
As emissões brutas de gases de efeito estufa do Brasil caíram 16,7% em 2024, atingindo 2,145 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente (GtCO2e). Em 2023, foram 2,576 GtCO2e. Os dados, do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), da rede de ONGs Observatório do Clima, foram lançados nesta segunda-feira (3).
É a maior queda nos índices de poluição climática do país desde 2009. Ainda assim, o país não deve atingir a meta que estipulou para 2025 em sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês). Segundo projeção da entidade, o Brasil deve fechar este ano emitindo 1,44 GtCO2e – a NDC brasileira estabelece um teto de 1,32 gigatonelada.
Assim como no ano anterior, a redução no desmatamento foi a responsável pela queda nas emissões. Desde 2023, as ações de comando e controle nos biomas Amazônia e Cerrado foram ampliadas, após um período de alta no desmatamento que começou em 2019, causados pelo que o Observatório do Clima classifica como “descontrole deliberado do governo federal” durante a presidência de Jair Bolsonaro.

Na quinta-feira passada (30), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais divulgou uma estimativa de redução de 11,08% do desmatamento na Amazônia. É o menor índice dos últimos 11 anos. No Cerrado, a redução chegou a 11,49% no mesmo período.
“São números para comemorar, mas mostram que só o combate ao desmatamento não atinge metas climáticas. Temos que tomar cuidado para que números bons não pareçam uma autorização para que setores como o petróleo e o agro expandam a bagunça climática no Brasil”, afirma Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório.
A mudança do uso da terra, ou a abertura de novas áreas para fins produtivos, responde agora por 42% do total de emissões no Brasil. Essa fatia representa dez pontos percentuais a menos do que o calculado no ano passado. Com a redução proporcional do desmatamento, as emissões da atividade agropecuária passaram de 24% para 29% do total, enquanto as do setor de energia saltaram de 16% para 20%.

COP30
Astrini avalia que os números podem dar fôlego à imagem do Brasil na COP30, que inicia em Belém esta semana, especialmente por conta da repercussão negativa dos avanços na exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
“É um resgate de moral, até porque nenhum país do G20 e ou dos dez maiores emissores do mundo chegam perto desses números [de redução]. Isso fortalece o país e traz ânimo à presidência brasileira da COP”.
O problema da pecuária
A pecuária, que emite indiretamente pelo desmatamento e pelo uso de energia, e diretamente pela geração de metano que ocorre naturalmente na digestão dos bovinos, é de longe a atividade econômica mais poluidora do Brasil, com 51% das emissões totais, equivalentes a 1,1 GtCO2e.
Se fosse um país, o rebanho brasileiro seria o sétimo maior emissor do mundo, ligeiramente à frente do Japão (1,068 GtCO2e). Em seguida vêm a agricultura (397 MtCO2e, ou 19% do total), o transporte de carga (6%) e o transporte de passageiros (5%). Como nas edições anteriores do SEEG, a agropecuária, incluindo o desmatamento, responde por dois terços das emissões do Brasil.
“É um crescimento sistemático ao longo de toda a série histórica, ou seja, o Brasil não conseguiu desvincular o crescimento da economia com o crescimento das emissões”, avalia Davi Tsai, coordenador de projetos do Instituto de Energia e Ambiente (Iema), que coordenou o levantamento do SEEG.
Ele afirma que isso representa um desafio grande para o Brasil, já que a agropecuária tem um peso grande para a economia. Segundo projeções da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a fatia do agronegócio no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil deverá aumentar para 29,4%, a maior participação em 22 anos.
“Há boas iniciativas públicas e privadas para uma produção agropecuária ambientalmente sustentável. O desafio é dar escala para elas e ter estratégias para ter alta produtividade com redução de emissões e aumento de sequestro de carbono no solo”, afirma Priscila Alves, analista-sênior de clima do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola, o Imaflora.
As remoções de CO2 por solos agrícolas aumentaram de 271 milhões para 281 milhões de toneladas em 2024. Por questões metodológicas, porém, o Brasil não as monitora nem contabiliza oficialmente. O SEEG faz esse cálculo há uma década e qualifica os números como “não contabilizados no inventário nacional”, como é chamada a contabilização de emissões do país.
Boas notícias
Os transportes são os maiores emissores na categoria energia, mas a supersafra de cana de açúcar trouxe boas notícias: a produção de álcool atingiu recorde histórico no ano passado, com 36 bilhões de litros, tornando o preço do etanol mais competitivo. Isso resultou em uma queda de 3% nas emissões dos transportes de passageiros, mesmo com um aumento nos quilômetro percorridos.
“Além disso, o Brasil vive uma explosão na produção de etanol de milho, que já representa 20% do total. Embora não tenha a mesma produtividade do álcool de cana em termos de litros produzidos por hectares plantados, o milho aproveita as terras de produção de soja, ao ser cultivado na entressafra”, afirma Felipe Barcellos e Silva, pesquisador do Instituto de Energia e Ambiente.
A emissão total do setor de energia variou de 420 MtCO2e em 2023 para 424 MtCO2e em 2024, que Silva classificou como “estabilidade”.
São números que fazem Tsai afirmar que nem tudo está perdido para a NDC de 2030, quando o Brasil se comprometeu a emitir não mais que 1,2 bilhão de toneladas de CO2. Mas todos os setores terão de cortar emissões.
“O desmatamento cai, mas todos os outros setores sobem. Toda a mitigação fica nas costas do combate ao desmatamento, e isso precisa mudar”.