“Não vamos reinventar a roda”. É o que promete o gestor do Vinci Climate Change, de R$ 2 bilhões, em fase final de captação. O mandato do fundo é investir em infraestrutura que gere impacto positivo para o clima, tanto em mitigação quanto em adaptação.
“Desenhamos a nossa taxonomia com base na da União Europeia, focando naqueles setores em que temos experiência e histórico e em que o Brasil tem vantagem competitiva e abundância de recursos para se diferenciar”, diz José Guilherme Souza, sócio da Vinci Partners responsável pela estratégia de infraestrutura (na foto).
Deixando de lado grandes inovações, a gestora juntou duas pontas: de um lado, investidores internacionais em busca de ativos sustentáveis; do outro, projetos de energia renovável e saneamento no Brasil à procura de capital.
O veículo atraiu capital institucional estrangeiro de peso. O Banco de Investimento Europeu (EIB, na sigla em inglês) colocou US$ 55 milhões, e o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB), outros US$ 50 milhões.
Um fundo de fundos gerido pela Allianz Global Investors, o Emerging Market Climate Action Fund, investiu US$ 25 milhões, e o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF), US$ 10 milhões.
Um aspecto foi decisivo para que a gestora acessasse esses recursos: o enquadramento do fundo no artigo 9 da Sustainable Finance Disclosure Regulation (SFDR). Segundo as regras da União Europeia, essa categoria reúne produtos que investem em negócios sustentáveis.
A demanda por fundos compatíveis com o artigo 9 é crescente e tem feito com que europeus busquem alternativas para além de suas fronteiras. Só o EIB tem como meta atingir 1 trilhão de euros em investimentos sustentáveis até o fim da década – entre 2021 e 2023, o banco aplicou 349 bilhões de euros nesses ativos.
No Brasil, as gestoras correm na tentativa de aumentar a oferta na prateleira para atrair esse dinheiro. “Boa parte não viria se o fundo não fosse artigo 9. Fez toda a diferença e, não à toa, grande parte do capital desse fundo é de investidores internacionais”, diz Souza.
Os fundos se enquadram em três artigos da SFDR, a depender do seu grau de comprometimento com a sustentabilidade:
- Artigo 6, para produtos sem atributos de sustentabilidade;
- Artigo 8, cobrindo fundos conhecidos como “light green” (verde claro), que promovem fatores ESG; e
- Artigo 9, onde entram os chamados fundos “dark green” (verde escuro), que têm como política aplicar em ativos com objetivos sustentáveis.
O fundo da Vinci está em fase final de captação, com 80% dos R$ 2 bilhões (cerca de US$ 400 milhões) de recursos previstos já na conta. O investidor-âncora foi o BNDES, que aplicou R$ 500 milhões por meio de um edital público para desenvolver o mercado de capitais no setor de infraestrutura.
Tese de investimentos
Souza conta que a gestora usou sua experiência acumulada em outros fundos de infraestrutura da casa para montar o desenho do Vinci Climate Change. Em outros três fundos, a gestora tem participação em ativos e empresas de energia elétrica, logística e transportes, água e saneamento e óleo e gás.
“Eu tenho dois critérios de elegibilidade para colocar um ativo dentro desse portfólio. Um é demonstrar que ele causa um impacto positivo para o clima. O segundo é retorno”, diz Souza.
Ele é crítico dos estrangeiros que abrem mão de retorno para poder investir em ativos climáticos. “No Brasil não precisamos fazer isso, e o nosso fundo tem metas de retorno para cumprir.” A gestora não informa a expectativa de rendimento, apenas que será em reais, já que fará alocação em ativos nessa moeda.
O veículo tem como diretriz para os investidores aplicar entre 50% e 70% do patrimônio em projetos de energia renovável e aproximadamente 30% em água e saneamento. O prazo de alocação dos recursos é de quatro anos.
Os dois primeiros investimentos já aconteceram em usinas solares. “Eles fazem parte de um objetivo de construir uma empresa com 100 megawatts de capacidade instalada. Esses dois primeiros investimentos já cumprem 50% do nosso objetivo”, diz o executivo.
Em saneamento, a Vinci está de olho em concessões e parcerias público-privadas (PPPs). A ideia é reproduzir o modelo em que o fundo entra com os recursos em parceria com um operador, como fez na Rio+Saneamento. A gestoria é sócia da operadora Águas do Brasil, concessionária de água e esgoto de 18 cidades fluminenses.
O fundo também tem mandato para investir em descarbonização, ativos ligados à eficiência energética e ao armazenamento de energia. O primeiro leilão para armazenamento de energia do setor elétrico no Brasil, previsto para o ano que vem, está no radar.
Os combustíveis sustentáveis também estão na tese de investimentos: biogás, biometano, hidrogênio verde, etanol de segunda geração e SAF (combustível sustentável de aviação, na sigla em inglês) – sempre com a ótica da infraestrutura. “Nós não vamos investir no que chamam de climate tech, este não é um fundo de tecnologia”, afirma o gestor.
Apesar do foco inicial no Brasil, Souza diz que o fundo tem um caminho “muito claro de crescimento pela frente”, com a possível expansão para outros países da América Latina e, eventualmente, com a incorporação de outros setores.