O destino climático do país, selado nas urnas

Se mantiver o rumo atual, o Brasil chegará em 2030 como um vilão climático; se tomar outro caminho, poderá assumir a dianteira da corrida climática. O destino depende do resultado das urnas

foto em close de uma urna eletrônica com pessoa clicando no botao de 'confirma'
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O Brasil está em uma encruzilhada: se mantiver o rumo atual, chegará em 2030 como um vilão climático. Se tomar outro caminho, poderá assumir a dianteira global da corrida climática.

A decisão sobre o destino será influenciada principalmente pelas urnas neste mês.

Hoje, há duas grandes variáveis no nosso painel de bordo: energia e florestas.

Sobre energia, há dois fenômenos jogando contra o Brasil completar sua transição energética para carbono zero. Um é a aprovação, dada neste ciclo de governo, de regras que obrigam a contratação de 8 GW de termelétricas a gás natural. O efeito de carbonização é claro: essa medida nos move de mais renováveis para mais fósseis, gerando efeito lock-in de longo prazo.

Seu efeito antieconômico foi bem resumido por José Roberto Mendonça de Barros que, em artigo publicado no Estadão, disse que se trata de contratar termelétricas a gás natural “em regiões que não têm gás, gasodutos, mercados e que são exportadores de energia”. Estima-se que essa conta fique alta para os consumidores, que terão que pagar por essa energia mais cara e mais suja, caso contratada. 

Alguém pode pensar que, bom, quem sabe seja possível compensar essas emissões todas com mais renováveis no sistema. A questão é a demanda por tanta energia, especialmente em se considerando o deslocamento em definitivo que essas térmicas vão provocar.

Outro fator que não ajuda a transição energética é a que nosso sistema elétrico não está sendo adaptado ao novo clima. Ao que consta, não houve investimento em medidas de proteção e aumento da resiliência do nosso sistema interligado nacional nesses últimos anos. 

Parece coisa de avestruz: se todos sabemos da alta dependência de energia hidroelétrica e sua vulnerabilidade ao instável regime de chuvas, por que não recalibrar? O conceito de usar reservatórios como pilha do sistema, felizmente, entrou em diversas campanhas presidenciais neste ano. Exceto na da campanha que busca reeleição. Não quer dizer que não possa vir a considerar, em função das novas circunstâncias. Mas garantia, não há. 

A crise hídrica do ano passado foi em boa parte acentuada pela decisão do governo de tentar segurar a inflação, segurando a tarifa. Para isso, geraram muita energia das hidrelétricas, depletando os reservatórios mais do que normalmente se faz.

Assim, mantido esse rumo da carbonização e da não adaptação, o share de renováveis na nossa geração elétrica cairá para 69% em 2030, contra 83% atuais, segundo estudo do Centro Clima da COPPE-UFRJ. 

Imagine o Brasil tendo que explicar que perdeu a liderança nesse quesito e que suas emissões associadas à geração elétrica terão quase dobrado em relação a 2005? Não é nada bom. 

Seria uma perda importante para nossa diplomacia: perderia nosso grande trunfo de baixas emissões relativas na seara energética e industrial, com possíveis efeitos comerciais.

Quanto ao desmatamento na Amazônia, é notório que voltou a crescer: 73% de aumento a partir de 2019, contra 27% nos cinco anos anteriores, de acordo com dados do sistema Prodes/Inpe.

A Coppe-UFRJ calcula que a taxa pode chegar a 19.680 km2 ao final do próximo ciclo político (2026), se mantidos os estímulos às invasões de terras públicas e a paralisação das ações de combate aos crimes ambientais presentes no atual governo. Hoje, é de cerca de 13 mil km2. A tendência até 2030 seria de ultrapassar 25.600 ha de perda florestal por ano, voltando ao patamar do início dos anos 2000. 

Sem dúvida, o problema maior é que a perda acumulada da floresta será próxima de 23% nesta década, beirando o ponto de não retorno da Amazônia (estimado por Carlos Nobre e Thomas Lovejoy como algo em torno de 25%). 

Confirmado esse cenário, nenhuma desculpa ou tentativa de criar uma narrativa positiva sobre o Brasil deve vingar. Não vai adiantar fazer Climate Summit em Nova York. Nem mesmo lotear a Amazônia com projetos de geração de créditos de carbono. A insegurança do sistema climático terá sido posta em jogo. 

Alarmismo? Não. O nível de ameaça de autoinfligir perdas e danos climáticos é cientificamente indicado como altíssimo se a trajetória atual de políticas pró-desmatamento for consolidada. Emergência climática, para valer. Vilania, em termos materiais. Tudo que não queremos.

Se — e somente — se o Brasil tomar decisões que mexam no ponteiro de suas emissões nestes próximos quatro anos, nós teremos condições de alterar este destino. O país pode crescer e descarbonizar ao mesmo tempo, mas desde que realize a transição o mais rápido possível. 

As eleições para presidente do Brasil são as chaves. Dá-las a quem não tem compromisso com um novo curso é ajudar a selar o destino climático e democrático deste país. 

Esta coluna não contém sugestão de voto para presidente e sim de reflexão sobre nosso futuro. Sigam-me para dicas sobre clima e eleições.