
Rio de Janeiro – A alta cúpula da Petrobras está prestes a aprovar a execução do primeiro projeto de captura e armazenamento de carbono em terra do Brasil, na região norte do Rio de Janeiro.
Depois do aval, previsto para ocorrer até agosto, uma licitação será lançada ainda este ano para convocar as primeiras empresas prestadoras de serviço, que farão os projetos básicos de engenharia e pesquisa do solo.
O avanço no projeto foi anunciado por Lilian Melo, gerente-executiva da área de inovação da companhia, no evento Energy Summit 2025, realizado no Rio de Janeiro.
Os planos da Petrobras preveem o início da captura de carbono em 2028, numa espécie de planta piloto. Ela servirá principalmente para pesquisa e aperfeiçoamento da tecnologia, que tem potencial para se tornar uma nova linha de negócio da empresa. A estimativa é injetar 100 mil toneladas de carbono ao ano no subsolo.
Para colocar o projeto de pé, será necessário adequar as instalações de uma Unidade de Processamento de Gás da Petrobras de onde o carbono será capturado. A unidade é uma refinaria em Macaé (RJ), que recebe e trata o gás natural vindo de poços de petróleo em alto mar.
Outros investimentos previstos são a adaptação de um duto de escoamento e a construção do poço injetor na cidade vizinha de Quissamã, onde o carbono será injetado definitivamente em um subsolo de características geológicas salinas.
O orçamento pré-definido é de US$ 250 milhões para essa primeira planta. Segundo Melo, isso marca o início da “fase dois” da captura de carbono na empresa.
“Na Petrobras existe uma espécie de portal de aprovação, com um grupo de suporte à decisão, que faz toda avaliação técnica. Estamos na etapa de garantir a melhor escolha, do ponto de vista técnico e financeiro”, disse a executiva ao Reset.
Projeto-piloto
Nas plataformas em que extrai petróleo em alto mar, a Petrobras já faz captura e armazenamento de carbono porque precisa reinjetar boa parte do gás natural que escoa dos poços junto ao petróleo. A prática é comum nas petroleiras, que não têm como utilizar o volume de gás excedente.
A primeira captura e armazenamento de carbono da Petrobras foi feita em 2008. Até 2022, foram reinjetados 40,8 milhões de toneladas de CO2 nos reservatórios. A meta é atingir o 80 milhões até 2025.
Apesar do “know-how”, o projeto em terra impõe desafios tecnológicos porque precisa isolar o carbono dos outros componentes do gás. Essa tecnologia de separação, plugada à Unidade de Processamento de Gás, é a que deve exigir os maiores investimentos.
No mar, a Petrobras reinjeta o gás natural com todos os seus componentes, como o metano e o CO2. Isso porque não há como dar uma destinação a toda produção por meio dos gasodutos que saem do alto mar.
Já na planta em terra, é interessante para a companhia separar e destinar para o subsolo apenas o carbono. Os outros componentes têm valor e servem como combustível da refinaria.
“O carbono puro tem outro nível de acidez e é extremamente corrosivo. Será necessário avaliar a resistência dos materiais, como a integridade deles se comporta, qual é o tipo de metalurgia que a gente precisa utilizar. Essa é a grande diferença”, diz Melo.
A ideia da companhia é fazer o armazenamento no solo durante três anos, a partir de 2028, com ajustes de aperfeiçoamento na tecnologia. A partir de 2031, a injeção será interrompida e o foco passa a ser monitorar o comportamento do solo.
Para solucionar os desafios técnicos que surgirem, um dos caminhos é contar com o apoio de startups que serão investidas por meio de um fundo de investimento em participações (FIP), criado em parceria com o BNDES. Ele foi anunciado neste mês de junho e deverá alcançar R$ 500 milhões. As startups selecionadas serão divulgadas em outubro e vão ajudar a solucionar gargalos também em outras frentes da companhia.
Novos negócios
Viabilizar essa separação dos gases na captura é crucial para, nas próximas décadas, a Petrobras replicar o projeto e ganhar dinheiro com a captura de carbono, negócio conhecido como CCUS, a partir de serviços prestados a outras indústrias.
“Nós queremos capturar todo e qualquer gás. Uma siderúrgica com uma chaminé, por exemplo, tem um grau contaminante próprio. Cada empresa vai ter um”, afirma a gerente da Petrobras.
Essa frente de negócios deve se tornar realidade apenas no longo prazo, mas a tecnologia é considerada uma das que a companhia estaria melhor posicionada na estratégia de transição energética.
Um dos possíveis clientes é a siderúrgica Arcelor Mitttal, com quem a Petrobras tem um memorando de entendimentos (MOU), e estuda criar um hub de captura no Espírito Santo.
Além de zonas industriais com altas emissões, a petroleira está mapeando quais subsolos serviriam para o armazenamento, como o salino de Quissamã.
“Esse piloto sendo exitoso, aí sim aplicamos o CCUS na visão de futuro da companhia, com hubs pelo Brasil. Hoje são cinco potenciais: Urucu [Amazonas], São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Bahia”, diz Melo.
Carbono zero
O negócio de captura de carbono é estratégico para que a Petrobras reduza as emissões de carbono na sua operação.
A meta da companhia é se tornar neutra para as emissões diretas (os chamados escopo 1 e 2) até 2050. Em 2023, as operações emitiram 48 milhões de toneladas de carbono equivalente, número 4% abaixo do ano anterior.
No setor de óleo e gás, não é só a queima dos combustíveis derivados do petróleo em si responsáveis por altos volumes de emissões, mas também as operações de extração. Entre os gases poluentes que escapam dos poços está o metano, um grande poluidor.
Tecnologias de captura de carbono foram apontadas pela Agência Internacional de Energia (EIA) como fundamentais para o mundo atingir a neutralidade de emissões até 2050, mantendo o aquecimento global em até 1,5 grau.
Como o CCUS em terra firme é novo no Brasil, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) ainda estuda uma regulamentação definitiva. No momento, a análise dos projetos é feita caso a caso, conhecida como “regulamentação por projeto piloto”.