(Atualização: Em 30/06, a Suprema Corte anunciou a decisão e retirou poderes da EPA de regular emissões de empresas de energia)
Depois de derrubar a proteção legal ao aborto, uma nova decisão a ser anunciada pela Suprema Corte americana nas próximas semanas poderá limitar a autoridade do governo federal para reduzir as emissões de CO2 de usinas de energia e impor limites à ambição da gestão Biden de se reaproximar da agenda climática.
Ambientalistas temem que, dominada por uma maioria conservadora, a mais alta instância da justiça americana crie um precedente perigoso, na prática transferindo para a esfera política questões eminentemente técnicas.
O caso Virgínia Ocidental contra a Environmental Protection Agency (EPA) diz respeito à autoridade da agência de proteção ambiental do país para regular limites de emissão de CO2 nos Estados da federação.
Hoje, pela interpretação em vigor, a definição dessas metas cabe à EPA, um órgão que tem amplas atribuições na área ambiental e cujo chefe é indicado pelo Executivo.
No entanto, desde 2015, os secretários de justiça de Estados majoritariamente republicanos, ao lado de empresas de setores poluentes como a Westmoreland Mining Holdings, de mineração,e a North American Coal Corporation, de carvão, questionam a competência da EPA. Segundo eles, o assunto deveria ser alvo de legislação, ou seja, caberia ao Congresso.
O gatilho para a ação que chegou à Suprema Corte foi um plano criado ainda na gestão Obama, batizado de Clean Power Plan, e que nunca foi adiante. Ele estabelecia limites de emissões de gases de efeito-estufa para cada Estado americano e, sem apoio do Congresso, se baseava numa lei dos anos 70, a Clean Air Act (Lei do Ar Limpo), para dar autoridade à EPA para intervir em Estados que se recusassem a cumprir as metas.
A Lei do Ar Limpo, por sua vez, foi criada sob a gestão de Richard Nixon para limpar a água e o ar dos Estados Unidos, dando poder à EPA de regular fontes de poluição de forma genérica. Pela interpretação dos democratas, isso também daria aval à agência para regular a poluição por dióxido de carbono de usinas de carvão, forçando sua substituição por parques de energia renovável.
O Clean Power Plan gerou controvérsia e foi suspenso pela Suprema Corte em 2016. Na gestão Trump ele foi completamente abandonado.
No entanto, os republicanos argumentam que o caso vai muito além do plano proposto por Obama. Seria uma intromissão de uma agência federal sobre a competência dos Estados. Ademais, afirmam eles, a Lei do Ar Limpo, dos anos 70, não existe qualquer menção à regulação de emissões de gases de efeito-estufa.
Se o tribunal decidir contra a EPA, isso deve prejudicar os planos do governo Biden de combater as mudanças climáticas, já que a autoridade reguladora passaria para o Congresso.
Existe a expectativa de que Biden anuncie regras para as usinas de energia nos próximos meses, como parte da meta do presidente de que toda a rede elétrica dos EUA seja abastecida com energia limpa até 2035. A decisão da corte pode colocar essa regulação em xeque.
Caso a Suprema Corte dê razão aos procuradores republicanos, a EPA não será a única afetada; a decisão reduzirá o escopo de ação de todas as agências reguladoras federais dos EUA.
Arrastão judicial
Mesmo que sejam derrotados agora, republicanos e seus aliados das indústrias poluentes têm uma série de outras ações em curso nas instâncias inferiores que podem vir a ser apreciadas pela Suprema Corte.
O objetivo final de todos os processos é o mesmo: limitar o poder de atuação de órgãos que baseiam suas decisões em critérios técnicos e passar o poder para o Legislativo.
Além de não ter um corpo preparado para lidar com as minúcias técnicas, o Congresso americano pode voltar a ficar sob controle do Partido Republicano. Alguns de seus integrantes mais à direita negam a existência da mudança climática e são contrários a qualquer medida que imponha restrições à indústria dos combustíveis fósseis.
Carros e caminhões respondem pela maior parte das emissões de gases de efeito-estufa dos Estados Unidos. Caso alguma dessas ações seja bem-sucedida, o governo federal ficaria impedido de regular a fumaça que sai dos escapamentos, por exemplo.
Isso significaria, no limite, que o governo americano não teria condições de fazer cumprir as metas de descarbonização que ele próprio estabeleceu perante a comunidade internacional no âmbito do Acordo de Paris.