REGULAÇÃO

Europa desiste de regra para proteger consumidores de greenwashing 

Comissão disse que não há condições políticas para avançar com a medida; relatórios mostram que mais da metade das propagandas e embalagens “pró-meio ambiente” são enganosas  

Europa desiste de regra para proteger consumidores de greenwashing 

A Comissão Europeia decidiu abandonar oficialmente a proposta que buscava estabelecer regras para o uso de termos ligados à sustentabilidade, como “carbono neutro”, “biodegradável” e “ecológico”, em produtos e campanhas de marketing. A Green Claims Directive previa a exigência de comprovação científica e validação independente para o uso desses termos, comuns em rótulos, embalagens e publicações nas redes sociais.

A norma pretendia combater a prática de greenwashing e proteger consumidores de afirmações enganosas que fabricantes e comerciantes fazem sobre atributos ambientais, sociais e climáticos  de seus produtos e serviços.

Relatórios da própria Comissão indicaram que mais da metade das propagandas e embalagens “pró-meio ambiente” de empresas no bloco eram enganosas ou infundadas. A ideia era padronizar critérios e oferecer segurança jurídica tanto para consumidores quanto para empresas que investem em sustentabilidade.

A justificativa para abandonar a proposta é de que não há mais “condições políticas” para avançar com a medida, mesmo após a aprovação pelo Parlamento Europeu em março. A proposta enfrentou bloqueios no Conselho da União Europeia, especialmente por parte de países como Itália e República Tcheca, com conservadores liderando o movimento contra as medidas. 

Um dos argumentos usados por eles é de que, embora a proposta original isentasse as microempresas das regras, as discussões em curso abririam margem para que 30 milhões de microempresas acabassem tendo que cumpri-las, em especial por conta de encargos administrativos.

A decisão confirma um movimento mais amplo de recuo regulatório na agenda climática da União Europeia. Outras iniciativas importantes, como a lei antidesmatamento (EUDR), a diretiva de diligência devida (CSDDD) e a diretiva de relatórios de sustentabilidade (CSRD) também vêm sendo alvo de pressões, diluições e adiamentos.

O caso do EUDR, que exige que commodities como soja, café e carne não venham de áreas desmatadas, gerou forte reação de países exportadores e pressionou Bruxelas a buscar “flexibilizações”. Políticos e a imprensa europeia criaram até um termo para definir o fenômeno: green deal fatigue (fadiga de acordos verdes). 

A Comissão Europeia tem sido cada vez mais pressionada por quem vê as regras ESG como um entrave à competitividade econômica, especialmente em um contexto de inflação e aumento de gastos com segurança e defesa

A proposta de diretiva para proteger consumidores de greenwashing integrava o Pacto Ecológico Europeu (European Green Deal), plano estratégico da UE para alinhar políticas econômicas às metas climáticas, e estava sendo discutida há dois anos. Contribuiu para a perda de fôlego da agenda ambiental do bloco, ainda, pressões industriais e crescimento de partidos anti-União Europeia após as eleições de 2024.

Sem a nova regra, o uso de termos como “carbono neutro”, “biodegradável” e “ecológico” segue sujeito a diretrizes nacionais e a normas locais de proteção ao consumidor, consideradas genéricas por especialistas. Organizações da sociedade civil alertam para o aumento do risco de greenwashing e a dificuldade de diferenciação entre compromissos ambientais reais e meramente publicitários.

A Comissão Europeia indicou que poderá retomar parte do conteúdo da proposta em legislações futuras.