Musk divaga sobre futuro sustentável – e investidores querem saber onde estão os carros

Na terceira edição do seu 'master plan', dono da Tesla não explicou como a montadora irá produzir 20 milhões de carros elétricos por ano em 2030

Musk divaga sobre futuro sustentável – e investidores querem saber onde estão os carros
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Numa apresentação para investidores ansiosos para saber como a Tesla vai atingir a meta declarada de produzir 20 milhões de carros por ano em 2030 – no ano passado foram 1,3 milhão –, Elon Musk preferiu falar do planeta Terra.

A esperada terceira edição de seu “master plan”, apresentada ontem, se concentrou na seguinte mensagem: “Existe um caminho claro para um planeta inteiramente sustentável, com abundância”.

A promoção de energias limpas também ocupou lugar de destaque nas versões anteriores de seus planos, que podem ser interpretados como a missão da empresa.

Mas a versão original do documento, publicada em 2006, quando Musk nem sequer havia assumido o cargo de CEO, era bem prática: usar o primeiro modelo da empresa, um esportivo que custava US$ 100 mil, como trampolim para carros mais acessíveis.

O “Master Plan, Part Deux” veio dez anos depois, prometendo estações de recarga movidas a energia solar e carros 100% autônomos, que tornariam o Uber e seus motoristas obsoletos. (Por enquanto nenhuma das visões virou realidade.)

Na noite desta quarta-feira, Musk falou de um esforço mundial de 10 trilhões de dólares, aviões e navios-cargueiros elétricos e terawatts de capacidade instalada de baterias e de fazendas solares – algo muito além da capacidade de uma fabricante de automóveis.

“Queria que hoje fosse um evento não só para os investidores que têm ações [da Tesla], mas na verdade para qualquer um que seja investidor da Terra.”

O mercado não ficou impressionado: momentos após o início do evento, os papéis da empresa registravam queda de 3%.

Dúvidas

A novidade que muitos esperavam foi apenas sugerida: ao lado dos modelos atuais, alguns slides mostraram carros cobertos por um pedaço de pano.

O que os analistas queriam ouvir é a data de lançamento de um veículo com preço capaz de atender ao mercado de massa – o que será essencial para chegar aos 20 milhões de unidades anuais.

O cardápio da empresa conta com somente quatro carros de passageiros. O quinto, uma picape de design futurista, deve começar a ser vendido este ano. O mais barato deles custa cerca de US$ 45 mil nos Estados Unidos.

Apesar das vantagens de ter criado a nova era dos transportes, enquanto as montadoras tradicionais só agora começam a transição dos motores a combustão para os elétricos, a Tesla vai enfrentar a competição das companhias que criaram a indústria que conhecemos hoje – e de uma onda de startups chinesas.

A maior parte do evento foi dedicada aos diversos componentes e processos envolvidos na fabricação de um automóvel elétrico e como as inovações da Tesla vão permitir que ela fique à frente das rivais.

Pouco se falou em prazo, mas os responsáveis pela área de manufatura mostraram uma reorganização da linha de montagem que permitiria aumentar a eficiência e reduzir o tamanho das plantas pela metade.

O design conjunto das fábricas dos carros que ela vai produzir, segundo os executivos da companhia, é algo que nenhuma outra montadora faz. Esse novo método será aplicado nos Tesla das novas gerações.

Mas ainda não será o caso da nova planta da companhia, na cidade mexicana de Monterrey, perto da fronteira com os Estados Unidos. A unidade foi anunciada na terça-feira pelo presidente do país, Andrés Manuel López Obrador.

A empresa também confirmou o início das obras de uma refinaria de lítio no Texas. O acesso aos minerais críticos da transição energética é uma das prioridades de todas as montadoras. Nada foi dito sobre o suposto interesse pela brasileira Sigma Lithium.

Avanços em engenharia e ciência de materiais também vão representar uma redução do consumo de certos metais raros. Os motores futuros não exigirão nenhum tipo de minério raro – e custoso. Hoje, cada um deles embute cerca de 500 gramas, de acordo com a Tesla.

Pouca prática

As mais de duas horas e meia de evento ofereceram uma visão detalhada das enormes diferenças que existem entre a fabricação de carros que precisam encher o tanque de gasolina e os que são plugados na tomada.

O papel decisivo de Musk na transformação de uma das indústrias que definiram o século 20 está garantido na história. Já sua contribuição para alcançar a visão de um mundo verdadeiramente sustentável – que vamos testemunhar, afirmou o CEO de 51 anos – é no mínimo dúbia.

Ele não foi o primeiro nem será o último a mostrar contas cheias de zeros para justificar o argumento de que, sim, é possível deixar os combustíveis fósseis para trás. (Um documento detalhando as projeções e investimentos será publicado no site da Tesla.)

Além das questões sobre os planos imediatos da empresa, muitos se perguntam se a obsessão de Musk com seu novo brinquedo, o Twitter, não estaria desviando sua atenção.

Enquanto seus diretores estavam no palco falando aos investidores, Musk estava nos bastidores tuitando sobre a guerra da Ucrânia.