OPINIÃO

O que o comércio de emissões da União Europeia pode ensinar ao Brasil?

Olhar para o que já foi feito com sucesso pode ser estratégico, mas é preciso ir além e aproveitar os diferenciais do país

O que o comércio de emissões da União Europeia pode ensinar ao Brasil?

Como anfitrião da COP30, o Brasil ganha visibilidade para apresentar seus avanços e compromissos rumo a uma economia de baixo carbono. Mas, apesar do potencial brasileiro, o caminho ainda é longo e de muitos desafios.

Nesse contexto, olhar para o que já foi feito em outras regiões pode ser estratégico. A análise da experiência europeia, por exemplo, permite ao Brasil aprender algumas lições importantes para a implementação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), criado no final do ano passado pela Lei Federal nº 15.042/24.

O SBCE é um mecanismo cap-and-trade, assim como o Sistema de Comércio de Emissões (ETS) da União Europeia. A partir de sua implementação, empresas brasileiras receberão permissões para emitir determinado volume de gases de efeito estufa (GEE), o que será revisado periodicamente. Essas autorizações poderão ser transacionadas entre os agentes de mercado, permitindo flexibilização na redução de emissões.

Recentemente, a União Europeia divulgou que o ETS promoveu, até o final de 2024, a diminuição de 50% das emissões por ele reguladas, em relação ao ano de 2005. Em 2030, espera-se que a redução alcance 62%. Vale olhar para a experiência e observar algumas práticas que podem ser replicadas por aqui.

Primeiro, o ETS não cobre todas as emissões europeias, mas cerca de 40% delas. O SBCE também excluiu expressamente alguns setores da limitação de emissões (a agropecuária primária e unidades de tratamento e destinação final ambientalmente adequada de resíduos sólidos e efluentes líquidos). 

Isso não significa que esses setores excluídos não sejam regulados por outras políticas que promovam reduções de emissões mais apropriadas às suas especificidades, ou que nunca sejam incluídos no SBCE. Isso nos leva a um segundo ponto.

O ETS foi instituído em 2005 e construído em fases. Dessa forma, foi possível fazer ajustes durante a sua implementação para calibragem do preço do carbono e a elevação gradual da limitação de emissões, além da inclusão de novos setores. 

Na fase atual, além de instalações que geram energia e indústrias intensivas em carbono, como siderúrgicas, refinarias e fábricas de cimento, também são regulados os voos em território europeu e as embarcações comerciais que operam em águas europeias.

Outro ponto importante diz respeito aos benchmarks para a distribuição de permissões de emissões, usados no ETS para premiar as instalações mais limpas e que já tinham feito a sua lição de casa. Logo, as mais eficientes receberam mais permissões gratuitas; as menos eficientes, um número menor.

A proteção da competitividade dos agentes regulados é outra prática importante. Os setores mais expostos à concorrência internacional recebem permissões gratuitas e, a partir de 2026, mecanismo de ajuste de carbono na fronteira, o Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM). Ele será aplicado para que importadores de produtos intensivos em carbono paguem o equivalente ao preço do carbono na UE. Esse sistema permite a eliminação gradual das alocações gratuitas.

Assim, ainda que o perfil das emissões brasileiras seja diferente do perfil das emissões europeias, o SBCE tem o potencial de reduzir emissões brasileiras nos setores regulados. Para isso, não precisa inventar a roda – o ETS passou por uma série de rodadas de ajustes que nos permitem avaliar, dentre as opções testadas, o que funciona melhor para nossa realidade.

Mas vale lembrar que, diferente da UE, temos em casa a oportunidade de promover, via restauração florestal e outras soluções baseadas na natureza, a remoção e a redução de emissões que poderão compensar parte das emissões dos agentes regulados. Há um enorme potencial de plantio em áreas degradadas e aproveitamento da silvicultura de nativas que deverá ser explorado e absorvido pelo mercado regulado.

Cabe agora ao Brasil aproveitar estes diferenciais, para ser o exemplo que buscamos para o mundo.

* Daniela Stump é sócia do DCLC Advogados e coordenadora do curso de Mercado e Regulação do Carbono da Trevisan Escola de Negócios