Trampay capta R$ 1,9 mi e quer ser banco dos entregadores de apps

Fintech adianta pagamentos das plataformas para que trabalhadores cubram despesas essenciais como combustível e manutenção

Fintech de Impacto Social, a Trampay é um banco digital para profissionais da entrega e autônomos de todo Brasil
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A fintech Trampay, que tem a ambição de ser uma espécie de banco para entregadores de aplicativos, recebeu um aporte de R$ 1,9 milhão em uma rodada pré-seed liderada pela Potencia Ventures, grupo de venture capital voltado para negócios de impacto.

Além do R$ 1,25 mi da Potencia, a Cedro Capital, gestora de recursos independentes com foco em empreendedores do Centro-Oeste, Minas Gerais e Tocantins, investiu R$ 250 mil e os outros R$ 400 mil vieram de investidores-anjo. 

No ano passado, a Trampay já havia captado R$ 5 milhões por meio de um Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios (FDIC) com a Cedro Capital. 

A startup brasiliense nasceu de uma constatação sobre as finanças desses trabalhadores, diz o cofundador e diretor de operações da Trampay, Tiago Ribeiro. “Entendemos que há um problema de alavancagem [financeira], de acesso rápido a dinheiro, por entregadores de aplicativos. Então começamos a preencher esse espaço”, afirma ele.

A linguagem pode soar sofisticada, mas Ribeiro se refere a questões prosaicas do dia-a-dia dos entregadores. Ele e os cofundadores Jorge Junior (à esquerda na foto) e Vitor Quaresma que viam diariamente entregadores se dirigirem a uma operadora logística que presta serviços para aplicativos para pegar vales.

“Muitos moram na periferia, vêm trabalhar no centro e não têm R$ 50 para colocar gasolina. Então essas empresas tinham de fornecer vales para que eles pudessem começar a trabalhar”. 

As plataformas costumam fazer pagamentos semanais. No Rappi, por exemplo, o entregador recebe às terças-feiras o dinheiro dos sete dias anteriores. No iFood, as entregas são contabilizadas de segunda a domingo, e o dinheiro cair às quartas – ou no próximo dia útil, em caso de feriados.

Se o trabalhador está ligado a algum intermediário – tipicamente companhias administram o fluxo dos entregadores e fornecem pontos de apoio nas cidades –, o ciclo pode ser muito mais longo. Segundo mapeamento da Trampay, a demora chega a 25 dias.

“Entrevistamos entregadores e eles relataram que algumas vezes deixam de comer para levar dinheiro para casa, abastecer a moto e poder trabalhar no dia seguinte”, afirma Ribeiro. 

Como funciona

O serviço prestado pela startup é uma antecipação de pagamentos. Ao abrir uma conta com a Trampay, o entregador permite que a companhia tenha acesso à informação de seus ganhos diários. Ele ou ela pode escolher se quer ou não receber aquele valor adiantado. 

Eis um exemplo prático: um trabalhador que receberia apenas no 10º dia do mês, mas fez R$ 200 já no dia 2, pode pedir esse valor no mesmo dia para a Trampay. Em troca, a startup cobra uma taxa de R$ 5,49 pela transação – um valor fixo, não uma taxa percentual, como de praxe.

A ideia é que essa liquidez cubra gastos com manutenção da moto, combustível ou alimentação. O abastecimento é particularmente crítico, segundo Ribeiro. Sem ter de esperar o pagamento cair, o entregador consegue trabalhar mais dias e aumenta sua renda mensal em até 20%.

As transações ficam em R$ 140 em média. São 20 mil usuários cadastrados, distribuídos por 21 Estados. A meta é chegar a 50 mil usuários com os recursos do aporte. 

A startup já movimentou mais de R$ 360 milhões em 1 milhão de transações. A taxa de inadimplência é de 0,02%, com o débito automático das tarifas feitas pela Trampay. 

“A nossa primeira antecipação foi no meio de 2022 e, naquele mês, emprestamos R$ 15 mil. Um ano depois, esse valor já subiu para R$ 1 milhão.”

Um dos fatores que atraíram a Potencia foi o crescimento de usuários e receita da startup ao longo de 2023, que aumentou em sete vezes em comparação ao ano anterior, diz Itali Collini, diretora da Potencia Ventures no Brasil.

Na semana passada, uma falha técnica no iFood resultou em atraso de pelo menos 24 horas no pagamento semanal de entregadores e estabelecimentos.  

Sem uma regulamentação para o serviço, os entregadores ficam à mercê dos processos das companhias. A expectativa é que o governo federal envie nesta segunda-feira uma proposta para o Congresso Nacional com remuneração mínima e contribuição previdenciária para motoristas de carros – mas motociclistas e entregadores ficaram de fora.

Além das motos 

A Trampay quer extrapolar o mundo dos entregadores e ampliar o serviço para outros trabalhadores informais do país. Caminhoneiros, porteiros, faxineiras e outros que também usam aplicativos ou empresas intermediárias poderiam se beneficiar dos serviços da startup.

“O objetivo da Trampay nunca foi oferecer apenas adiantamento, mas essa era a necessidade urgente, então começaram por aí”, diz Collini. “A ideia é que, no futuro, a Trampay seja um banco completo com financiamento de motos, casa, e produtos financeiros que complementem a jornada dos entregadores”. 

Por ora, os clientes podem fazer transações com Pix, pagar boletos e fazer recarga de celular, por exemplo. A fintech também conta com parcerias para ofertar plano odontológico, seguros de vida e acidente, e descontos em farmácias, academias e outras lojas. 

Esse é o primeiro investimento do Potencia Up, um programa criado pelo grupo de mesmo nome com foco em empreendedores de grupos minorizados, como pessoas negras, mulheres, LGBTs e pessoas com deficiência. A tese de investimento foca em empregabilidade, onde se encaixa a Trampay, e educação. 

A iniciativa contou com 20 startups e, depois de um ano de mentorias coletivas, vai selecionar cinco delas para receber os cheques.