VP da Vale contrapõe excelência a diversidade em rede social: “Performance é o nome do jogo agora”

Postagem de Catia Porto, que acaba de assumir a área de RH, levantou dúvidas sobre eventual retrocesso na política de diversidade e inclusão da mineradora; Vale diz que não há mudança em política e diretrizes

Logotipo da mineradora Vale
A A
A A

Em postagens em uma rede social, a nova vice-presidente executiva de pessoas da Vale, Catia Porto, defendeu políticas de recursos humanos voltadas à meritocracia e excelência em contraposição a ações de diversidade. 

“A cultura woke está perdendo espaço. Ao contrário do DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão), que foca na diversidade como elemento chave, tem um novo movimento chamado MEI (Mérito, Excelência e Inteligência), que enfatiza uma combinação de mérito e altos padrões de desempenho juntamente com habilidades intelectuais”, escreveu Porto em uma série de quatro postagens nos stories em sua conta no Instagram na semana passada.

“E quem entende movimentos sabe que ou você se adapta rapidamente e surfa a onda de forma mais tranquila ou vai ficar na lanterninha… no grupo que reclama, resiste e não sai do lugar…”, afirmou a executiva – veja a íntegra do texto das postagens ao fim da reportagem ou nos prints abaixo (esse tipo de publicação fica no ar apenas 24 horas).  

Woke é uma expressão em inglês que indica um “despertar” para questões de desigualdades sociais, como o racismo estrutural, e foi criado por movimentos progressistas dos Estados Unidos. Nos últimos anos, porém, tem sido usado de forma pejorativa por políticos da extrema-direita – com reflexos também no mundo corporativo, com empresas reduzindo programas de diversidade.

Junto com a imigração, as ideias de inclusão foram um dos alvos principais de Donald Trump em sua campanha eleitoral. Kamala Harris, sua adversária, foi chamada de “candidata DEI” – a ex-senadora democrata tem ascendência jamaicana e indiana.

Horas depois de tomar posse, Trump assinou um decreto intitulado “Acabando com programas DEI radicais e perdulários”, que seriam iniciativas “de discriminação ilegais e imorais”. Ele voltou a atacar o tema semana passada, quando culpou políticas de diversidade pelo acidente aéreo que aconteceu em Washington.  

Nova gestão na Vale

Porto assumiu a vice-presidência de pessoas, que cuida dos recursos humanos da mineradora, no fim do ano passado, na esteira das mudanças no alto escalão da companhia. O novo presidente da Vale, Gustavo Pimenta, anunciou o nome dela e de mais dois vice-presidentes no Vale Day, encontro anual da mineradora com investidores, que aconteceu no dia 3 de dezembro, em Nova York. 

A postagem levantou dúvidas sobre uma possível volta atrás nas políticas de diversidade e inclusão da Vale. Segundo uma pessoa próxima à empresa, que pediu para não ser identificada, há uma preocupação de funcionários da área de pessoas da mineradora de que haja um desmonte dos compromissos que a empresa fez em 2019 e das ações implementadas desde então. 

A reportagem do Reset procurou a Vale, via assessoria de imprensa, e pediu um posicionamento sobre a postagem da executiva e questionou se há mudança nos compromissos ou condução das políticas de diversidade da companhia. Em nota, a empresa não comentou as postagens e reafirmou seus compromissos.  

“A Vale informa que não há mudanças em suas políticas e diretrizes para a agenda de diversidade e inclusão. Seguiremos trabalhando para garantir que nossa equipe reflita a pluralidade da sociedade brasileira, sempre com base no mérito, no respeito e na inclusão”, diz a nota. 

A companhia informa que estabeleceu a meta de dobrar a representatividade de mulheres na força de trabalho até o fim deste ano, de 13% para 26%, e conseguiu atingi-la em 2024, com 8 mil mulheres a mais em seus quadros. Outro compromisso público é o de alcançar 40% de pessoas negras em posições de liderança até 2026, atualmente em 37% – negros são 56% da população brasileira, segundo o IBGE.

“A companhia acredita que a pluralidade aprimora a capacidade de trazer novas soluções para o negócio, gera mais engajamento e contribui para a inovação, a performance e a eficiência. Nosso objetivo é criar um ambiente em que todos, independentemente de origem, identidade ou experiência, sintam-se valorizados e tenham oportunidades iguais de desenvolvimento”, diz a Vale. 

Contexto dos posts

O texto foi publicado pela executiva ao responder uma pergunta de um seguidor: “Na sua visão, por que as empresas estão retornando para o modelo presencial de trabalho?”. Para responder, ela aponta uma reportagem do jornal americano Wall Street Journal sobre o tema . 

Com o título “O equilíbrio do poder volta a pender para o lado dos chefes”, a reportagem do início de janeiro conta que grandes empresas estão endurecendo as políticas de trabalho remoto, reduzindo orçamentos de viagens e cortando benefícios dos funcionários, como bônus e licença de saúde.

Embora não haja uma relação clara entre a ideia de trabalhar de casa e o que costuma ser descrito como parte de um suposto “ideário woke”, a executiva diz que a “cultura woke” está perdendo espaço e faz menção a um movimento de “meritocracia, excelência e inteligência” que estaria substituindo as atuais políticas de diversidade, equidade e inclusão das empresas. 

As políticas de diversidade ganharam força nos Estados Unidos depois do assassinato de George Floyd por policiais em maio de 2020, que gerou uma série de protestos pelo mundo. No Brasil, outro assassinato de um homem negro marcou esse movimento: o de Beto Freitas, espancado até a morte por seguranças do Carrefour em Porto Alegre, em novembro de 2020. 

As críticas a uma suposta incompatibilidade entre programas de inclusão e contratações baseadas em mérito e competência são tão antigas quanto essas políticas afirmativas. Mas o tema tornou-se especialmente explosivo na era das redes sociais.

Em 2020, a co-fundadora do Nubank Cristina Junqueira pediu desculpas por declarações dadas sobre a dificuldade de contratação de pessoas negras pelo banco. Ela disse que ação afirmativa seria “nivelar por baixo”.

Perfil da VP

Cátia Porto é formada em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ) com pós-graduação em gestão de recursos humanos e cursos em escolas de negócios na Inglaterra, França e Estados Unidos. 

No perfil da executiva em seu site, a Vale lista as grandes empresas pelas quais Porto tem passagem: Grupo Big, Walmart, Nokia, Grupo BAT e United Health Group (UHG).

Segundo seu perfil no Linkedin, antes de assumir sua posição na Vale, ela tirou um período sabático de sete meses, entre junho e dezembro de 2024. Antes disso, trabalhou como vice-presidente de recursos humanos do Carrefour por quase cinco anos.   

A executiva é seguida por 136 mil pessoas em seu perfil no Instagram, chamado “Talent Talks”, no qual faz postagens sobre carreira e cultura corporativa. Na descrição do perfil, destaca sua carreira internacional, prêmios na área de RH e a quantidade de alunos e mentorandos. Um dos destaques, chamado de “Ella”, traz depoimentos de alunas. 

Em uma publicação no Linkedin há três meses, a executiva conta do Ella, que descreve como um “programa tímido” que estaria “se transformando na maior comunidade para mulheres do mundo corporativo, com mais de 30 horas de conteúdos relevantes e uma comunidade de mais de 3.000 mulheres”. 

Íntegra das postagens

Questão da caixa de pergunta: 

“Na sua visão, por que as empresas estão retornando para o modelo presencial de trabalho?”

Resposta de Catia Porto:  

“Vocês não desistem né?

Vamos lá… prepara o print aí Fátima porque eu vou trazer a realidade, que tem muitos sinais, faz parte do contexto, mas vocês insistem em ignorar! 

Esse artigo saiu há uns 5 ou 6 dias no Wall Street Journal…

(imagem do post do WSJ no Instagram)

“Os chefes estão de volta…”

E não sou eu que estou falando não! Isso aí já tá circulando há muito tempo!

A cultura woke está perdendo espaço.

Ao contrário do DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão), que foca na diversidade como elemento chave, tem um novo movimento chamado MEI (Mérito, Excelência e Inteligência), que enfatiza uma combinação de mérito e altos padrões de desempenho juntamente com habilidades  intelectuais.

E ao falar de mérito: falamos predominantemente de reconhecer e recompensar indivíduos com base em suas habilidades, desempenho e contribuições.

Logo, quando os canais mais influentes estão falando dessa mudança de DEI para MEI, o que você acha que as empresas/líderes irão focar? 

Performance é o nome do jogo agora! E o modelo presencial é frequentemente associado a uma maior performance em devido a aspectos específicos que favorecem a colaboração, o aprendizado e a produtividade. 

Ahhh Catia, mas qual sua opinião em relação a tudo isso. Pouco importa a minha opinião, é um movimento! E quem entende movimentos sabe que ou você se adapta rapidamente e surfa a onda de forma mais tranquila ou vai ficar na lanterninha… no grupo que reclama , resiste e não sai do lugar…”