COLUNA - ANA LUCI GRIZZI

Os conselhos estão preparados para a governança ambiental e climática?

Regulações domésticas e internacionais batem à porta, e o planeta não espera ninguém; o business as usual não parece mais um estratégia razoável

Mesa vazia em sala de reunião
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Estamos em um momento de reorganização e atualização do enquadramento regulatório global dos temas de sustentabilidade.

Seja porque os impactos materializados derivados de riscos climáticos e de natureza estão batendo à nossa porta mundo afora, seja porque, do ponto de vista de comércio internacional, dependências, impactos, riscos e oportunidades ambientais e climáticas são usados como pano de fundo para barreiras não-tarifárias.

Independentemente do motivo, passamos por uma transição econômica. Estacionar no modo business as usual não parece ser uma estratégia razoável para assegurar geração de valor para investidores no médio e longo prazo.

Isso significa que o papel dos conselhos de administração ganha novos contornos. Eles são os guardiões da estratégia, da inovação, do olhar para o futuro, garantindo a sobrevivência e renovação do negócio em novos cenários econômicos. Os investidores confiam aos conselheiros essa tarefa (dever fiduciário).

As obrigações internacionais assumidas pelo Brasil em relação a clima e natureza (NDC e NBSAP), os princípios de bioeconomia que lideramos e assinamos no G20 e nossos novos direcionamentos econômicos internos (Plano de Transformação Ecológica, Pacto pela Transformação Ecológica, Taxonomia Sustentável, Mercado de Carbono, Plataforma de Investimentos Climáticos etc.) têm efeito cascata, produzindo um novo quadro regulatório que impacta todos os setores de mercado.

Isso sem contar as atualizações sobre disclosure mandatório de sustentabilidade, no viés internacional impactando empresas com conexões com a Europa (CSRD) e no viés nacional impactando empresas de capital aberto no Brasil (IFRS S1 e S2).

Nesta seara, trazemos também o comitê de auditoria para a conversa, já que a tal dupla materialidade ou a materialidade financeira e a conectividade – correspondência dos dados de sustentabilidade qualitativos nas demonstrações financeiras – serão peças-chave daqui para a frente.

A pergunta: quão cientes e preparados estão nossos conselhos de administração para assumir essa nova e desafiadora tarefa de instituir governança ambiental e climática nos seus negócios?

Questão de prioridade

As agendas dos conselhos para 2025 estão em vias de fechamento. Qual o percentual de tempo dedicado a esses temas “pré-financeiros” de sustentabilidade? Quantos treinamentos estão previstos para capacitação dos conselheiros nos temas de sustentabilidade materiais ao negócio?

Aliás, o conselho validou, junto com seu corpo executivo, a construção da lista de temas materiais – de impacto e financeiros – e a consequente atualização de seu sistema de gerenciamento de risco corporativo para acoplar a avaliação forward-looking com a incorporação dos temas de sustentabilidade materiais?

2025 será um ano diferente. Mal encerramos a COP29 e estamos avaliando seus resultados e já temos toda a expectativa global para a COP30, esperando que o Brasil assuma a liderança de país megabiodiverso como líder potencial para fornecer soluções baseadas na natureza para o resto do mundo.

Não haverá nos próximos 50 anos oportunidade maior do que essa para fazermos um rebranding do nosso país, produtos e serviços.

Para estarmos aptos a aproveitar essa janela, nossos conselhos deveriam estar imersos no desempenho e implementação na governança ambiental e climática de seus negócios.

Dialogando com o poder público

Levando em conta nosso momento regulatório doméstico, que tal começar com a definição das diretrizes de engajamento do corpo executivo com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima para o desenho do Plano Clima, Planos Setoriais de Mitigação e Adaptação e, claro, Plano Nacional de Alocação

Esses documentos construirão e definirão nosso sistema de mercado para limites de emissão de gases de efeito estufa, impactando substancialmente modelos de negócios e delineando nossa precificação interna de carbono. Primeiro passo para nossa reprecificação de ativos com base em atributos ambientais e criação de novos ativos ambientais.

Absolutamente essencial, portanto, é o engajamento do setor privado nessa construção regulatória. Precisamos da ciência e da academia produzindo suas bases e do poder público para ordenar os passos de construção do nosso novo enquadramento regulatório ambiental e de clima.

Mas quem vai executá-lo e garantir seu sucesso é o setor privado, que precisará também de alinhamento estratégico com nosso sistema financeiro.

A oportunidade está posta e estamos passando por uma transformação de modelo econômico. O dever legal existe. Resta saber se os conselhos assegurarão atualização das estratégias, implantarão a governança ambiental e climática e instruirão seus executivos sobre o engajamento necessário com o poder público – agora.

Continuo otimista. Que os tempos de ação cheguem e que levemos nosso país e nossos negócios a transformarem nossa vantagem comparativa em competitiva!