ANÁLISE: A ameaça climática chamada Trump

O ex-presidente tem chances reais de voltar à Casa Branca na eleição de novembro. O planeta vai pagar o preço?

Silhueta do presidente Donald Trump diante de bandeira dos Estados Unidos
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Donald Trump deve voltar ao páreo nas eleições presidenciais dos Estados Unidos deste ano.

Um eventual retorno do ex-presidente republicano, que tem chances reais de vitória contra o democrata Joe Biden em novembro, provocaria mudanças radicais nos planos climáticos dos Estados Unidos – e do mundo.

O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, sintetizou o alerta da seguinte forma: “Uma presidência de Trump que recue na luta contra as mudanças climáticas desaceleraria o progresso mundial de uma forma que me preocupa”, disse ele em entrevista no final do ano passado.

Durante sua presidência, Trump sempre menosprezou as mudanças climáticas e seus efeitos no planeta. Menos de seis meses depois de tomar posse, ele anunciou a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris.

Desde então, parece ter dobrado a aposta.

Se o país abandonar mais uma vez os esforços globais de reduções de emissões de gases de efeito estufa, é virtualmente certo que a temperatura global vai subir mais de 1,5°C em comparação com a era pré-industrial – limite que permitiria evitar as piores consequências da mudança do clima, segundo a ciência.

Mesmo na improvável hipótese de que Trump mantenha o país dialogando internacionalmente, o que importa são as políticas que ele adotaria se reeleito: depois da China, os Estados Unidos são o segundo maior responsável pelo CO2 lançado na atmosfera.

E o virtual candidato republicano já deu indicações claras de que pretende voltar atrás em todas as principais iniciativas climáticas adotadas pelo atual governo.

Isso significa acabar com os incentivos bilionários à transição energética que compõem a Lei de Redução de Inflação (IRA, na sigla em inglês) e potencialmente colocar em risco investimentos na eletrificação da indústria automobilística americana.

Iniciativas regulatórias como as exigências de reportes climáticos por parte das empresas de capital aberto, como as que estão em fase de definição pela Securities and Exchange Commission, também poderiam ser revertidas.

“Um segundo mandato de Trump é game over para o clima – mesmo!”, disse o diretor do Centro de Sustentabilidade e Mídia da Universidade da Pensilvânia, Michael Mann.

Mann deu a declaração em 2020, quando o empresário nova-iorquino foi derrotado por Joe Biden. Quatro anos depois, a ameaça se renova. 

Ira contra o IRA

As declarações de Trump sobre a mudança do clima são dúbias. Quando quer agradar seus eleitores ultraconservadores, ele fala em “farsa” e “mito”. 

Trocar petróleo por usinas eólicas seria um erro, segundo o ex-presidente, pois essa fonte renovável é “fraca e cara”, porque as turbinas “enferrujam, apodrecem, matam pássaros”.

Por outro lado, ele já reconheceu em entrevistas que “há alguma conexão” entre a atividade humana e o aquecimento global.

Sua opinião sobre a necessidade de financiar a transição energética, porém, é muito clara: o pacote de US$ 369 bilhões de Joe Biden, na opinião de Trump, foi “o maior aumento de impostos da história”.

Este é um dos grande temores dos observadores e da comunidade internacional: que num segundo mandato Trump decida mudar o curso da política energética e climática americana.

Em vez de incentivar as energias limpas e a transição para um futuro de baixo carbono, o país poderia apostar em “maximizar a produção de combustíveis fósseis”, como disseram assessores do republicano ao Financial Times.

Além de derrubar a proibição da exploração em novas áreas, Trump também parece decidido a levar adiante sua cruzada contra os carros elétricos, que “custam muito caro” e “não vão longe o suficiente”.  

O IRA inclui subsídios para a compra de modelos elétricos pela população e incentivos fiscais generosos para desenvolver uma indústria doméstica de baterias. Hoje, a produção desse componente crítico é controlada pela China.

Uma das metas de Biden é que metade dos novos veículos de passeio vendidos no país até o fim da década sejam movidos a bateria.

Bidenomics

O IRA já atraiu dezenas de bilhões de dólares em investimentos de companhias americanas e estrangeiras, tanto para fabricar baterias quanto para erguer novas linhas de montagem.

Mas essa política industrial verde, apelidada de Bidenomics, parece não se traduzir em intenções de votos para o atual presidente.

Uma pesquisa realizada no fim do ano passado apontou vantagens significativas para Trump em cinco dos seis Estados decisivos no colégio eleitoral americano.

Quando foi aprovado, em agosto de 2022, o pacote de Biden quando não recebeu um único voto de apoio da oposição no Congresso.

Agora, com a Câmara sob controle da ala republicana mais radical e mais leal a Trump e a chance de que o partido também controle o Senado depois da votação de novembro, as condições para um desmonte completo do IRA estariam ao alcance da oposição.

Mas uma guinada de 180 graus custaria muito capital político.

A maior parte dos recursos alavancados pelo pacote de Biden tem como destino áreas dominadas justamente pelos eleitores de Trump.

Uma coisa é jogar para a torcida na campanha; outra bem diferente é inviabilizar investimentos que vão gerar empregos e levar de volta ao país indústrias que há muito tinham trocado os Estados Unidos pela China.

Além disso, muitos dos benefícios fiscais já foram concedidos – o IRA prevê desembolsos até 2032 – e esse dinheiro não volta mais para os cofres.

Mas uma das características mais marcantes de Trump é a imprevisibilidade. O resultado da eleição de 5 de novembro

As mudanças não parariam por aí. Regras de eficiência energética de termelétricas, edifícios e eletrodomésticos estabelecidas também podem ser alteradas.