A gestora de impacto brasileira Good Karma Partners anunciou nesta quinta-feira (8) uma fusão com a americana Just Climate, empresa de investimentos focada em soluções climáticas da Generation Investment Management, fundada pelo ex-vice-presidente dos EUA Al Gore.
Sob o nome Just Climate, a equipe da GK será responsável pela estratégia para toda a América Latina. Os aportes devem se concentrar em duas áreas: inovações para setores de difícil descarbonização, como por exemplo a siderurgia; e negócios dedicados à restauração de ecossistemas e à transição de atividades que dependem da terra, como a agropecuária.
“O mundo não precisa de mais um fundo para fazer eólicas offshore na Inglaterra”, afirma Eduardo Mufarej, fundador da GK que agora assume como co-chief investment officer da nova gestora. “A gente precisa fazer com que a América Latina tenha uma parte maior da alocação global de investimentos climáticos, dado o tamanho da oportunidade.”
O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) será um dos investidores fundadores do veículo – que a companhia chama de estratégia – pós-união de forças.
Questionado sobre o seu tamanho, Mufarej afirma que mais informações devem ser divulgadas na época da COP30, que acontece em novembro, em Belém (PA).
A ideia é que o valor seja superior ao do Good Karma II, segundo fundo da GK, que levantou cerca de R$ 500 milhões e investiu em nove companhias – o décimo e último aporte deve ser anunciado nas próximas semanas. O GK I captou cerca de R$ 40 milhões.
O foco será exclusivo na região. A Just Climate também conta com US$ 1,5 bilhão voltados para o setor industrial global, e uma outra estratégia inteiramente dedicada à natureza. Esta última anunciou em março uma captação inicial de US$ 175 milhões junto ao Fundo de Inovação Climática da Microsoft e ao fundo de pensão dos professores da Califórnia (CalSTRS).
Transição da terra
A tese de investimento inclui negócios que viabilizem um uso mais sustentável da terra. Em termos de emissões de gases de efeito estufa, este é um dos maiores problemas climáticos do Brasil.
“Temos muita pecuária de baixíssima produtividade e pastagens degradadas. Acreditamos em uma transição acelerada desse uso da terra”, diz Mufarej, mencionando modelos que integrem pecuária a cultivo agrícola ou florestas, por exemplo.
O produtor rural teria como benefício ganhos de produtividade e rentabilidade, e a Just Climate atingiria seus objetivos de impacto positivo. Mas, diferentemente das companhias de perfil semelhante que têm surgido no país, Mufarej vai buscar negócios cujo modelo não envolva a compra de terras.
“Se usar os recursos para isso, estarei sempre limitado no total de hectares que consigo comprar. Prefiro apostar em que viabiliza essa transformação”, diz o gestor.
Mas essas empresas indutoras de mudança existem no Brasil ou na região? Mufarej diz que não – ainda. “Mas vão existir, não tenho nenhuma dúvida. É um modelo que vai surgir nos próximos cinco anos.”
O chamado powershoring – atrair empresas interessadas na eletricidade de fontes renováveis brasileira, para instalar data centers, por exemplo – também é uma possibilidade, diz Mufarej.
A Just Climate é o principal acionista da Stegra (ex-H2 Green Steel), siderúrgica sueca pioneira na produção de aço verde usando um método baseado em hidrogênio de baixo carbono.
“A Stegra está olhando para o Brasil e para o Canadá como principais mercados potenciais para expansão”, afirma o gestor. “Temos eficiência logística para produção de aço, minério de qualidade. Faz bastante sentido.”
O cenário global
Quanto à sensação de um certo “pé no freio” das iniciativas de descarbonização, especialmente diante da instabilidade trazida pela eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, Mufarej tem uma leitura alternativa.
Em sua opinião, o que tem acontecido é uma “volta à racionalidade”. Empreendimentos que dependem de subsídios terão dificuldade de parar em pé, afirma ele. O mesmo se aplica a produtos que precisam cobrar o chamado “prêmio verde”.
“Se você é um gerador de inflação na minha cadeia de suprimentos, está criando um problema em vez de trazer soluções. As inovações que vão ganhar escala são aquelas com eficiência de custo.” Ele acredita em uma “depuração saudável” do mercado.
Mas isso não quer dizer menos demanda por energia limpa e uma desaceleração da transição energética.
“Na semana passada ouvi de um gestor que toca o portfólio de infraestrutura de alguns dos maiores investidores do mundo: ‘Vou investir em carvão de novo? Daqui quatro anos entra um novo governo nos EUA. Vou carregar por mais de dez anos um ativo de uma indústria suja, que eu sabia que estava prestes a morrer?’”