Para que o tão almejado protagonismo brasileiro rumo à transição climática global vire realidade, é preciso negociar menos e agir mais. Esta é a proposta e o desafio da presidência da COP30 para a próxima edição da conferência do clima, que acontece em novembro em Belém (PA).
Um dos caminhos é focar em soluções que já vêm fazendo a diferença e o primeiro passo é mapeá-las. Este foi o trabalho realizado pelo Instituto Arapyaú e Instituto Itaúsa no relatório “Soluções em Clima e Natureza do Brasil”, lançado hoje (17).
Ele lista cerca de quarenta soluções escaláveis que já vêm sendo praticadas no Brasil – ou que têm real potencial para isso –, rumo à economia regenerativa, inclusiva e de baixo carbono. Elas foram compiladas após três meses de entrevistas com quase 70 especialistas em clima, além de consultas a pesquisas e estudos já publicados.
“Muita coisa importante acontece no país, mas as ações acabam dispersas”, diz Roberto Waack, presidente do conselho do Instituto Arapyaú e membro do conselho de administração da Marfrig. “A agropecuária brasileira, por exemplo, tem respostas únicas no mundo, com escala e grau de maturidade imensos. E elas podem e devem ser bons exemplos para outras que ainda estão nascendo.”
Uma delas é o uso de bioinsumos. O tamanho deste mercado, segundo o relatório, é de R$ 5 bilhões em vendas por ano, com uma média de crescimento quatro vezes maior que a mundial.
No documento, as soluções foram classificadas em três categorias: maduras (que já têm resultados positivos), em ascensão e promissoras (desafiadoras, mas com alto potencial de crescimento). “As implementadas apresentam indicadores reais de investimentos e benefícios concretos”, diz Marcelo Furtado, diretor executivo do Instituto Itaúsa. “Reuni-las neste relatório cria uma oportunidade única de direcionar esforços e orientar prioridades.”
Soluções
O levantamento aponta ações para quatro pilares – atacando os maiores emissores de gases de efeito estufa no Brasil: agricultura e pecuária; florestas, energia e bioeconomia (para indústria e gestão de resíduos). Além de oferecer um olhar mais de oportunidades que de desafios sobre a crise climática, o documento pretende mostrar ao resto do mundo que o protagonismo brasileiro já está em curso.
“A nossa agroecologia tem práticas que estão, definitivamente, entre as mais corretas, adequadas e interessantes do planeta”, diz Waack. “O Brasil é líder mundial na área de florestas produtivas, capaz hoje de produzir celulose com a menor pegada de carbono imaginável, boas práticas e tudo certificado. Isso precisa ser compartilhado.”
Entre as soluções maduras do segmento de florestas estão o Programa Arpa, maior iniciativa de conservação de florestas tropicais do mundo, com 62,5 milhões de hectares protegidos e já replicada para Colômbia e Equador; e a silvicultura de espécies exóticas como o eucalipto para fins industriais. Empresas brasileiras de papel e celulose, segundo o relatório, são referência mundial.
O documento aponta também que o Brasil é reconhecido globalmente pelo monitoramento de florestas por satélite, com dados essenciais para a construção de políticas públicas e planos de controle do desmatamento na Amazônia Legal. Uma das mais importantes é o Código Florestal, aprovado em 2012, com reflexos na solução climática global em grande escala.
“O país tem hoje mais de 200 milhões de hectares em conservação, por conta do código – uma área que equivale à metade de toda a Europa”, diz Waack.
Para Furtado, o relatório pode ajudar governos, iniciativa privada e sociedade a enxergar a valoração da natureza como ativo econômico importante. E mostra que, enquanto diversos países ainda discutem maneiras de mitigar emissões em busca de neutralidade, o Brasil conta com a natureza como maior aliada em soluções de carbono.
Capital
Ao indicar iniciativas de sucesso e potenciais, o documento pretende atrair mais capital privado para soluções das três categorias – das promissoras às maduras – , no financiamento da transformação climática. “Temos o desafio de subir de US$ 300 bilhões para US$ 1,3 trilhão de investimentos para isso”, diz Furtado.
“E não adianta querer fazer milagre em Belém, tentando destravar mais dinheiro público, porque ele simplesmente não existe”, diz o diretor executivo.
A diversidade de soluções listadas reforça a enorme potência da bioeconomia brasileira. “Nossa bioeconomia começa no açaí e no cacau, na escala de milhões de dólares, e passa por biocombustível e se amplia no mercado de trilhões da biotecnologia. Temos uma oportunidade incrível”, relata Furtado, que acredita que “a economia da natureza será o passaporte premiado para o Brasil protagonizar a transição climática”.
Uma edição em inglês do relatório será lançada no dia 26 de junho, durante a Climate Week de Londres.