Taxonomia verde do Brasil avança e entra em consulta pública

Com previsão de passar a valer em 2026, ferramenta tem sete metas ambientais e quatro sociais, diz Cristina Reis, do Ministério da Fazenda

Cristina Reis, subsecretária de Desenvolvimento Sustentável do Ministério da Fazenda, diz que taxonomia sustentável deve vigorar em 2026
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O Brasil precisa atrair bilhões de reais nos próximos anos para financiar a transição ecológica da economia. Mas, para isso, ainda faltam parâmetros para identificar a quais projetos e negócios os recursos devem ser destinados. 

No mundo todo, identificar investimentos com atributos reais de sustentabilidade se tornou um desafio, que vem sendo enfrentado com a criação de taxonomias verdes pelos governos locais.

Trata-se da criação de um sistema de categorias e terminologias que passa a servir como uma régua a todo o sistema financeiro. Países como China e México, além da União Europeia, já desenvolveram as suas.

Na última quinta-feira, 21, o Ministério da Fazenda abriu uma consulta pública para a elaboração da taxonomia sustentável brasileira. O projeto foi desenvolvido por um grupo composto por representantes de mais de 20 ministérios, órgãos reguladores do sistema – Banco Central, Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) e de Seguros Privados (Susep) – e BNDES.

As contribuições recebidas na consulta pública, que se encerra em 20 de outubro, serão consolidadas em um plano de ação a ser apresentado em novembro, na COP28 de Dubai. A partir daí, por um ano, o grupo de trabalho vai desenvolver a taxonomia e fazer um trabalho de letramento do mercado. A ideia é lançar a taxonomia do Brasil na cúpula do clima da ONU de 2024.

“Haverá um período teste, em que acreditamos que os agentes vão se adequando aos poucos, até que se torne mandatória em janeiro de 2026”, diz a subsecretária de desenvolvimento econômico sustentável do Ministério da Fazenda, Cristina Reis, um dos nomes à frente do desenvolvimento da ferramenta, em entrevista ao Reset durante evento da Future Carbon e Sinai. 

Os objetivos da taxonomia brasileira

A taxonomia brasileira conta com sete objetivos ambientais e quatro sociais. Em uma primeira etapa, estarão em foco:

  • mitigação da mudança do clima
  • adaptação às mudanças climáticas
  • uso sustentável do solo e conservação, manejo e uso sustentável das florestas
  • redução de desigualdade socioeconômicas, considerando aspectos raciais e de gênero
  • redução de desigualdades regionais e territoriais do país.

A proteção e restauração da biodiversidade e ecossistemas, uso sustentável e proteção de recursos hídricos e marinhos, transição para uma economia circular e prevenção e controle de contaminação também integram a lista de objetivos ambientais. 

Entre os econômicos-sociais, estão a geração de trabalho decente e elevação de renda, e promoção da qualidade de vida, com ampliação do acesso a serviços sociais básicos.

A principal referência para a taxonomia brasileira está na União Europeia, que foi pioneira em sua aplicação e conta com uma robustez nos objetivos ambientais – a maioria incorporados pelo Brasil.

“Mas diferente da UE, nós trazemos vários compromissos sociais também. Um país que fez isso anteriormente foi o México, que tem um claro objetivo de redução da desigualdade de gênero”, diz Reis. 

A abrangência da taxonomia

Com base em experiências internacionais e na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) interna, na consulta pública, foram definidos oito setores que estarão sujeitos aos critérios estabelecidos e à imposição de limites de impactos socioambientais. São eles: 

  • Agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura;
  • Indústrias extrativas;
  • Indústria de transformação;
  • Eletricidade e gás;
  • Água, esgoto, atividades de gestão de resíduos e descontaminação;
  • Construção;
  • Transporte, armazenagem e correio;
  • Serviços sociais para a qualidade de vida.

A maioria dos setores incluídos espelham as taxonomias da Colômbia e do México, por compartilharem de uma economia baseada no setor primário. 

Um diferencial, no entanto, é a inclusão da indústria extrativa, que não apresenta referências estrangeiras na apresentação. “Essa indústria tem um peso enorme no Brasil, é muito importante. Também já sofremos eventos climáticos e ambientais de extrema preocupação na área de mineração, como os desastres de Mariana e Brumadinho [da Samarco e Vale], então é preciso ter esse olhar”, afirma a subsecretária. 

Por ora, o setor de mineração não está incluído explicitamente na taxonomia brasileira e, no mundo, não há precedente de critérios para esse setor. Discute-se o desenvolvimento de um novo conjunto técnico para mineração junto ao Chile, que também contempla incluir o setor na taxonomia. 

Já a educação, que integra a taxonomia europeia, ficou de fora da brasileira, por enquanto. “Tudo isso foi muito discutido”, diz Reis, “Educação, assim como saúde, pode entrar no que chamamos de ‘outros serviços’, mas vai depender tanto da consulta pública quanto do desenvolvimento dos trabalhos.”

Como medir os avanços e alcançar as metas

Oito grupos técnicos setoriais e dois temáticos serão criados agora e ficarão responsáveis por elaborar uma metodologia para definir os critérios específicos, que leve em consideração as particularidades de cada área. 

Para o objetivo de mitigação das mudanças climáticas, por exemplo, a classificação deve ser binária: o projeto cumpriu ou não os critérios apresentados. Já para o uso sustentável do solo e das florestas, será analisada a possibilidade de classificação gradual, como é feito na Colômbia e no México, com cumprimento de atividades básicas, intermediárias e avançadas.

Entre os grupos temáticos, um será focado no enfrentamento de desigualdades e o outro no monitoramento, reporte e verificação da aplicação dessa taxonomia. 

Os objetivos sociais têm um menor número de referências e métricas ao redor do globo do que os ambientais. Entender e debater os critérios será o foco do grupo técnico, afirma Reis.

“Um exemplo concreto é olhar o tipo de emprego gerado [pela empresa], em que região, o perfil dessas pessoas empregadas, se atende a critérios de representatividade de gênero, raça e região.” 

A intensidade da aplicação dos critérios também precisa ser debatida e pode variar de acordo com o proposto por cada instituição. 

Um primeiro filtro para que uma atividade seja considerada sustentável é que, simultaneamente, contribua de forma substancial com um ou mais dos objetivos definidos; não cause dano significativo a nenhum dos outros objetivos e cumpra salvaguardas mínimas, que serão definidas por legislações e normas brasileiras existentes.