
O pote vazio de xampu, a caixinha de sabonete, o tubo de pasta de dente. Para onde vão esses resíduos presentes em praticamente todas as residências brasileiras, pós consumo? Qual caminho seguem para não acabar em aterros sanitários e lixões, sem reaproveitamento?
Por meio do Mãos pro Futuro, um dos programas de logística reversa pioneiros no país, na última década mais de um milhão de toneladas destas embalagens foram recuperadas e corretamente destinadas à reciclagem. Foi o primeiro sistema do gênero a atingir essa marca.
Além do impacto ambiental por ampliar e melhorar a coleta e a triagem destes resíduos, permitindo sua reutilização, o Mãos pro Futuro desenvolve ações que promovem a melhoria de renda e das condições de trabalho dos catadores.
Hoje são cerca de 200 organizações de catadores parceiras e quase 6 mil profissionais da reciclagem diretamente beneficiados com os investimentos do programa – 56% deles, mulheres.
Presente em 156 municípios do país, distribuídos por todos os estados, o programa foi criado pela ABIHPEC (Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos) em 2006, quatro anos antes de ser estabelecida a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
“Ele nasceu como forma de oferecer uma solução de destinação ambiental adequada para as empresas do setor”, explica Fábio Brasiliano, diretor de desenvolvimento sustentável da ABIHPEC.
Com o tempo e os bons resultados obtidos, ele foi se expandindo e hoje já são quatro setores da economia parceiros no programa.
Além da ABIHPEC, fazem parte a Abimapi (Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães & Bolos Industrializados) e a ABIPLA (Associação Brasileira de Produtos de Limpeza e Afins). Mais recentemente houve a entrada da Abrafati (Associação Brasileira de Fabricantes de Tintas). “Estamos abertos a qualquer empresa ou setor que queira participar”, diz Brasiliano.
Juntas, as quatro associações representam cerca de 200 empresas aderentes, entre elas grandes companhias como Natura, Grupo Boticário, P&G, Unilever, Bombril, Bauducco, M. Dias Branco, Mondelez, Wickbold, Akzo Nobel e Sherwin-Williams.
As embalagens pós consumo no escopo do Mãos Pro Futuro são resíduos sólidos não classificados como perigosos pela legislação brasileira. Elas podem ser compostas de papel e papelão, plástico, alumínio, aço, vidro ou do tipo cartonada longa vida.
Após o lançamento da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), em abril de 2022 foi instituído o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), que especificou diretrizes, estratégias, ações e metas para melhorar a gestão de resíduos sólidos no país. Ele prevê que, até 2040, serão recuperadas 50% das embalagens em geral por sistemas de logística reversa.
Em 2023, 159.473 toneladas foram recuperadas pelo Mãos pro Futuro, um volume que atualmente representa 30,5% de toda a quantidade colocada no mercado no ano anterior pelas empresas aderentes.
Por suas quase duas décadas de atividade e sua solidez, o programa tem exercido um importante papel nos diálogos com o poder público na construção das políticas e práticas de logística reversa.
“O Mãos pro Futuro lidera interlocuções empresariais com órgãos competentes como secretarias de meio ambiente e ministérios públicos em todo o Brasil, e impulsionou a adoção de medidas de conformidade ambiental e rastreabilidade dos materiais recicláveis por meio da adoção de metodologias contemporâneas, seguras e federalizadas para assegurar a cobertura nacional da logística reversa”, diz Fabrício Soler, advogado especializado em gerenciamento de resíduos e sócio fundador da S2F Partners.
Em janeiro passado, uma portaria habilitou a ABIHPEC como entidade gestora de sistemas de logística reversa de embalagens em geral.
Sem fins lucrativos
Em 2023, cerca de R$ 22 milhões foram investidos pelo Mãos pro Futuro diretamente nas organizações de catadores parceiras em todo o Brasil (o Programa não tem fins lucrativos). “Entendemos que todo recurso investido, além de manter a operação, deve ser destinado aos catadores”, diz Brasiliano. Atualmente, cerca de 80% dos recursos totais captados pelo projeto são investidos nas organizações parceiras.
Além do foco principal na capacitação e melhoria nas condições de trabalho, o Mãos pro Futuro também investe em ações de educação ambiental. O programa ajuda as cooperativas a divulgar em mídias sociais, vídeos institucionais, palestras e inserções em programação de rádio como atuam. A conscientização de toda a sociedade fortalece a categoria e ajuda a alavancar ainda mais os índices de reciclagem.
Outra ação importante foi a criação, em 2023, do Selo Mãos pro Futuro. Ele pode ser estampado pelas empresas aderentes nas embalagens de seus produtos, para divulgar o programa e informar ao consumidor o cumprimento da responsabilidade de recuperação e destinação final adequada daquele resíduo, após o consumo.
Todos esses resultados representam inúmeros impactos ambientais, sociais e econômicos. Hoje o programa atende 14 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, o que já lhe rendeu dois importantes reconhecimentos da entidade global. Em 2019 e em 2021, ele foi selecionado pela ONU – CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) como case de Big Push de Sustentabilidade no Brasil.