A vida das crianças é muito mais emocionante do que a que testemunhamos como pais, educadores, familiares, cuidadores ou espectadores.
Graças à imaginação, superpoder que vai sendo censurado à medida que crescem, elas descobrem o mundo e entendem seu funcionamento. Desenvolvem mecanismos para superar desafios emocionais, aprimorar raciocínio lógico e elaborar pensamentos abstratos.
Passeiam pelo impossível, fazendo dele realidade inquestionável. Inventam o que já existe com a convicção do ineditismo e palavras que fazem tudo parecer mágica. Vão ao supermercado fantasiadas de princesas, piratas e unicórnios. Têm animais de pelúcia com quem conversam por horas a fio. Olham longamente pelos vidros da janela e vivem uma grande aventura, em 10 minutos, interagindo com o que apenas seus olhos vêem.
É o famoso “faz-de-conta”, que muitas vezes acontece sem aviso prévio; em outras é anunciado, como um pedido de licença para sonhar. Os convites para brincar, com outras crianças ou com adultos, costumam vir precedidos de um “finge que”, e o céu é o limite.
Adversidades do nosso tempo clamam por mentes imaginativas para nos tirar de impasses e, literalmente, nos salvar. Imploram para que embarquemos na “fantasia” que trará as soluções, de preferência sem pressa. Há muito a reaprender, especialmente quando se trata de mudanças climáticas e seus impactos.
Um livro que nos catapulta a esse mundo do “e se?” é Suponhamos, do colombiano Ivar da Coll e traduzido por Márcia Leite, publicado pela Pulo do Gato. A obra é de 1990, mas só chegou ao mercado brasileiro, em português, no ano passado
Como em um workshop de inovação, desses em que as empresas fazem um grande brainstorming para criar novos produtos, o leitor é imediatamente convidado – desde o título – a imaginar uma situação insólita e ainda divertida: e se as rãs fossem crianças e as crianças fossem rãs? E se as crianças coaxassem, andassem nuas e morassem nas margens das lagoas? E se as rãs usassem roupas e frequentassem a escola?
As suposições vão sendo exploradas e aprofundadas, apenas por meio de perguntas, para que a imaginação do leitor – pequeno e grande – vá construindo um cenário que, aos poucos, começa a ficar desconfortável. De onde, supostamente, virão ideias brilhantes para escapar dele.
Mais do que um exercício de empatia, sempre válido e útil, proporcionado pela proposta de inversão de papéis, a obra coloca o dedo na ferida das questões de poder entre o ser humano e a natureza. Traz à tona conceitos de superioridade e inferioridade e o tema da dominação e suas consequências. Propõe também uma revisão das discussões sobre hierarquia na natureza.
Uma obra para incomodar durante e depois da leitura. Perguntas difíceis vão surgir. Vai da sua imaginação transformar o desconforto em uma boa ideia ou, no mínimo, em uma boa conversa que não seja esquecida.
Sobre o autor
Ivar da Coll nasceu em Bogotá, em 1962, e é um dos mais reconhecidos artistas colombianos. Representou o país em importantes instituições e premiações dedicadas à literatura para infância, como a Lista de Honra do IBBY (International Board on Books for Young People); a seleção White Ravens, da Biblioteca Internacional de Munique e a menção especial do Prêmio Melhores Livros Infantis, do Banco do Livro da Venezuela, entre outros. Pelo conjunto de sua obra, foi indicado aos prêmios Astrid Lindgren Memorial e ao Hans Christian Andersen.
Ivar da Coll, tradução de Márcia Leite
Editora Pulo do Gato, 2023
Novas livrarias
Na contramão do desequilíbrio das relações entre o ser humano e a natureza, novas livrarias independentes vêm nascendo. Boa notícia para os bairros e seus leitores, de todas as idades.
A desproporção no território brasileiro ainda é grande. Nessa última leva, apenas uma fora do eixo RJ-SP: Pó de Estrelas, em Recife, da editora de mesmo nome, que venderá obras de editoras independentes de todo o país e também de editoras pernambucanas. Hora de fazer um tour literário!
Bibla
Praça Profa. Emília Barbosa Lima, 58, Alto de Pinheiros, São Paulo
Segunda a sexta, das 12h às 20h; sábados das 09h às 17h
Livraria Bandolim
Rua Conselheiro Brotero, 952, Santa Cecilia, São Paulo
Terça a sábado, das 10h às 19h
Livraria Caraíbas
Rua Caraíbas, 586, São Paulo
Terça a domingo, das 10h às 19h
Casa Cosmos
Rua Natingui, 544, São Paulo
Terça a sexta, das 10h às 19h; sábados, das 9h às 19h; domingos, 9h às 16h
Megafauna
Rua Nestor Pestana, 196, São Paulo
Terça a sexta, das 12h às 21h; sábado, das 10h às 21h; domingo, das 10h às 18h
Pó de Estrelas
Rua dos Arcos, 60, Recife
Terça a domingo, das 9h às 19h