Vale avança nos planos de aço verde na Arábia Saudita

Mineradora tem terreno garantido para construir planta, agora precisa de siderúrgicas locais para complexo industrial integrado 

Vale avança nos planos de aço verde na Arábia Saudita
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Riade, Arábia Saudita – A Vale está avançando nos seus planos para implementação de um hub para produção de aço verde na Arábia Saudita. O terreno para construir sua planta já está garantido, agora estaria negociando acordo com uma siderúrgica local.  

Essa é a principal estratégia da Vale para reduzir as emissões de carbono de sua cadeia de valor: fazer parcerias com as siderúrgicas para descarbonizar o processo produtivo delas, que demanda queima de combustíveis para produzir calor para alto-fornos. 

A siderurgia é uma das atividades industriais mais poluentes do mundo, responsável por cerca de 9% das emissões de gases de efeito estufa. Esse carbono também entra na conta do escopo 3 das mineradoras, que contabiliza o CO2 emitido pela cadeia de fornecedores e clientes. Por isso o desafio climático da Vale é grande: 97% de suas emissões são indiretas. 

Tanto a concentração do minério de ferro (pela mineradora) quanto a sua transformação em aço (pela siderúrgica) demandam grandes quantidades de energia. E aí entra a escolha do Oriente Médio, com sua oferta abundante de gás natural, uma energia barata e que oferece um caminho para a descarbonização do aço. 

O plano é desenvolver complexos industriais que integrem algumas etapas da produção da mineradora e da siderúrgica numa mesma área, o que a Vale chama de mega hubs. Com isso, ganham eficiência no consumo de energia e logística. 

A companhia tem acordo com três países do Oriente Médio para instalação desses complexos: Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Omã. Há projetos também no Brasil e Estados Unidos.

A estimativa é que eles contribuam para a meta da Vale de reduzir as emissões líquidas de escopo 3 em 15% até 2035. 

A visão é que no futuro, quando houver uma oferta global de hidrogênio verde, o gás de origem fóssil possa ser substituído, o que reduziria ainda mais a intensidade de emissões do aço.

Montando o quebra-cabeças

Para viabilizar um mega hub, a Vale precisa: 

(1) que os parceiros locais promovam a infraestrutura e logística, o que inclui a disponibilidade de energia e terreno para construção da planta; 

(2) construir e operar plantas de concentração e aglomeração de briquetes, solução de minério de ferro que a Vale desenvolveu para a siderurgia produzir de aço de baixo carbono;  

(3) convencer siderúrgicas a comprar briquetes e construir plantas capazes de fazer a redução direta do produto, processo pelo qual ele é derretido para produzir o aço, o que demanda investimento em maquinário (capex).

“A siderúrgica precisa de um outro forno e uma outra planta para usar briquete na produção”, diz um executivo do setor. 

O primeiro item da lista está ticado. 

A mineradora anunciou semana passada acordo com o governo da Arábia Saudita para reserva de terreno para a implementação de um mega hub na cidade industrial de Ras Al Khair. A projeção é de que ele produza até 12 milhões de toneladas de briquetes de minério de ferro por ano. 

Pelo acordo, a disponibilidade do terreno está condicionada à obtenção de um parceiro siderúrgico local, segundo o Reset apurou. O que leva ao terceiro item.

A empresa assinou um memorando de entendimentos (MOU, na sigla em inglês) com a Hadded, siderúrgica estatal saudita, na semana passada. Rogério Nogueira, vice-presidente comercial e de novos negócios da Vale, assinou o documento em Riade, capital da Arábia Saudita, durante o Future Minerals Forum, no estande da Hadeed no evento.   

Procuradas via assessoria de imprensa, nenhuma das duas companhias informou o objetivo do memorando. Analistas do mercado de mineração especulam que uma parceria para o mega hub possa estar entre as conversas. 

“O mega hub de Al Khair servirá como um modelo para integrar tecnologias avançadas com práticas sustentáveis, gerando não apenas impacto ambiental positivo, mas também valor econômico”, afirmou Nogueira em nota de imprensa da Vale. 

Bri o que?

Conhecido como HBI (sigla em inglês para hot briquetted iron), o briquete é um produto desenvolvido pela Vale ao longo de mais de 20 anos, um novo tipo de aglomerado de minério de ferro que dispensa o uso de altas temperaturas no seu processo de produção. 

Ele é uma alternativa mais limpa à pelota e ao sínter de minério, que são as duas formas como a Vale costuma entregar seu produto às siderúrgicas para a produção de aço. 

Nas siderúrgicas, o corte das emissões ocorre porque o produto permite reduzir a dependência da chamada “sinterização”, processo anterior à produção do aço e intensivo em carbono.

A Vale estima uma redução em até 10% na emissão de gases de efeito-estufa resultante da produção do aço com briquetes. 

Hoje, a Vale produz briquete no Brasil na usina de Tubarão, no Espírito Santo. 

Por que Arábia Saudita?

Energia barata e localização geográfica foram dois fatores que levaram a Vale escolher o país. A Arábia Saudita possui algumas das maiores reservas de gás natural do mundo e  Ras Al Khair é uma cidade industrial e portuária localizada no Golfo Pérsico. 

A Vale também cita o “ambiente favorável aos negócios”. Isso porque o país, governado por uma monarquia absoluta teocrática, tem um plano ambicioso de diversificação econômica para reduzir sua dependência do petróleo. Ele inclui desenvolvimento de diversas indústrias, entre elas de mineração e siderurgia. 

Os planos são de que o hub saudita atenda aos mercados local, regional e internacional. 

* A repórter viajou a convite do Future Minerals Forum (FMF)