Líder do varejo de moda no Brasil, a Lojas Renner está com um projeto piloto de cultivo de algodão para regenerar uma área degradada do Cerrado Mineiro. Se a iniciativa se mostrar economicamente viável e escalável, pode ser um passo importante para uma transição massiva das roupas feitas de algodão para um modelo sustentável.
O primeiro plantio ocorreu no ano passado e a colheita deve ser feita no segundo semestre.
Por trás iniciativa, está a reNature, uma empresa de consultoria em agricultura regenerativa fundada há dois anos na Holanda — e que, no caso da Renner, presta consultoria técnica à Farfarm, uma empresa que visa garantir a venda de tecidos sustentáveis a partir de fibras vegetais.
Apesar da sede na Europa, a reNature é bem brasileira.
Seu cofundador é o brasileiro Felipe Villela, que se mudou para Amsterdã há alguns anos atraído pela evolução do tema na Europa. Entre os investidores da reNature está outro brasileiro, Fernando Russo, herdeiro do Grupo Fleury e fundador da Meraki Impact, empresa focada em investimentos de impacto para family offices e investidores privados, sobretudo em alimentos e florestas.
Os principais clientes da reNature são empresas brasileiras e europeias, com fazendas no modelo de agroflorestas de café, cacau, algodão, celulose, óleo de palma, madeira, seringueira e pimenta branca, entre outras culturas, espalhadas por Brasil, África e Indonésia.
A equipe tem pouco mais de 10 pessoas e inclui especialistas em design de florestas, gestão de projetos, conservação de biodiversidade e mercado financeiro.
“Criamos a reNature com a premissa de que precisamos regenerar a natureza”, diz Villela, cuja família trabalha há 60 anos com agricultura orgânica de larga escala em Limeira, no interior de São Paulo. Ele explica que a agricultura industrial tem cada vez mais ameaçado as florestas tropicais no mundo, provocando perdas de oito milhões de hectares por ano e tornando o solo cada vez mais vulnerável às mudanças climáticas.
As metas da reNature são ambiciosas: até 2030, quer regenerar um milhão de hectares de floresta pelo mundo, atingir 200 milhões de toneladas de carbono sequestradas e garantir segurança alimentar para mais de 10 milhões de famílias e agricultores.
A atuação da empresa começa sempre com a criação de uma fazenda modelo de agrofloresta regenerativa, conforme a cultura solicitada pelo cliente corporativo. São realizados treinamentos e capacitações dos agricultores, executivos ou donos da empresa. E por fim vem o pacote para fazer a transição de insumos, materiais e conhecimento da agricultura convencional para a regenerativa.
Villela calcula que o investimento inicial para a transição, que inclui insumos, materiais, mudas, sementes, leva de 3 a 4 anos para começar a se pagar e gerar lucro. A rentabilidade vem também da diversificação de culturas e prestação de serviços ambientais. Hoje, bancos interessados na bioeconomia também estão investindo no modelo para depois comercializar créditos de carbono.
O sistema de agrofloresta utilizado pela reNature promete controlar os riscos de esgotamento de solo com a diversificação de espécies. A cultura indicada pelo cliente é consorciada com espécies que fazem o sistema ser mais rentável, criando uma biodiversidade que regenera o solo e sequestra mais carbono na atmosfera, além de prover mais segurança alimentar ao agricultor.
“Hoje a maioria dos agricultores plantam commodities para empresas e acabam comendo comida industrializadas, ficam adoecidos, e os filhos deles não querem mais continuar no campo e se mudam para as cidades”, diz Villela.
Num projeto envolvendo a transição da monocultura do café, no Cerrado Mineiro, para o sistema de agrofloresta, a mensuração do impacto está sendo feita em conjunto pela Embrapa e por uma empresa holandesa que usa imagens de satélite para rastrear o impacto de carbono.
Quem pensa em tradeoff entre sustentabilidade e produtividade, está enganado. Enquanto a monocultura gera 24 sacas por hectare por ano, a agrofloresta regenerativa produz 30 sacas para o mesmo espaço e tempo.
O ganho ambiental vai na mesma direção: o aumento de captura de carbono é de 10 toneladas para 36 toneladas. A temperatura média da fazenda cai de 27,5º C para 24º C e a diversificação de culturas permite diferentes fontes de receita.