Rise Ventures quer fundo para escalar 'venture studio' de impacto

Rise Ventures quer fundo para escalar 'venture studio' de impacto
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Enquanto boa parte do mercado vai pescar no aquário de startups de tecnologia, a Rise Ventures está captando um fundo para investir em empresas em estágios iniciais e com impacto social e ambiental na parte negligenciada: a economia real. 

“As startups puras de tecnologia já são atendidas no Brasil por um ecossistema crescente de venture capital tradicional, mas na economia real tem uma lacuna substancial de capital intencionado: empresas que são caras demais para os investidores-anjo e muito pequenas para os fundos de private equity”, diz o co-fundador e CEO da Rise, Pedro Vilela. 

A Rise pretende levantar R$ 150 milhões para investir em empresas com faturamento entre R$ 5 milhões e R$ 30 milhões, voltadas para itens com recorrência de consumo e com impacto em pelo menos uma de três esferas: social, natureza ou bem-estar.  O dinheiro não virá todo de uma vez. Vilela imagina que o total pretendido será alcançado em quatro a cinco etapas, ou closings, ao longo de até 24 meses.

A ideia é ter cerca de 10 empresas no portfólio, com cheques de série A de cerca de R$ 10 milhões — e restante para follow-ons.

A gestora quer escalar uma estratégia que já foi testada nos últimos quatro anos, num modelo conhecido como ‘venture studio’, mais popular fora do Brasil.  

A Rise entra com método e equipe profissionalizada nas investidas, ajudando a conduzir o processo de planejamento e execução, em troca de uma participação acionária, o ‘sweat equity’, no jargão do mercado. 

Nesse modelo, já tem três empresas no portfólio, que serão tombadas para o fundo que está em captação e devem ser as primeiras a receber os investimentos. 

A Beleaf produz refeições ultracongeladas a base de vegetais, as chamadas plant-based, que são vendidas num modelo de comércio digital, direto para o consumidor. A mineira Alba vende e instala a estrutura para produção de energia solar em telhados de negócios de pequeno e médio porte, com foco em cidades menores, com até 500 mil habitantes. Ambas estão há três anos no portfólio. 

No ano passado entrou na carteira a Okena, que trata resíduos industriais reciclando componentes presentes nos efluentes e que, eventualmente, podem até ser vendidos como matéria-prima novamente para a indústria.

Originalmente, a ideia era captar recursos para as investidas em ‘club deals’. Foi quando a Rise percebeu que as empresas tinham ficado grandes demais para rodadas de capital semente com investidores anjo ou ‘friends and family’ e ao mesmo tempo ainda eram muito pequenas para os fundos de private equity. “O que falta é alguém fazendo esse trabalho de pegar companhias com faturamento de R$ 10 milhões e levar para um faturamento de R$ 100 milhões”, diz Vilela. 

Um ‘private equity early stage’

Administrador formado pelo antigo Ibmec de São Paulo, hoje Insper, Vilela fez carreira na consultoria de gestão Integration, ajudando empresas em seus desafios de negócios, e trabalhou em um fundo de ativos estressados do Pátria, no qual entrava nas empresas para fazer o processo de turnaround. 

Mas, filho de uma engenheira que trabalha com desfavelização e um médico que atua em causas humanitárias, sempre nutriu a ideia de trabalhar com propósito. Em 2007, nas férias do trabalho, foi a Bangladesh conhecer o trabalho de microcrédito feito por Muhammad Yunus, logo depois de ele ganhar o Nobel.

“Precisava acumular conhecimento e capital”, diz Vilela, hoje com 36 anos. Ele se uniu a Tiago Longuini, com quem trabalhou na Integration, e a Daniel Madureira, que passou pela TreeCorp, de private equity, e pela boutique de investimentos G5, para fundar a Rise. 

A ideia era abastecer as empresas de algo tão ou mais escasso que capital: gente. “Gente é a coisa mais importante dentro do modelo de negócios. O próprio capital é fruto de gente com bons planos”, diz Vilela. 

Além de uma equipe de gestão dedicada dentro de cada empresa, a Rise faz toda a parte de recrutamento das companhias investidas. No ano passado, contratou uma pessoa a cada quatro dias para as empresas do portfólio. “Quando a Rise entrou na Alba, há três anos, o faturamento era de R$ 6 milhões. Hoje eles faturam quase R$ 30 milhões, sem aportar um real, só com gestão”, aponta. 

Apesar de mirar empresas menores, o modelo mais mão na massa de gestão é mais próximo do adotado por private equities, que costumam instalar equipes nas investidas. “A gente acha que é mais um private equity early stage do que um venture capital”, diz Vilela. 

Além dos fundadores, a Rise tem como sócios na holding a família Ceratti, fundadora do tradicional negócio de mortadelas vendido em 2017, a família Lindenberg, dona da retransmissora da Globo no Espírito Santo, e o family office Impulsum, além de um outro investidor que prefere não ser identificado. 

Como o modelo de venture studio queima caixa no começo, é esse capital que financia parte do investimento necessário para manter as equipes — que custam cerca de R$ 50 mil a R$ 70 mil por mês por investida — dentro das empresas até que haja os primeiros aportes relevantes de capital. 

Impacto, de dentro para fora

Já na diligência de negócios, a Rise tem um checklist extenso para entender os impactos e externalidades, tanto do negócios principal quanto dos processos e da cadeia.

“Nossa pergunta core é: a proposta de valor do empreendedor é bem-vinda para o planeta?”, aponta Vilela. 

Cada empresa tem metas — algumas gerais e outras customizadas —, geralmente ligadas às metas de desenvolvimento sustentável da ONU. Além disso, trabalha para certificar todas as suas investidas como Empresas B. A própria Rise e a Okena são B Corps.  “O sistema B tem um processo muito interessante de auditoria e de acompanhamento de impacto, e é sempre bom ter esse olhar e esse aval externo.” 

Mais do que as métricas, no entanto, ele aponta que o crucial, mais do que em qualquer negócio, é conhecer a fundo os sócios por trás das investidas. “A essência é que o impacto começa dentro de si, então olhamos muito o estilo do empreendedor, como ele trata as pessoas, como ele se trata”, diz Vilela. “No fim queremos ter pessoas que tomam decisões de maneira integrada, e que se sintam parte de um todo e não acima dele.” 

Do ‘bolso esquerdo’ para o ‘bolso direito’ 

As conversas para levantar recursos para o fundo começaram em março e foram interrompidas pela pandemia. Agora, a gestora voltou a fazer roadshows, buscando também cheques fora do país, especialmente em fundos de fundos e endowments (os fundos bancados por doações, em geral ligados a universidades).

“O mercado lá fora é mais maduro, mais consciente e tem liquidez intencionada maior para ecossistemas de impacto”, diz Vilela. 

No Brasil, as conversas avançam, mas ele aponta que ainda há uma certa barreira cultural. “Por aqui, o tema [de investimento de impacto] ainda é tratado de forma geral como o ‘bolso esquerdo’, o bolso da filantropia e de teste. Então tem um trabalho grande de advocacy que a gente vem fazendo com as famílias para mostrar que retorno e impacto andam juntos e que esse dinheiro tem que vir do bolso direito, o bolso do investimento mesmo”, aponta. 

A taxa de retorno esperada pelo fundo é de 20% a 25% ao ano, em linha com estratégias de private equity.

Além de levantar recursos para o fundo, a Rise também busca investidor para ser sócio da própria gestora. A ideia aqui é atrair um distribuidor ou fundo de private equity que possa ajudar na distribuição dos fundos. O sonho grande é levantar outros veículos, inclusive de dívida voltada para impacto. “Mas, um passo de cada vez”, diz Vilela.