
Os Estados Unidos estão rachados mais uma vez, com governadores uns contra os outros. Agora o motivo da divisão não é mais o fim da escravidão que levou à Guerra Civil no século XIX, mas sim a atuação frente às mudanças climáticas, com batalhas nos tribunais.
Um grupo de 24 Estados, dos quais somente um não é governado pelo Partido Republicano, do presidente Donald Trump, decidiu questionar leis ambientais do Estado de Vermont na justiça federal. Seus membros incluem Alaska, Flórida e Texas, liderados pela Virgínia Ocidental. A decisão do grupo soma forças ao Instituto Americano de Petróleo (API, na sigla em inglês) e à Câmara de Comércio do país.
Uma recém-aprovada legislação de Vermont, batizada de “Climate Superfund Act”, exige que a indústria fóssil indenize o poder público local por uma parcela dos prejuízos causados pelas mudanças climáticas globais.
A entrada dos Estados na ação judicial vem poucos dias depois de a Casa Branca fazer o mesmo movimento. O governo de Trump iniciou um processo paralelo contra Nova York, o Havaí e Michigan.
As ações foram movidas pelo Departamento de Justiça (cujas principais atribuições são equivalentes às da Procuradoria-Geral da República e Advocacia Geral da União no Brasil).
Nova York e Vermont aprovaram em 2024 legislações para taxação de emissões retroativas do setor de fósseis, como petróleo, gás e carvão.
O valor cobrado considera a participação das companhias nas emissões globais de carbono e o custo necessário de mitigação e adaptação dos estados diante da mudança climática. Nova York espera arrecadar US$ 75 bilhões até 2050 com o imposto sobre o setor, com cobranças anuais que começam em 2028.
As empresas taxadas são aquelas que emitiram mais de 1 bilhão de toneladas de carbono entre 2000 e 2024 em Nova York. Já em Vermont, o período é de 1995 a 2024.
O argumento da Casa Branca e do grupo de Estados acusadores é que padrões de emissões interestaduais só podem ser definidos pelo governo federal.
Outra alegação é que condutas passadas de emissões eram legais e até incentivadas pelo poder público. Califórnia, Massachusetts, Maryland, Nova Jersey e Oregon têm projetos similares em discussão.
Na acusação, o Departamento de Justiça afirma que as leis estaduais são como uma “extorsão” com o objetivo de financiar projetos de infraestrutura locais com dinheiro de empresas de fora.
Vermont e Nova York preveem que mesmo empresas sem ativos locais, mas com operações no Estado, estão sujeitas à cobrança.
O governo da Virgínia Ocidental, que lidera a coalizão de acusadores, afirmou que as leis são “devastadoras” para o setor de energia, o que poderia levá-los a encerrar as operações e se mudar para países com padrões ambientais mais baixos, como China, Índia e Rússia.
A atuação da Casa Branca segue a reviravolta política nos Estados Unidos. Neste novo mandato, Trump instruiu o Departamento de Justiça a identificar todas as regulamentações estaduais “que possam ser inconstitucionais e que criem empecilhos para a identificação, o desenvolvimento, a localização, a produção ou o uso de recursos energéticos”.
Em janeiro, assim que tomou posse, Trump declarou emergência energética para incentivar a retomada da cadeia fóssil. A frase “Drill, baby, drill” é uma das favoritas do presidente. Ela faz referência às perfurações de petróleo.
No ataque
Nova York e outros Estados não estão só na defensiva nesta espécie de guerra civil. Um grupo de 18 entes está processando o governo Trump por congelar autorizações para novos empreendimentos de energia eólica offshore. Vermont não faz parte dessa acusação.
Um dos maiores projetos do tipo nos Estados Unidos é o Empire Wind, da empresa norueguesa Equinor, a 24 quilômetros da costa da cidade de Nova York.
A primeira parte do parque eólico tem perspectiva de gerar 816 megawatts, abastecendo 500 mil residências a partir de 2027. As obras, porém, foram suspensas pela Casa Branca.
Este outro grupo de Estados, a favor da transição energética, chama as medidas contra energia eólica de Trump de arbitrárias e de um “capricho”.
Um dos argumentos é de que interromper os projetos eólicos vai contra o próprio decreto de emergência energética do presidente, cujo objetivo é reduzir os preços de energia no país.
Ao contrário do Brasil, a matriz elétrica dos Estados Unidos é suja. Da energia gerada em 2023, cerca de 60% vieram da queima de combustíveis fósseis em termelétricas. Outros 19% foram produzidos a partir de energia nuclear e 21% a partir de fontes de energia renováveis. As informações são da Agência Internacional de Energia.