OPINIÃO

Novo modelo econômico traz escala à restauração florestal

Concessões públicas têm o potencial de restaurar 2,7 milhões de hectares na Amazônia, remover 1 bilhão de toneladas de CO2 e gerar mais de 1 milhão de empregos 

Novo modelo econômico traz escala à restauração florestal

A área de proteção ambiental Triunfo do Xingu figura há décadas no ranking de desmatamento devido, sobretudo, a atividades ilegais, como a grilagem de terras. Para romper esse histórico modelo predatório por um que impulsione a restauração, o governo do estado do Pará concedeu uma área de 10 mil hectares, por 40 anos, para restauração.

Essa área, desmatada por ação de um grileiro, agora será palco de uma mudança de modelo econômico. As concessões permitem ao poder público delegar o direito de uso, por tempo determinado, de áreas a empresas privadas, ONGs ou comunidades locais, para promover a recuperação da vegetação nativa e o uso sustentável dos recursos florestais.

É também uma ferramenta que aumenta a presença do estado no território e um modelo estratégico para áreas como as chamadas “florestas públicas não destinadas” que, por não possuírem função social definida, têm sido foco de invasões e desmatamento.  

Essa é a primeira experiência deste tipo no Brasil e na Amazônia. Seu modelo de negócios, estruturado por um consórcio de organizações, mostrou que é viável economicamente, tendo como fonte principal de receita os créditos de carbono gerados com a restauração, com uma expectativa de receitas de quase R$ 870 milhões ao longo dos 40 anos de contrato, sequestrando 3,7 milhões de toneladas de CO2 da atmosfera.

Vale destacar a participação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ao sinalizar a primeira garantia pública para um projeto desse tipo no Brasil, ajudando a mitigar o risco de perda de investimento privado. Além disso, o BID Invest expressou seu interesse em fornecer financiamento ao vencedor do leilão. 

As complexidades e desafios da Amazônia, além do desconhecimento, associados ao ineditismo da iniciativa, tornam as decisões de investimento privado mais difíceis. Mesmo assim, o edital contou com a participação de duas empresas na concorrência.  Após todo o processo de avaliação das propostas, realizado pela comissão de licitação do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Pará (Ideflor-Bio) com apoio da B3, apenas uma das propostas atendia aos requisitos.

A Systemica foi a vencedora do certame, destacando-se como uma empresa com sólida experiência no território, um fator crucial para sua entrada. Acreditamos que a expansão e consolidação da agenda de concessões de restauração atrairá ainda mais interessados em futuras licitações, fortalecendo o setor e promovendo novos projetos. 

O Pará já anunciou que irá lançar mais duas áreas para concessão de restauro, totalizando 30 mil hectares. Mas, na Amazônia Legal, existem 2,7 milhões de hectares que podem ser restaurados com esse modelo, removendo quase 1 bilhão de toneladas de dióxido de carbono equivalente da atmosfera nos próximos 40 anos.

Essa solução pode ainda se expandir para todo o país, já que o governo federal lançou o Programa de Concessão de Restauração Florestal, que visa restaurar áreas de preservação permanente, reservas legais e outras áreas públicas. 

As áreas para concessão, além de já desmatadas, não podem estar em requisição de comunidades tradicionais, nem haver histórico de retirada involuntária de populações, critério fundamental para que a ocupação da área tenha um impacto positivo no bem-estar econômico e social das comunidades locais.  

 Esse modelo de concessão vai ajudar o Pará e o Brasil a cumprir com suas metas de restauração, como o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que visa recuperar 12 milhões de hectares até 2030. Por isso, as concessões evidenciam que a restauração florestal e o desenvolvimento econômico não são antagônicos e, agora, iniciam um novo capítulo de esperança para a Amazônia. 

*José Otavio Passos é diretor da The Nature Conservancy (TNC) Brasil para Amazônia. A TNC Brasil liderou o consórcio técnico que apoiou o edital do Pará, formado pelas empresas Vallya (modelagem financeira e PMO), Plantuc (socioambiental, comunicação e engajamento de stakeholders), Geonoma (restauração e carbono) e Maciel Rocha Advogados (modelagem jurídica)