

A necessidade de uma alternativa mais acessível ficou clara numa reunião de que Bastos participou alguns anos atrás com o governo amazonense.

A certa altura, um integrante da secretaria do Meio Ambiente disse não saber ao certo quantas iniciativas de créditos de carbono existiam no Estado.

“Quando começamos a fazer o levantamento, já tínhamos percebido que a cada mês aparecia algo novo, mas não existia um lugar para acessar as informações de forma rápida e visual”, afirma Bastos.

O painel mostra todos os projetos cadastrados na certificadora, incluindo os ainda em análise. Dos 139 que constam da base de dados, mais da metade ainda se encontra em fase de validação, e somente 33 emitiram créditos.

Os dados serão atualizados a cada três meses, o que não deve ser um problema diante do ritmo – extremamente lento, segundo os críticos – de aprovação pela Verra.

Alertas

A plataforma oferece uma análise da situação fundiária das áreas em que os projetos são realizados, mostrando se o Cadastro Ambiental Rural (CAR) da propriedade já está regularizado, por exemplo.

O Idesam também plotou os empreendimentos em um mapa para verificar se havia sobreposição com áreas públicas.

Em alguns casos a coincidência é pequena e provavelmente causada por um erro, diz Bastos. Outros apresentam problemas potencialmente mais sérios, mas o painel não pretende fazer nenhum tipo de avaliação definitiva.

“Houve um caso de sobreposição em que procuramos o desenvolvedor ainda na etapa de consulta pública. Eles responderam que o Incra já tinha reconhecido a propriedade deles, mas a base de dados pública não estava corrigida.”

O importante, diz Bastos, é que a informação esteja disponível para que eventuais interessados no projeto possam buscar mais detalhes por conta própria.

 O carbono na ponta

Um dos objetivos do painel era mostrar que povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares têm participação pequena como “donos” de projetos.

Essas populações aparecem como proponentes – ou seja, donas dos direitos sobre os créditos e sua comercialização – de somente seis das iniciativas registradas na base da certificadora.

Bastos reconhece que esse dado é uma maneira imperfeita de entender a distância entre o dinheiro movimentado no mercado de carbono e as pessoas que estão na outra ponta, efetivamente protegendo a natureza.

Apresentar um projeto tem um custo inicial alto, exige conhecimento técnico e capacidade de navegar diversos níveis de burocracia. O outro lado da moeda é que depender da ajuda de especialistas muitas vezes leva a assédio e exploração, diz Bastos.

“A gente queria investigar e entender onde estão os projetos, e de fato pouquíssimos estão em territórios coletivos, como assentamentos, terras indígenas, unidades de conservação que têm comunidades.”

Muitos empreendimentos privados preveem remuneração dessas comunidades, mas a única maneira de garantir que os direitos serão respeitados é dando a elas o controle dos créditos.

Bastos afirma que o Idesam, em parceria com o Instituto Socioambiental e o Imaflora, duas outras ONGs brasileiras, vai começar um estudo de viabilidade para a criação de um sistema específico para territórios coletivos que remunere serviços ambientais.

O Idesam é coautor da VM0015, metodologia da Verra e a mais utilizada na geração de créditos de desmatamento evitado.