Padrão para créditos de carbono é divulgado – mas desmatamento evitado tem que esperar

Categoria REDD+, a mais comum no Brasil, passará por uma análise extra antes de poder receber selo de qualidade

Padrão para créditos de carbono é divulgado – mas desmatamento evitado tem que esperar
A A
A A

A iniciativa global que tenta criar padrões unificados de qualidade e integridade para a oferta de créditos de carbono no mercado voluntário anunciou hoje os critérios que serão usados para conferir seu carimbo de aprovação.

Mas a categoria de desmatamento evitado, de longe a mais comum no Brasil, ainda vai passar por uma análise adicional para a definição dos parâmetros de avaliação.

Os chamados créditos REDD+, na nomenclatura oficial, “estão sujeitos a um intenso escrutínio”, segundo comunicado do Integrity Council for Voluntary Carbon Markets (ICVCM).

Denúncias recentes de projetos que exageram ou mentem sobre seus benefícios climáticos causaram uma crise de confiança. Muitos compradores se retraíram com receio de acusações de greenwashing.

Os créditos REDD+ representam o maior volume do mercado voluntário.

O grupo de trabalho deve se reunir a partir de agosto ou setembro para a definição dos parâmetros, diz ao Reset Pedro Barata, co-presidente do painel de especialistas do ICVCM. Não há prazo definido para a conclusão.

A entidade também aguarda a divulgação de uma revisão das metodologias REDD+ da Verra, entidade que certifica a maior parte desse tipo de crédito.  O anúncio estava previsto para o início deste ano, mas foi adiado e agora a expectativa é para o terceiro trimestre.

A demora no caso do desmatamento evitado não chega a surpreender, diz Annie Groth, responsável pela área de advocacy e policy da Biofílica Ambipar, uma das maiores desenvolvedoras de créditos do país. “Eles querem avaliar o que vem de novo por parte da Verra.”

Mesmo sem conhecer os detalhes relativos ao REDD+, Groth espera um impacto positivo da iniciativa. “É importante separar o joio do trigo quando falamos dos projetos, porque sabemos que o mercado é muito heterogêneo.” 

As recomendações dos especialistas técnicos serão então submetidas à aprovação do conselho do ICVCM, que inclui representantes de todas as partes interessadas, de desenvolvedores de projetos a representantes de comunidades indígenas.

“Não posso prever o resultado da avaliação, mas as regras mais amplas já divulgadas certamente significam que nem todos os créditos em circulação hoje atenderão aos requisitos”, afirma Barata.

Além de validar os diferentes tipos de créditos existentes, o ICVCM também vai chancelar as entidades certificadoras, como a americana Verra, responsável por emitir cerca de dois terços dos créditos em circulação.

As certificadoras podem submeter seus pedidos de avaliação a partir de hoje.

A intenção é “criar uma linha de base de qualidade para destravar o financiamento com a velocidade e a escala necessárias para reduzir e remover bilhões de toneladas de emissões, algo que não seria viável de outra maneira”, afirmou em comunicado Annette Nazareth, presidente do ICVCM.

Depois de um crescimento expressivo em 2021, o mercado voluntário de carbono andou de lado no ano passado. Estima-se que as negociações tenham movimentado US$ 2 bilhões.

O plano é conceder os primeiros selos de qualidade CCP (Core Carbon Principles) tanto para as certificadoras quanto para as primeiras categorias ainda este ano, na tentativa de estabelecer algum controle sobre um mercado não-regulado e ainda pouco transparente.

O que foi anunciado  

Em março, o ICVCM tinha publicado os dez princípios gerais que orientam essa avaliação e que agora foram traduzidos em itens práticos.

Eles incluem exigências como garantias de permanência do sequestro do carbono. Projetos de desmatamento evitados ou reflorestamento são particularmente suscetíveis ao que se chama reversão. Em caso de incêndio, por exemplo, o CO2 pode ser liberado na atmosfera.

As diretrizes especificam que os projetos têm monitorar e garantir a permanência do estoque de carbono por no mínimo 40 anos e estabelecem mecanismos de compensação caso haja reversão.

A elaboração dos princípios também envolveu representantes de comunidades indígenas. Denúncias de violações de direitos são outro problema comumente associado aos créditos ligados à natureza.

O plano divulgado hoje também contempla a intersecção dessas iniciativas voluntárias com as metas de descarbonização nacionais, as chamadas NDC.

Uma das medidas do sucesso do selo será a valorização dos créditos com o carimbo CCP, afirma Barata. “Se isso não acontecer, fizemos algo errado.”

Em paralelo ao ICVCM, que atua do lado da oferta, a iniciativa VCMI define o que os compradores podem dizer com base nos créditos que adquiriram.O VCMI apresentou a primeira parte do seu código de conduta há duas semanas.