Conta da UE exagerou – e muito ­– os investimentos climáticos, diz auditoria

Órgão de controle diz que o bloco atingiu apenas pouco mais da metade da meta de dedicar 20% de seu orçamento ao combate da mudança do clima

Bandeiras da União Europeia
A A
A A

Em Frankfurt, policiais alemães fizeram na manhã de terça-feira (31) uma batida na sede do Deutsche Bank como parte de uma investigação de greenwashing. Ao mesmo tempo, em Bruxelas, um órgão fiscalizador da União Europeia (UE) apresentava um relatório demonstrando que o bloco exagerou – e muito – os investimentos feitos para conter a ameaça da mudança do clima.

A Comissão Europeia, o órgão executivo da UE, havia anunciado no ano passado o cumprimento da meta de investir pelo menos 20% de seu orçamento de 2014 a 2020 em ações ligadas ao clima.

Segundo as divulgações oficiais, o total investido teria sido de 216 bilhões de euros. Mas, segundo as contas da Corte Europeia de Auditores divulgadas ontem, na realidade, a cifra ficou mais próxima de 144 bilhões de euros, ou 13% do orçamento.

“Descobrimos que os investimentos relatados nem sempre foram relevantes em termos de ação climática”, diz a avaliação dos auditores.

A UE superestimou a contribuição de certas medidas, como programas de incentivo à agricultura, e teria partido de premissas agressivas demais em relação a projetos ferroviários e geração de eletricidade usando biomassa.

O termo greenwashing não é mencionado nenhuma vez nas mais de 50 páginas do relatório, mas é impossível não reconhecer algumas das características que definem essa prática – e que vem sido combatida em várias frentes pelos reguladores do bloco.

“Consideramos que no geral as informações sobre investimentos climáticos foram pouco confiáveis”, afirma o texto. “Elas incluíram aproximações significativas e acompanharam apenas o impacto positivo potencial, sem avaliar a contribuição final para os objetivos da UE.”

Mais importante que as dúvidas lançadas sobre o passado, porém, é o alerta feito pela auditoria: sem alterações na metodologia usada pela UE para classificar o que de fato é eficaz na luta contra a mudança do clima, os mesmo problemas podem se repetir no atual sexênio (2021-2027).

Investimentos verdes são parte central da política de recuperação econômica da União Europeia, e a meta é que eles representem 30% do orçamento de 2 trilhões de euros no período corrente.

No campo

Uma das recomendações-chave da Corte de Auditores é a obtenção de “evidências científicas que sustentem a contribuição das políticas agrícolas”.

No período entre 2014 e 2020, investimentos no campo representaram a maior fatia dos recursos supostamente destinados a políticas climáticas.

Mas esse dinheiro – cerca de 60 bilhões de euros – não se traduziu em reduções das emissões de gases de efeito-estufa, concluíram os auditores.

Transferências de recursos são importantes para ajudar os agricultores a se adaptar às mudanças climáticas, diz o relatório, mas a dependência do estado pode manter em operação fazendas economicamente inviáveis, “atrasando as mudanças estruturais necessárias”.

Algumas políticas, como o apoio a técnicas de agricultura regenerativa, que permitem maior captura de carbono solo, são consideradas eficazes. Já outros, como diversificação de culturas, têm efeito “limitado ou nenhum” no clima, afirmaram os auditores.

Outro ponto levantado pela análise: incentivar práticas como agricultura orgânica pode ter consequências danosas para o clima, como diminuição da produtividade e aumento da dependência de importações de países com regras ambientais menos estritas.

A contabilidade da União Europeia também inclui como “ações climáticas” investimentos em serviços básicos, como recuperação de pequenas cidades e pavimentação de estradas – obras de infraestrutura são responsáveis por importantes emissões de CO2.

A Comissão Europeia rebateu a conclusão dos auditores e reafirmou que as informações divulgadas estavam corretas. “Ao contrário das afirmações da Corte, a metodologia da Comissão é sólida e confiável”.

Imagem Christian Lue, via Unsplash