Os cinco homens mais ricos do mundo dobraram suas fortunas entre 2020 e 2023. Seria o equivalente a um acréscimo de US$ 14 milhões por hora em seus patrimônios nos últimos três anos. Enquanto isso, uma mulher que trabalha na área de saúde levaria 1.200 anos para acumular o que, em média, um CEO ganha durante um ano.
Números como esses chamaram a atenção do Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos, na Suíça. No primeiro dia do evento, a Oxfam, ONG global de combate à desigualdade, lançou o relatório “Inequality Inc“, abordando o tema.
A discussão não trata necessariamente de ricos e pobres. No Brasil, quem ganha acima de R$10.000 já estaria entre os 5% mais ricos. O foco está nos ultra-ricos, bilionários e milionários do norte global, que dobraram sua fortuna nos últimos anos, mesmo com pandemia, guerra, inflação e crise climática.
A raiz do problema
Essa desigualdade não é acidente, mas uma falha de um sistema em que empresas distribuem riqueza desproporcionalmente. A cada U$100 gerados de lucro, U$ 82 são distribuídos entre acionistas. Não é surpresa que 7 das 10 maiores empresas do mundo tenham um bilionário como CEO ou principal acionista.
O relatório aborda quatro contribuições das empresas que aceleram a desigualdade: 1) diminuindo renda de funcionários; 2) evitando impostos; 3) privatizando setor público; e 4) continuando impunes em relação à poluição climática.
Sobre o clima, o relatório afirma que as 14 maiores empresas de petróleo aumentaram seus lucros em 278%, em média, entre 2018 e 2021. E lucraram US$ 144 bilhões em 2022 e US$ 190 bilhões em 2023, ao mesmo tempo que testemunhamos eventos extremos causados pelo aquecimento global.
Vale ressaltar que o fundo de perdas e danos, com aprovação celebrada na COP28, está na casa dos US$ 700 milhões – ou 0,003% do lucro anual das principais empresas responsáveis pelos danos.
Mas de quem verdadeiramente é a culpa?
Problema de narrativa
A narrativa de punição aos ricos precisa ser aprofundada para evitar as armadilhas da polarização. Taxar ultra-ricos e limitar seus rendimentos é necessário, um desejo manifestado pelos próprios bilionários, como mostra essa reportagem do The Guardian, mas precisamos mudar o protagonismo.
Nossa reflexão deve se concentrar em como podemos influenciar e alterar as regras do jogo, de modo a evitar falhas no sistema e promover uma distribuição mais equitativa da riqueza.
O relatório da Oxfam aborda três caminhos: 1) Regular corporações, desde taxar fortunas até prevenir monopólios; 2) Revitalizar o Estado, sem ser populista ou nacionalista, inchado ou anêmico; e 3) Reinventar os negócios, o que pra mim é a grande oportunidade para mudanças estruturais e ágeis.
Reinvenção dos negócios
Nós, como cidadãos, possuímos a capacidade de votar tanto nas urnas quanto com o nosso dinheiro, seja ao adquirir um produto ou investir em um fundo.
Devemos votar em corporações que não priorizam exclusivamente os acionistas em detrimento das pessoas e do planeta. Em vez disso, temos de escolher empresas que incluam trabalhadores e comunidades locais como parte do processo produtivo, onde a distribuição de riqueza é feita de forma intrínseca e não como filantropia.
Ao optar por compras locais e artesanais, considerar certificações de comércio justo ou orgânico e dar preferência a empreendedoras mulheres, indígenas ou negras, podemos transformar a narrativa de atribuir a culpa a outros para assumir a responsabilidade como nossa.
Precisamos demonstrar que reduzir a desigualdade não apenas é moralmente correto, mas também um bom negócio, gerando lucro e uma riqueza que transcende o aspecto financeiro.
* Beto Bina fundou a Farfarm.co em 2018 e, entre 2019 e 2022, foi responsável pela gestão da equipe de sourcing da VEJA (VERT no Brasil), com foco em algodão agroecológico e borracha nativa. É formado em administração com mestrado em Business for Social Impact na GCNYC