TRANSIÇÃO ENERGÉTICA

Petrobras e Camila Pitanga atraem críticas por campanha de transição energética

Transmitida em horário nobre da Globo, propaganda diz que a estatal é “líder na transição energética justa" em meio a críticas pela expansão da exploração de petróleo na Foz do Amazonas

Petrobras e Camila Pitanga atraem críticas por campanha de transição energética

A campanha da Petrobras estrelada pela atriz Camila Pitanga intitulada “Transição energética justa pra você” gerou críticas nas redes sociais e de organizações ambientais. A atriz aparece na peça publicitária, transmitida em horário nobre da Globo, com a mensagem de que “para ser justa, a transição energética precisa gerar desenvolvimento, inclusão e novas oportunidades”. 

A estatal é acusada de estar fazendo greenwashing ao afirmar estar comprometida com o desenvolvimento sustentável, mas seguir abrindo novas fronteiras de exploração de petróleo sem investimentos em energia limpa na mesma proporção. “A tal transição que a Petrobras repete insistentemente e nada mais, nada menos que: lavagem verde, o famoso greenwashing“, afirma o Instituto ClimaInfo em postagem em uma rede social.

As críticas também sobraram para Camila Pitanga, que compartilhou a campanha em suas redes sociais. “Greenwashing te pegou”, comentou Marcele Oliveira, jovem campeã climática da COP30, na postagem da atriz no Instagram. “Camila, meu amooor, até eu que sou nova na pauta sei que é furada, acordeeeee”, disse uma outra seguidora. 

Diversos seguidores pedem nos comentários que ela não fale de petróleo, mas alerte sobre o “PL da devastação”, em referência ao projeto de lei que tramita no Congresso com propostas para alterar o licenciamento ambiental no país.

Na campanha, a Petrobras diz que lidera a transição energética justa ao “abraçar” novas fontes de energia, proteger o meio ambiente e criar oportunidades para as pessoas. “Justa para todos. Justa para você. O Brasil é a nossa energia”, diz a propaganda.

A participação de Camila Pitanga na campanha gerou surpresa entre seus seguidores nas redes sociais porque ela tem um histórico de emprestar a própria voz às causas ambientais. Já participou de diversas campanhas do Greenpeace e consegue “furar a bolha”, amplificando o posicionamento de ambientalistas para fora do meio progressista. Exemplo disso foi sua atuação durante a votação do novo Código Florestal, em 2012, que aconteceu em meio a um debate acalorado. 

Por isso, o Instituto ClimaInfo chamou a atenção da atriz nas redes sociais. “O futuro não é feito de combustível fóssil”, diz o texto da postagem, acompanhada de uma imagem da atriz com o texto: “Transição sem investimento em renovável é regressão”. 

Procurada pelo Reset, a assessoria de imprensa da atriz não respondeu até o momento.

A campanha é assinada pela agência Propeg, contratada desde 2017 pela petroleira, e conta com música tema inédita interpretada pelo cantor Diogo Nogueira. 

Foz do Amazonas

Hoje, o petróleo é o principal produto da Petrobras. A companhia anunciou recentemente que está próxima de retornar ao mercado de etanol, principal concorrente da gasolina no Brasil. 

Uma das novas fronteiras de exploração de óleo e gás da Petrobras é na Foz do Amazonas. A exploração petrolífera nessa região é objeto de queda de braço entre ambientalistas e setor produtivo no Executivo e no Congresso. Estão em jogo a soberania energética; arrecadação em contexto de crise fiscal; o desenvolvimento econômico dos territórios; os direitos de comunidades indígenas e ribeirinhas; e riscos ambientais em meio à pressão por mudanças no licenciamento ambiental. 

A Petrobras tenta conseguir do Ibama, desde 2014, licenciamento para perfuração do bloco FZA-M-59, conhecido como bloco 59. O Ibama vem negando a licença alegando que os projetos apresentados pela Petrobras não atendem às necessidades de proteção ambiental. Localizado na Foz do Amazonas, ele foi arrematado pela estatal em 2013. A empresa arrematou outros lotes na mesma região em leilão no mês passado

“A Petrobras é a principal empresa de energia do Brasil, mas ela segue insistindo em não fazer sua transição energética. Veja a insistência em explorar o bloco 59 na Foz do Amazonas, uma região altamente sensível, que não tem estudos suficientes – inclusive por parte da petroleira”, diz a postagem do ClimaInfo.

A descarbonização de petrolíferas é especialmente difícil, por razões óbvias. Grandes petroleiras como Shell e BP sofrem pressão por terem retrocedido em suas metas climáticas nos últimos anos. 

A Petrobras tem como meta a redução de 30% das emissões até 2030 e alcançar o net zero até 2050. Segundo dados divulgados pela companhia, ela emitiu 47 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) em 2024. O volume está estável em relação aos anos anteriores: 46 milhões emitidos em 2023 e 48 milhões de 2022. Em relação a 2015, porém, registra uma queda de 40% nas emissões. Nesse período, a produção da companhia aumentou em 27%. 

Transição justa

O termo “transição energética justa” surgiu para descrever o processo de mudança das fontes de energia baseadas em combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás natural) para fontes renováveis (biocombustíveis, solar, eólica, etc), garantindo que essa transformação seja socialmente inclusiva, economicamente equilibrada e ambientalmente responsável. Isso inclui a proteção de trabalhadores e comunidades afetadas. 

O conceito ganhou força em políticas climáticas globais ao reconhecer que descarbonizar a economia exige enfrentar desigualdades históricas e é um conceito abraçado especialmente por países em desenvolvimento. A avaliação é que os países ricos se desenvolveram e lucraram muito com petróleo e que um encerramento abrupto da exploração em países em desenvolvimento seria mais prejudicial para essas economias.

O governo brasileito tem defendido a pauta da transição justa em diversos fóruns internacionais, entre eles o G20, os Brics e a COP, que este ano será realizada em Belém. 

Na abertura do Fórum Empresarial dos Brics nesta semana, o presidente Lula chamou a descarbonização das economias de “processo irreversível” e lembrou que o Brasil apresentou novas metas climáticas (NDCs), com previsão de redução entre 59% e 67% das emissões de gases de efeito estufa. “Estamos comprometidos com uma transição ecológica justa e inclusiva, especialmente às vésperas da COP 30”, disse.

Durante a cúpula do bloco, ministros da energia dos países-membros assinaram um documento defendendo que países em desenvolvimento possam explorar combustíveis fósseis de acordo com suas prioridades nacionais. 

“Reconhecemos que os combustíveis fósseis continuarão a desempenhar um papel importante na matriz energética mundial, particularmente para os mercados emergentes e economias em desenvolvimento”, afirma o comunicado do bloco econômico. Além dos países que o fundaram, entre eles o Brasil, ele conta também com grandes produtores de petróleo, como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Rússia, China e Irã.

“E reconhecemos a necessidade de promover transições energéticas justas, ordenadas e equitativas e reduzir as emissões de GEE em conformidade com o ODS 7, às nossas metas climáticas e de acordo com os princípios da neutralidade tecnológica e das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, e respectivas capacidades, tendo em conta as circunstâncias, necessidades e prioridades nacionais”, afimam os membros dos Brics. 

A organização Climate Action Network International criticou o posicionamento. “O que enfraquece os pontos positivos da declaração dos BRICS é o apoio aos combustíveis fósseis, com líderes alegando que a indústria notoriamente suja está promovendo uma transição energética justa e reduções de emissões: isso não é verdade nem exato”, disse em nota.
O tema também aparece nas cartas do presidente da COP 30 endereçadas à comunidade internacional. O embaixador André Corrêa do Lago,repete uma frase do comunicado da COP28, de Dubai, sobre a redução do uso de combustíveis fósseis e adiciona a questão da justiça, ao falar escrever “transição para o afastamento dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de maneira justa, ordenada e equitativa”.