Como o Brasil pode criar um 'G20 do impacto'

A liderança brasileira no grupo das maiores economias é uma oportunidade única de levar a agenda do impacto ao principal fórum multilateral do mundo

Bandeiras dos países integrantes do G20
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Vivemos um ponto de inflexão em nossa civilização. As desigualdades e a emergência climática alcançam patamares nunca antes vistos. A possibilidade real de não conseguirmos cumprir com compromissos globais como a Agenda 2030 e o Acordo de Paris demonstra um problema estrutural: a governança global está em crise.

Em meio a esse cenário, o G20, grupo das 21 maiores economias – 19 países e dois blocos econômicos, Europa e África – se consolida como o principal espaço multilateral no mundo. O grupo reúne dois terços da população e 85% do PIB mundiais, 75% do comércio internacional e 80% do total de emissões de gases de efeito estufa e equivalentes.

Evidentemente, qualquer mudança de paradigma econômico deve passar por esse espaço a fim de alcançar coordenação, alinhamento e clareza de implementação. O sucesso numa organização como o G20 implica, no entanto, um esforço multidimensional, que passa por desafios como assegurar uma proposta tecnicamente aceitável, engajamento entre sociedade civil e governos, alto nível de articulação com negociadores e, dando tudo certo, o êxito com uma linha numa declaração assinada pelos líderes chefes de Estado na cúpula do Rio de Janeiro, nos dias 18 e 19 de novembro.

Por isso, o sucesso do G20 não está apenas na incidência dos compromissos firmados, mas também no longo processo de construção e negociação a que um país-sede se propõe.

O Brasil preside o grupo desde 1 de dezembro de 2023 e tem a missão de liderar duas trilhas políticas, a financeira e a dos sherpas, e uma trilha de engajamento e participação social, o G20 Social.

A fim de orquestrar um grupo nacional e internacional de organizações da sociedade civil que buscam influenciar e agir nesse espaço de forma convergente, lançamos nesta sexta-feira a coalizão global G20 pelo Impacto. Trata-se de um movimento com três objetivos: 

  • Construir capital social e qualificar o debate em torno do G20;
  • Aportar com contribuições concretas, práticas e objetivas para acelerar a transição econômica;
  • Garantir a continuidade dessa agenda por meio de articulação para o G20 na África do Sul em 2025. A continuidade e compromisso das lideranças com uma mudança econômica efetiva são fundamentais para a transição bem sucedida e acelerada que a humanidade e o planeta precisam.

Entre as propostas do grupo, que inclui organizações como Fórum Econômico Mundial, Schwab Foundation, Skoll Foundation, B Team, GSGII, Catalyst 2030, entre outros, está a criação de uma identidade jurídica – as Benefit Corporations.

Essa legislação já foi aprovada em mais de 50 jurisdições distintas, sendo 44 Estados americanos e 8 países, e permite que administradores tenham seu dever fiduciário vinculado com a geração de impacto material positivo, consideração de stakeholders nas decisões de curto e longo prazo e o uso de uma ferramenta de terceira parte independente para medir, gerenciar e reportar seu impacto.

A proposta do Fórum Econômico Mundial aprofunda como destravar uma economia de inovação e impacto socioambiental por meio de cinco macroações prioritárias, como a incidência em compras públicas e a promoção de um ambiente institucional mais favorável.

O Catalyst 2030 propõe a criação de um novo grupo de engajamento, chamado SI20 (ou Social Innovation 20), com o objetivo de qualificar a discussão de como integrar esse novo setor econômico.

A coalizão conta com a colaboração adicional de órgãos da administração pública, como o Conselhão da Presidência da República, o Comitê da Estratégia Nacional de Economia de Impacto (Enimpacto), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e a secretaria de bioeconomia, do Ministério do Meio Ambiente.

Tais propostas estão diretamente relacionadas às atividades de grupos de trabalho como o de finanças sustentáveis, que tem entre suas prioridades temas como padronização e obrigatoriedade de relatórios de impacto, condições para a transição justa, governança de fundos climáticos e financiamento de soluções baseadas na natureza.

O G20 pelo Impacto é globalmente coordenado pela Din4mo Lab, organização sem fins lucrativos criada pela Empresa B Din4mo com o objetivo de fortalecer o ecossistema de economia de impacto. A iniciativa dialoga com um dos principais desafios da presidência do Brasil no G20: reduzir o número de propostas nas mãos dos negociadores. Por isso, é crucial que as contribuições sejam qualificadas, concretas, convergentes e muito bem coordenadas.

* Marcel Fukayama é cofundador da Din4mo e do Sistema B Brasil, Senior Policy Advisor do B Lab e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS) da Presidência da República.