OPINIÃO

Três COPs e a restauração de ecossistemas como caminho comum

Três COPs e a restauração de ecossistemas como caminho comum
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A deterioração dos solos e florestas avança a quase 1 milhão de quilômetros quadrados por ano. A área degradada no planeta é quase equivalente à de uma Rússia. A seca já afeta 3,2 bilhões de pessoas e, até 2050, três em cada quatro serão prejudicadas. As populações mais vulneráveis, como povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultores familiares e mulheres, são as mais afetadas. No Brasil, a frequência e a duração das secas aumentaram, e este ano enfrentamos a pior das últimas sete décadas.

Ao contrário de furacões ou enchentes, a desertificação e o avanço da seca passaram quase despercebidos. Johan Rockström, do Instituto Potsdam de Pesquisa de Impacto Climático (PIK), alerta que estamos à beira de um precipício e que é urgente acelerar o combate à desertificação.

Em Riad, na Arábia Saudita, representantes de 196 países e da União Europeia encerraram em dezembro passado a 16ª rodada de negociações da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD). Foi a terceira e última COP de 2024. Em outubro, aconteceu na Colômbia a 16ª Conferência de Biodiversidade da ONU, e em novembro, a COP29 sobre mudança do clima no Azerbaijão.

E em novembro, é claro, Belém recebe a COP30.

Apesar do encerramento sem acordo em Riad por divergência de interesses entre países, há consenso sobre a necessidade de unificação de agendas entre essas três COPs. Apesar de distintas, elas estão interligadas.

A desertificação, caracterizada pela degradação do solo, envolve a queda de sua qualidade, de recursos hídricos, da vegetação, da biodiversidade e da produtividade econômica. Agravada pela mudança climática, ela também a intensifica, reduzindo a captura de carbono da atmosfera. Combater a desertificação é essencial e exige ações em diversas frentes.

O primeiro passo é combater o desmatamento, um dos principais fatores de degradação do solo. Em paralelo, é preciso garantir manejo sustentável em áreas com atividade econômica de uso intensivo, adotando práticas como o cultivo mínimo em áreas de agricultura e o plantio de florestas comerciais que sigam os mais elevados padrões internacionais de certificação.

Por fim, a restauração é a solução ideal para áreas degradadas com baixa aptidão econômica ou de alta relevância para conservação da biodiversidade. A retomada da vegetação nativa protege o solo, aumenta a infiltração de água, restabelece a vida e a provisão dos serviços ecossistêmicos ao local.

Para tanto, destravar o investimento privado é fundamental. A UNCCD estima que são necessários US$ 2,6 trilhões de investimentos nos próximos cinco anos para restaurar 1,5 bilhão de hectares até 2030 e, assim, atingirmos a neutralidade na degradação do solo. Desta meta global, 250 milhões de hectares são decorrentes da degradação agrícola, o que representa uma enorme oportunidade para o Brasil.

Nosso país tem potencial para liderar esta transformação, com seus mais de 100 milhões de hectares de pastagens degradadas. Apesar dos desafios, como o desenvolvimento da cadeia de fornecedores que assegure qualidade e rastreabilidade, essas dificuldades também representam oportunidades, justamente pelo potencial de transformação social.

O Brasil pode oferecer ao mundo conhecimento técnico, experiência prática e capacidade de escala. Mais recentemente, um grupo de empresas surgiu para desbravar esse novo setor que pode posicionar o país como fornecedor global de soluções para o enfrentamento da crise climática.

Segundo a McKinsey & Company, o nascente negócio da restauração florestal pode gerar de US$ 16 bilhões a US$ 26 bilhões por ano. Além dos benefícios ambientais, pode criar 880 mil empregos, sendo 57% em áreas de restauração, com baixa atividade econômica.

O sucesso desse setor depende de incentivos financeiros, como novas linhas de financiamento e mecanismos de garantia adaptados às particularidades da restauração florestal. Com uma estratégia nacional coordenada, políticas públicas consistentes e incentivos adequados, o Brasil pode se consolidar como fornecedor de créditos de carbono no mercado global, atraindo bilhões em investimentos, gerar empregos e contribuir para a mitigação das mudanças climáticas, recuperação da biodiversidade e combate à desertificação.

* Cristiano Oliveira é diretor de desenvolvimento de negócios e de sustentabilidade da Biomas; Marina Negrisoli é diretora de sustentabilidade da Suzano; e Gonzalo Muñoz é fundador da Ambition Loop e foi indicado Climate Change High-Level Champion da COP25 (2019)