Diversidade e inclusão: 10 tendências para 2023

Passada a fase de sensibilização para o tema, é preciso avançar nos mecanismos para realizar uma gestão efetiva da diversidade e da inclusão. Sairá na frente quem mantiver foco no que realmente importa

Diversidade e inclusão: 10 tendências para 2023
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A pauta de diversidade e inclusão demonstrou resiliência em 2022. Apesar do contexto econômico desafiador e de tumultos variados no campo da política, o assunto manteve-se presente na agenda das principais organizações do país. 

Passados quatro anos de retrocessos e enfrentamentos na esfera governamental, é importante reconhecer que o tema não esmoreceu no meio empresarial. 

Pelo contrário. A maior parte das grandes empresas seguiu com suas práticas e aprimorou a governança do assunto. Muitas assumiram compromissos públicos e passaram a dar mais visibilidade aos seus indicadores.

Quem apostou numa desaceleração perdeu, e isso se deve a fatores tão diversos, como o avanço da agenda ESG, a pressão de reguladores, o amadurecimento de uma geração altamente crítica e o escancaramento das desigualdades mesmo em nações fortemente associadas à péssima distribuição de renda e oportunidades, como o Brasil. 

Existe uma falta de frescor na agenda, é verdade. 

Para quem frequenta eventos sobre diversidade e inclusão, a sensação é de mesmice. Muito possivelmente porque temos feito avanços que, embora importantes, ainda são tímidos diante da extensão dos desafios.

Passada a fase de sensibilização para o tema (“pra que mexer com isso?”), é preciso avançar nos mecanismos para realizar uma gestão efetiva da diversidade e da inclusão (o “como fazer isso”). Sairá na frente quem mantiver foco no que realmente importa. 

Pensando nisso, apresento algumas apostas para o tema diversidade e inclusão em 2023. As tendências não partem de nenhuma bola de cristal, mas da observação criteriosa que o time da Mais Diversidade e eu temos feito do mercado no Brasil e no exterior. Vamos lá?

1. O retorno das políticas públicas 

“Depois de tanta mutreta, depois de tanta cascata, depois de tanta derrota, depois de tanta demência” – como canta Chico Buarque em “Que tal um samba?”, sua música mais recente –, é esperado o retorno das políticas governamentais em prol da inclusão. 

Exemplos são a recriação da Secadi, secretaria de diversidade do MEC, a volta de ministérios voltados à questão racial e das mulheres, o lançamento de uma pasta com foco na população indígena e a proposição de ações afirmativas para enfrentamento das desigualdades. 

Todo esse movimento deve ter consequências no meio empresarial, como, aliás, aconteceu no primeiro mandato de Lula.

2. Diferenças salariais 

Esta é pedra cantada há tempos. Segundo o IBGE, uma mulher branca recebe, em média, 23% a menos que um homem branco na mesma posição. Se ela for negra, o abismo chega a 40%. 

O governo eleito incorporou a proposta da ex-presidenciável Simone Tebet (MDB) e promete mandar ao Congresso projeto de lei sobre o assunto. É importante que as empresas se antecipem e façam suas análises. 

O cálculo não é simples e envolve a exclusão de diversas variáveis. No entanto, o que costuma travar o debate é o questionamento sobre o que fazer diante da constatação de que o pay gap existe. 

A ética, os valores – e talvez uma nova lei – mandam corrigir. Pode haver investimento financeiro considerável envolvido, porém. 

Certo é que será preciso se pautar em dados e não seguir com o “não temos este problema aqui dentro”, que ainda é mantra em grande parte das empresas, e tem servido de justificativa para sequer investigar o assunto.

3. Diversidade nos Conselhos de Administração

A partir de 2023, B3 passa a exigir mais diversidade de gênero e representação de pessoas de outros grupos minorizados (população LGBTI+, pessoas com deficiência e pessoas negras) nos conselhos de administração e diretorias estatutárias de todas as empresas de capital aberto listadas. 

As empresas terão até 2025 para comprovar a integração da primeira pessoa e até 2026 para a segunda. A regra funcionará no sistema “pratique ou explique”, exigindo transparência das organizações da adoção das ações. Caso não façam a inclusão no prazo previsto, terão que explicar ao mercado as razões que as impediram. 

A regra da B3 é inspirada em Bolsas de outros mercados como Londres e Nova Iorque.

4. Inclusão socioeconômica 

O Brasil é um dos países com a menor taxa de mobilidade social do mundo. De acordo com o último relatório divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, o país ocupa o 60º lugar entre 82 países. 

A mobilidade indica o quanto uma pessoa que nasce em determinadas condições socioeconômicas tem chances de melhorar essa posição ao longo da vida. 

No Brasil, para que uma família atinja uma renda mediana na sociedade leva nove gerações, enquanto em países desenvolvidos como a França seis e na Dinamarca, apenas duas gerações. 

Às empresas cabe entender o impacto que isso tem tanto na entrada, quanto na carreira profissional e planejar formas intencionais de desenvolvimento e apoio à educação de qualidade. 

A falta de mobilidade social não é um problema apenas para o indivíduo, mas também para a sociedade e a economia. 

Criar uma agenda ESG à brasileira, aumentando o protagonismo das questões sociais, ainda é um desafio que se impõe. 

5. Diversidade na cadeia de valor

No mundo todo, as empresas estão mais interessadas em manter parceiros de negócio que tenham compromissos com Diversidade e Inclusão. É cada vez mais relevante para a sustentabilidade dos negócios garantir o alinhamento entre os valores da empresa e a prática de seus fornecedores. 

Observamos uma tendência crescente para além da conscientização, passando pelo estabelecimento de metas de inclusão e desenvolvimento de pessoas de grupos minorizados em toda a cadeia de valor, incluindo a penalização ou descontinuidade de fornecedores não inclusivos. 

O momento, no entanto, deve ser mais de estímulo que de punição – até porque a maior parte das empresas contratantes também tem teto de vidro.

6. Inteligência geracional

A pauta geracional é a que nos une. Fala de absolutamente todos nós, cada um em seu momento de vida. 

O tema está em linha com a mudança no perfil demográfico do Brasil, que hoje é caracterizado como um país adulto e em transição para uma nação de idosos. A previsão do IBGE é de que, até 2050, 30% da população do país seja formada por pessoas 60+. 

Essa projeção, somada ao fato de pela primeira vez na história termos cinco gerações convivendo no mercado de trabalho, faz da questão geracional uma das pautas mais urgentes da atualidade. 

As empresas precisam navegar nessa nova realidade e se estruturar para transformar seus negócios. Isso significa mitigar o potencial de tensão intergeracional e, ao mesmo tempo, aproveitar o mix da inteligência que cada geração traz para aumentar a inovação, impulsionar a criatividade e fazer crescer a produtividade. 

Iniciativas do meio corporativo, como o Fórum Gerações e Futuro do Trabalho, têm colaborado para endereçar esta discussão.

7. Diversidade nas escolas 

Desde 2020, há uma crescente demanda de grupos de pais e mães de escolas privadas de todo o país por políticas antidiscriminação, sobretudo contra o racismo. 

Esse movimento tem levado algumas instituições particulares – onde a maioria absoluta dos alunos é branca – a reformular seus currículos, aumentar o número de professores negros, incluir autores e pesquisadores não brancos nas aulas de História, criar programas de bolsa para estudantes negros e indígenas, além de aumentar a disponibilidade de vagas para professores e gestores negros. 

Além das práticas antirracistas, a agenda de diversidade e inclusão, de forma geral, vem ganhando corpo em algumas escolas do Brasil, assustadas com o crescimento da intolerância e de manifestações neonazistas entre os jovens discentes. 

O desafio passa por capacitar as equipes pedagógicas e de gestão para lidar com as transformações exigidas pela comunidade de pais, cientes de seu poder de barganha no ambiente escolar privado. 

8. Aumento da representatividade de pessoas trans e travestis

A comunidade trans e travesti continua sendo uma das mais marginalizadas e alvo dos mais diversos tipos de violência no Brasil. 

Entretanto, os movimentos sociais organizados pedindo a inclusão de pessoas trans no mercado de trabalho, somados à eleição inédita de parlamentares trans no Congresso Nacional, podem influenciar o aumento de ações afirmativas e estimular o interesse por práticas inclusivas nas empresas. 

O tema LGBTI+ foi um dos que mais cresceu no meio corporativo nos últimos anos, mas os avanços ficaram restritos quase sempre a lésbicas e gays brancos e altamente escolarizados.

O debate não será fácil. O próprio Congresso Nacional deve ser palco de intensas guerras culturais em torno de questões que ainda dão um nó na cabeça de lideranças do mercado, como o direito à utilização de banheiro de acordo com o gênero com o qual se identifica. 

9. Saúde mental de pessoas de grupos minorizados

A exemplo do que aconteceu no ano passado, o tema da saúde mental deve continuar como uma forte tendência em 2023. 

Atravessamos de forma pouco reflexiva o espaço entre o isolamento da pandemia e o “liberou geral” que se seguiu. Poucas foram as lideranças que ofereceram espaços genuínos para escuta, trocas e elaboração de dores e traumas. 

Isso é particularmente importante para os grupos mais vulneráveis, que nem sempre podem contar com aconselhamento especializado – a psiquiatria registra o fenômeno como “estresse de minoria”.

10. Novos modelos de trabalho

Quem circula pelas grandes cidades já percebeu: os congestionamentos voltaram com força. 

Uma das razões é o grande número de empresas que retornou ao modelo presencial ou adotou um híbrido capenga (“na dúvida, é melhor estar presente no escritório). 

Modelos mais flexíveis são apontados como fator de retenção, sobretudo para jovens ou mães e pais de filhos pequenos. Quem não equilibrar melhor esta conta perderá talentos.

Por fim, mais um desejo do que uma tendência, embora dependa de nós transformá-lo em realidade: 2023 precisa ser o ano em que o Brasil compreenda que diversidade é a sua maior riqueza. 

Somos um dos países mais diversos do planeta, embora muito pouco inclusivo. O mundo caminha para um novo modelo econômico, pautado na ética, na inclusão e no respeito ao meio ambiente. 

O Brasil tem potencial para liderar este momento e alcançar destaque no cenário internacional, distribuindo melhor as oportunidades e sem deixar ninguém para trás. 

Depende de governos, empresas, movimentos sociais e também das escolhas que fizermos no dia a dia.