A Orizon estreou na bolsa no começo do ano passado com a tese de consolidar o mercado de aterros sanitários no Brasil e extrair valor de uma matéria-prima até então pouco valorizada: o lixo.
Um ano e meio depois, passou de cinco para 12 aterros, que recebem todos os anos cerca de 8 milhões de toneladas de resíduos.
A companhia segue com o plano de expansão, mas se prepara para uma nova fase, indo além da receita auferida com prefeituras e empresas privadas pela destinação correta dos resíduos – e partindo para a transformação do lixo em produtos de maior valor agregado, com escala.
O plano é transformar toda sua base recém-adquirida em “ecoparques” capazes de fabricar produtos tão variados quanto energia a partir de biogás, resinas de plástico reciclado para atender a indústria de bens de consumo e fertilizantes produzidos a partir de matéria orgânica. Créditos de carbono também devem trazer receita adicional.
“Olhando para a frente, a Orizon não será mais uma empresa de resíduos, será uma grande plataforma de produtos renováveis”, afirma o CEO Milton Pilão.
A empresa está segregando cada uma dessas divisões em unidades de negócios diferentes para facilitar a captação de dívidas ou a entrada de sócios específicos para financiar os investimentos necessários em cada projeto.
Pilão estima que cada uma dessas áreas pode ser tão grande quanto a divisão tradicional de destinação de resíduos.
“Hoje, pelo nosso plano de negócios, a divisão de destino deve representar entre 15% e 20% de receita e Ebitda em três anos”, diz. “Quando eu transformo um aterro em ecoparque, tenho potencial para quadruplicar o Ebitda com as novas atividades.”
Capitalizada num setor extremamente pulverizado, a Orizon pretende continuar com seu plano de crescimento – tanto orgânico, quanto por meio de aquisições.
A maior parte dos ativos que entraram na base nos últimos meses veio da Estre, que está em recuperação judicial.
A Orizon já tinha se posicionado para a aquisição desde antes do IPO, comprando parte da dívida da Estre em uma operação estruturada com a gestora de ativos estressados Jive.
“A gente quer crescer em volume de tonelada fortemente, talvez não no mesmo ritmo porque a Estre acabou sendo um unicórnio no meio do caminho. Mas tem várias aquisições hoje em diligência, em avaliação, pra gente concretizar no próximo ano e meio”, diz Pilão.
Boa parte do foco da empresa, porém, está voltado para dar um upgrade nos aterros que já estão no portfólio – começando pelo setor de energia.
Biogás, biometano e fertilizantes
O exemplo do ecoparque de Paulínia, no interior de São Paulo, mostra o potencial de geração de valor. O aterro pertencia à Estre, com um Ebitda da ordem de R$ 45 milhões apenas com o serviço de destinação de resíduos.
No mês passado, foi inaugurada uma planta de geração de energia de 15,7 MW a partir do biometano, produzido com biogás gerado pelo metano emitido pelo lixo em decomposição. “Essa planta de energia vai gerar um Ebitda adicional do dobro desse tamanho, só utilizando 40% do biogás do aterro”, afirma o CEO. “Agora vamos fazer a instalação para aproveitar o biogás restante.”
Para colocar a usina térmica de pé, houve um investimento inicial de R$ 240 milhões, feito em parceria com o grupo Gera e a gestora Mercurio Partners, cada um com um terço do projeto. A Orizon também investirá R$ 60 milhões na planta de biometano, que é um equivalente do gás natural e pode também ser vendido também diretamente para empresas para substituir o diesel em frotas de veículos pesados, por exemplo.
A ideia é replicar o modelo em todos os ecoparques.
Ainda em Paulínia, a Orizon está dando partida a uma nova unidade de negócio, que deve começar a operar nos próximos três meses: uma planta de transformação de lixo orgânico em fertilizantes organominerais.
Sem citar nomes, o CEO afirma que a iniciativa faz parte de uma joint venture com uma empresa do setor, que traz o know-how de produção.
“É uma divisão bastante promissora, num momento em que o agro busca diversificar a oferta de fertilizantes seja por uma questão ambiental, seja por conta da dependência de produtos importados”, diz.
Resinas recicladas para bens de consumo
Outra avenida de crescimento está na reciclagem. A Orizon quer atuar até a ponta final, produzindo resinas plásticas recicladas para empresas de bens de consumo.
A companhia está investindo na compra de unidades de triagem mecanizada (UTMs), grandes máquinas que fazem a separação do lixo reciclável.
Uma dessas máquinas, nas quais a Orizon investiu R$ 70 milhões, opera no aterro do Recife. Em Paulínia, uma máquina mais antiga, que fazia a separação de uma miscelânea de resíduos vendida para cimenteiras (que os utilizam como combustível), está sendo reformada para fazer triagem mais fina.
“Nesse primeiro passo, a Orizon está vendendo recicláveis. Mas nosso plano de negócios para o futuro é ter dentro dos ecoparques plantas de beneficiamento e produzir resina reciclada, vendendo direto para o tomador final, uma Ambev, uma Unilever”, diz Pilão.
“Só pra você ter ideia o [material] reciclável é vendido a R$ 3,5 mil a tonelada. A resina é vendida a R$ 9 mil a tonelada.”
A obtenção de resinas recicladas pós-consumo é uma das grandes dores da indústria de bens de consumo. Grandes empresas de beleza e do setor de limpeza, por exemplo, têm tido dificuldade para cumprir suas metas de utilizar embalagens recicladas. A Orizon deve atuar com parceiros nesta ponta, o que pode incluir, entre outras possibilidades, contratos de adiantamento de compra para financiar a produção da resina.
“Como dono do aterro, eu tenho garantia de matéria-prima para contratos de longo prazo”, diz o CEO.
Créditos de carbono
Considerada uma opcionalidade pelos investidores durante o IPO, a venda de créditos de carbono está começando a ser sofisticada pela companhia.
A Orizon já gerava créditos em parte de seus aterros, mas a maior parte ainda era no ambiente do Mercado de Desenvolvimento Limpo, do Protocolo de Kyoto, vendido a preços mais baixos no mercado.
Desde 2021 a companhia começou a migrar esses projetos para o mercado voluntário, os cadastrando em credenciadoras como Verra e Gold Standard.
No ano passado, a empresa gerou e vendeu 1,6 milhão de créditos de carbono, por cerca de US$ 4 a tonelada, a maior parte deles no fim do ano, afirma Pilão. Para este ano, considerando apenas os mesmo ativos pré-aquisições, o volume deve passar para 2 milhões de toneladas.
No meio do ano que vem, com os ativos da Estre, isso deve quase dobrar, para algo um pouco abaixo dos 4 milhões de toneladas, estima o executivo.
A maior parte dos créditos gerados pela companhia vem do metano evitado, equivalente ao biogás que a Orizon captura dos aterros e deixa de ir para a atmosfera. Cerca de 5% a 10% vêm da transformação desse biogás em energia renovável, que substitui fontes fósseis e evita emissões.
Com o aumento da demanda, os preços já estão na casa dos US$ 7, diz o executivo. “Se você olhar o número de empresas que se comprometeram com diminuição de emissão nos próximos dez anos, a tendência é que esse preço só aumente”.
(Matéria atualizada para corrigir duas informações: A Orizon passou de cinco para 12 aterros — e não 15 — pelos quais passam todos os anos 8 milhões de toneladas, e não 15 milhões de toneladas, como informado na versão inicial da reportagem.)