AGRONEGÓCIO

Metas climáticas da JBS são classificadas como “muito ruins” por estudo

Análise das cinco maiores empresas de alimentos do mundo avalia metas de redução de emissão de gases de efeito estufa e ações para atingi-las

Metas climáticas da JBS são classificadas como “muito ruins” por estudo

“Não está claro”. Essa frase é usada diversas vezes ao longo da análise das metas e políticas climáticas da JBS por duas organizações independentes, o New Climate Institute e a Carbon Market Watch. A transparência e a integridade das estratégias da maior produtora de carnes do mundo para o clima foram avaliadas como “muito ruins”.

De autoria de entidades respeitadas por quem entende do assunto, o estudo faz uma análise detalhada dos planos de descarbonização das cinco maiores empresas de alimentos e agricultura do mundo: Danone, JBS, Mars, Nestlé e Pepsico. O foco foi avaliar as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa e as ações necessárias para atingi-las.

A conclusão: “Constatamos que as empresas agroalimentares apresentam medidas que dificilmente levarão a reduções estruturais e profundas de emissões do setor”, diz o estudo.

Como a maior parte da pegada de carbono do setor vem de processos agrícolas variados, a análise identifica cinco ações chave para a redução das emissões: aumentar a participação de proteína vegetal; interromper o desmatamento; reduzir a aplicação de fertilizantes; e reduzir a perda e o desperdício de alimentos.

“São transições chave para que o setor alcance reduções de emissões a longo prazo, embora a implementação precise começar agora.”

Batizado de Corporate Climate Responsibility Monitor, o levantamento classifica as empresas de acordo com a transparência e a integridade de suas promessas. Nenhuma entrou na categoria “razoável”, que seria a melhor avaliação. 

A mais bem colocada na avaliação geral foi a Danone, com um plano “moderado”. JBS e Pepsico tiveram a pior classificação, “muito ruim”. A empresa americana, porém, teve alguns itens com melhor classificação. Nestlé e Mars tiveram avaliação “ruim”. 

O escrutínio das políticas climáticas da JBS deve crescer com a listagem das suas ações agora também na bolsa de valores de Nova York, além da bolsa brasileira. 

A criação de animais para consumo é responsável por cerca de 15% das emissões que contribuem para o aquecimento global. Desse total, dois terços vêm do gado. O número inclui tanto o metano, gerado na digestão animal e um potente gás causador do do efeito estufa, como o desmatamento para abrir pastagens. 

Emissões da JBS

Única empresa brasileira do setor a constar do levantamento, a JBS tem 97% de suas emissões no chamado escopo 3, que contabiliza as emissões indiretas da cadeia de valor (fornecedores e clientes). 

A principal observação da análise é que a companhia não tem uma meta de redução junto com seu compromisso de net zero em 2040. “Suas metas intermediárias para 2030 levariam a uma redução de 1% nas emissões em comparação com as emissões reportadas em 2019, se interpretadas com generosidade”, diz o estudo.

Há, inclusive, incertezas sobre o próprio compromisso de zerar as emissões líquidas até 2040. A JBS anunciou recentemente que essa é uma “aspiração” e não um compromisso formal. “Nunca foi uma promessa”, disse Jason Weller, diretor global de sustentabilidade da companhia, à Reuters no início do ano. 

No relatório de sustentabilidade de 2023, o último disponível, a meta de net zero é chamada de “objetivo”. Ele informa que, como parte dessa “ambição”, a empresa estabeleceu “o objetivo de definir voluntariamente metas alinhadas com a Science Based Target Initiative (SBTi)”. A entidade dá o selo de maior prestígio para os planos de descarbonização das empresas.

Durante o processo de definição de metas, que levou dois anos, a SBTi criou novos requisitos e metodologias para empresas do setor agropecuário. Segundo a JBS, muitas empresas líderes do setor agropecuário, incluindo ela própria, não prosseguiram com o processo e estariam buscando suas metas ambientais fora desse framework – sem informar quais.

No ano passado a entidade retirou de sua lista as companhias que haviam assumido compromissos net zero, mas não submeteram seus planos para análise dentro do prazo. A lista incluiu a JBS e gigantes globais como Walmart, Unilever e Microsoft.

“Não encontramos evidências de que a JBS esteja embarcando em mudanças importantes que permitiriam reduções profundas de emissões”, diz o estudo. 

Os cálculos de emissão da JBS também são questionados por excluir os gases provenientes da mudança no uso da terra relacionada à produção de carne (leia-se: desmatamento). O próprio estudo traz a justificativa da JBS, que afirma que as principais fontes de emissão (fermentação entérica, manejo de ração e esterco) estão incluídas em suas emissões de escopo 3 reportadas e que os cálculos das emissões sobre o uso do solo “estão sendo aprimorados”. 

“Com o nível de detalhamento atual, a divulgação de emissões da JBS não permite uma compreensão completa das fontes de emissão e da eficácia de potenciais medidas de mitigação”, conclui a análise. 

Outras ações

O estudo avalia que a transição alimentar de proteínas de origem animal para proteínas vegetais é uma mudança importante para a descarbonização do setor agroalimentar, uma vez que a mudança no uso da terra é a maior fonte de emissões agrícolas. 

No caso da JBS, isso é especialmente sensível, já que carnes animais são o principal produto da companhia. A análise menciona que a JBS está expandindo para proteínas vegetais por meio da aquisição de marcas, mas avalia que isso é apenas um acréscimo às suas atividades atuais. “Em vez disso, a JBS está investindo na expansão de sua produção de carne bovina nos EUA, indicando que não está abandonando esse setor”, diz. 

Outro ponto crítico é o desmatamento. Isso porque ele é impulsionado pela expansão de terras agrícolas para a pecuária, ração para o gado e culturas de commodities. Segundo a análise, a JBS não apresenta metas ou medidas ambiciosas para acabar com o desmatamento em sua cadeia de suprimentos. 

A companhia estabeleceu a meta de zerar o desmatamento ilegal em todos os biomas brasileiros até o fim de 2025 para fornecedores diretos e indiretos de gado. O estudo diz, porém, que investigações recentes das organizações Mighty Earth e AidEnvironment mostraram que o desmatamento ilegal ainda estava ocorrendo na cadeia da JBS em 2024. “Portanto, é improvável que a JBS esteja fazendo progresso real em sua meta de desmatamento ilegal”, diz. 

Procurada, a JBS não se pronunciou até o momento.