João Paulo Resende, do Ministério da Fazenda

Belém – A captação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, o TFFF, começou dentro das expectativas do governo, apesar de uma combinação diferente da esperada para os países investidores iniciais, diz João Paulo Resende, subsecretário de assuntos econômicos e fiscais do Ministério da Fazenda e o responsável pelo fundo.

“Desde que o Brasil anunciou o aporte de US$ 1 bilhão, o jogo mudou. Não paro de receber mensagens de países e investidores querendo entender o TFFF”, diz ele, em entrevista ao Reset, em que falou da expectativa de novos aportes e também de quando o fundo deve ir a mercado captar recursos de investidores e dar início ao pagamento pela conservação das florestas tropicais. 

Os US$5,5 bilhões de compromissos de investimento de países no TFFF, na primeira semana da COP, ficou dentro do que vocês esperavam ou havia uma expectativa maior de captação nesse momento?

Ficou dentro do que a gente esperava por razões diferentes. Foi uma surpresa muito positiva o valor que a Noruega apresentou. A gente não esperava que chegaria naquele valor. Por outro lado, a gente esperava que já houvesse um anúncio da Alemanha, e a gente sabe que virá, porque o primeiro-ministro foi bastante contundente na afirmação que fez, mas não anunciou um número. Uma coisa compensou a outra. 

Esse era o número [total] que a gente imaginava que ia acontecer, mas não necessariamente com os países que aconteceram.

E com quais outros países a conversa está mais quente? Tem se falado de China, ouvi alguma coisa de Japão também. Com quem vocês estão conversando nesse momento?

É importante ter em mente que havia seis países com quem a gente vinha falando há mais de um ano e meio. Esses que fizeram anúncios agora estão nesse grupo. Noruega, França e Alemanha. 

Mas existe um outro grupo de países com os quais a gente começou a conversar mais recentemente. É natural que eles levem mais tempo para poder entender o que é e processar internamente. [O TFFF] é mais difícil de entender, porque é um projeto que toca meio ambiente, finanças, relações exteriores e, muitas vezes, o próprio escritório da presidência ou do primeiro-ministro.

Por isso que não esperávamos que viesse nenhum anúncio, nesse momento, de países que não faziam parte desse grupo inicial. A Indonésia, por exemplo, foi uma grande surpresa, mas ela já estava no grupo inicial também.

Agora, China não estava, Japão não estava, Canadá não estava, Austrália não estava, outros tantos países europeus não estavam, países do Golfo a maioria não estava.

Esses países, como o ministro [Fernando] Haddad falou, precisam de um tempo para digerir e a gente acredita que eles virão em breve, no começo do ano que vem, mas temos o ano todo aí para trabalhar, porque é quanto dura a presidência da COP do Brasil.

Estamos bastante otimistas. Tem países que a gente sente que está mais avançado, tem países que a gente vai começar a conversar agora. A Holanda, por exemplo, foi um país que não fez um anúncio agora, ela não participava do grupo inicial de países, mas colocou recursos significativos para cobrir os gastos da estrutura no Banco Mundial que vai começar a rodar o TFFF.

Levantamos US$ 30 milhões no total para isso, incluindo a Holanda. E para que eu vou dar dinheiro para colocar de pé o fundo se não vou investir? Então, é uma sinalização muito forte da Holanda, apesar de não ter feito um anúncio.

Também achamos que o Japão é um grande candidato, porque tem uma relação muito próxima com o Brasil. A maior comunidade nipônica fora do Japão está no Brasil. Eles estão sempre participando desse tipo de iniciativa.

E a expectativa com China?

Com China também temos grandes expectativas de que virão.

Não houve desistência deles?

Não. Não houve nenhuma sinalização de que eles estariam recuando. E mesmo em relação ao Reino Unido. Nenhum dos dois falou que não poderá fazer um investimento. Todos eles falaram que precisam entender melhor a iniciativa ou, no caso do Reino Unido, “precisamos encontrar a forma certa de fazer isso de acordo com a nossa realidade”. Então, a gente não tem um não de nenhum país.

Quanto à China, a gente acha que é uma questão de dar tempo para amadurecer a ideia e eles poderem entrar.

Sobre os próximos passos, qual a expectativa de vocês de arrecadação de países e filantropias durante a presidência brasileira da COP, até o fim do ano que vem? E como estão as tratativas para começar a captar recursos no mercado? 

As duas respostas estão relacionadas. Durante as negociações, surgiu a condição que a Noruega impôs de só começar a rodar mesmo o fundo quando a gente atingir um patamar mínimo [de arrecadação de países], de US$ 10 bilhões. 

Eu não quero dizer meta, porque toda vez que a gente fala meta, aí fica a imprensa cobrando. A condição que foi colocada pela Noruega é conseguir os US$ 10 bilhões até o final do ano que vem. E a expectativa é que a gente consiga muito mais rápido do que isso.

Agora estamos em um pouquinho menos da metade do que a gente precisa, lembrando que precisamos de mais US$ 6 bilhões, porque a Noruega tem uma outra condição que é entrar com, no máximo, até 20% do total. Então, quando tivermos US$ 10 bilhões no fundo, teremos US$ 2 bilhões da Noruega e não US$ 3 bilhões.

Se conseguirmos mais três países com um compromisso semelhante, alguma coisa entre o Brasil e a Noruega…

Quando você diz ‘rodar’ é começar a captar recursos e pagar os países detentores de florestas?

É captar no mercado o recurso privado, sênior. E comprar ativos financeiros no mercado também para investir esses recursos. Operar na ponta do investimento. 

A partir de agora a gente vai colocar de pé toda a estrutura administrativa necessária para esse negócio funcionar. Em paralelo, vamos continuar fazendo campanha de arrecadação. Para que no momento em que a gente atinja esse valor estabelecido como necessário esteja tudo pronto para os países colocarem o dinheiro no fundo e ele começar a operar. 

Por enquanto, salvo talvez uma outra exceção, não vai ter de fato nenhuma transferência de valor. 

E quando podemos pensar que o fundo efetivamente começará a remunerar países detentores de florestas?

Vamos tentar fazer um exercício aqui. Vamos supor que a gente coloque de pé já e comece a operar financeiramente antes do final do ano que vem. Ao longo do ano que vem, teremos países [com florestas] se inscrevendo, demonstrando interesse. Vamos checar também se eles cumprem os requisitos para aderir.

A partir de 2027, já teremos o monitoramento das florestas. Entendo que a partir do final de 2027, início de 2028, o fundo já consegue começar a pagar alguma coisa.

Não estaremos 100%, porque não terá chegado nos US$ 125 bilhões. Mas algum pagamento para os países de florestas já conseguiremos fazer em 2028, inclusive para mostrar que a ideia funciona. Porque se você mostra que a ideia funciona, aí eu acho que a gente consegue até mais do que os US$ 125 bi. 

Aí ninguém vai querer ficar fora do clube, entendeu? Aí começa a ter “fear of missing out”, FOMO. Quero fazer parte também.