OPINIÃO: A importância do REDD+ na redução de emissões de carbono

Reportagem do Guardian causou estardalhaço ao afirmar que mais de 90% dos créditos de carbono de desmatamento evitado não contribuem para reduzir emissões. Não é bem assim, escreve Bruno Matta, da brCarbon

OPINIÃO: A importância do REDD+ na redução de emissões de carbono
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A conservação das florestas é fundamental para manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C. No entanto, apesar da sua inegável importância, o sistema econômico valoriza apenas as commodities provenientes da floresta desmatada – madeira, minerais, produtos agropecuários. 

O mercado de carbono visa corrigir essa distorção, valorizando os serviços ecossistêmicos prestados pela floresta em pé, tais como sequestro e manutenção do estoque de carbono, regulação hídrica, entre outros serviços que a floresta presta e dos quais toda a sociedade depende.

Recentemente, essa estratégia foi alvo de duras críticas. Uma reportagem publicada em janeiro pelo The Guardian afirmou que 94% dos créditos de desmatamento evitado (os chamados REDD+) certificados pelo padrão Verra – o mais utilizado no mercado – falham em garantir a redução efetivada de emissões de gases de efeito estufa.

Diferentes organizações do setor refutaram prontamente a afirmação, apontando inconsistências e falhas nos estudos que sustentavam a notícia. 

No cerne, está a questão — admitida pelos próprios autores do estudo — de que os pontos de controle utilizados para basear a análise não levam em consideração as condições locais de cada um dos projetos analisados. 

Isso faz toda a diferença, especialmente no caso de um país continental como o Brasil. 

Fatores locais são cruciais para definir a eficiência de projetos de REDD+. Como diz o próprio nome, os créditos são gerados a partir do desmatamento que foi evitado, ou seja, é preciso conhecer a pressão de derrubada da floresta em cada região que se pretende conservar.

A questão central é: qual é o impacto dos projetos REDD no enfrentamento à crise climática?

De acordo com os dados do Observatório do Código Florestal, existem aproximadamente 281 milhões de hectares de vegetação nativa remanescente em imóveis rurais no Brasil, sendo que 193 milhões de hectares (69%) estão legalmente protegidos de desmatamento em áreas de Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente. 

Os outros 88 milhões de hectares (31%) são excedentes de Reserva Legal que podem ser legalmente desmatados. Caso todo esse desmatamento legal ocorra, há o potencial de que sejam emitidas em torno de 18 bilhões de toneladas de CO2 — o equivalente a cerca de sete anos de emissões do Brasil.

Existe o cenário em que o proprietário rural abre mão de desmatar legalmente uma área de floresta, sendo, portanto, necessário o uso de um instrumento financeiro para compensar o custo de oportunidade da floresta em pé. 

No sistema econômico atual, o crédito de carbono é um incentivo real que pode ser aplicado nessa situação com eficiência, pois visa reduzir as emissões de Gases do Efeito Estufa oriundas do desmatamento e da degradação florestal. 

Vale citar que, nos projetos de REDD, o proprietário compromete-se a manter as áreas conservadas por, no mínimo, 30 anos. 

Considerando que a floresta amazônica está perto de seu ponto de inflexão (ou seja, de perder a capacidade de se regenerar sozinha), e que sua savanização comprometeria o clima não só do Brasil, mas globalmente, toda e qualquer forma de evitar o avanço do desmatamento, que beira a 20% da área original, é bem-vinda.

Impacto nas comunidades

Outro ponto importantíssimo é o impacto nas comunidades localizadas nas áreas de projeto ou no seu entorno. Um dos padrões de certificação Verra é o CCB (Clima, Comunidade e Biodiversidade), que visa gerar benefícios para a população local, como ações na área de saúde, educação, bem-estar e emprego e renda, entre outras. 

Em alguns casos, são pessoas que vivem quase em situação de isolamento, e muitas não têm acesso a energia, água potável e serviços de saúde — 45% da população da Amazônia Legal está abaixo da linha de pobreza. 

Além da melhoria da qualidade de vida dessas famílias, os bons projetos de REDD investem em atividades de assistência técnica e de extensão rural, promovendo treinamentos de boas práticas agropecuárias para que as comunidades possam continuar produzindo com aumento de produtividade, sem expandir as áreas produtivas. 

Outro fomento é relacionado às atividades que ajudam a manter a floresta em pé, como o extrativismo sustentável de castanha, copaíba, entre outros produtos. Com a conscientização e engajamento das comunidades, aumentam as chances da conservação florestal ser mais bem-sucedida.

Biodiversidade

É importante, também, ressaltar sobre os benefícios à biodiversidade — 10% da diversidade biológica do planeta encontra-se na Amazônia. 

A conservação da floresta contribui diretamente na manutenção dos habitats dos animais, que continuam a ter áreas de alimentação e abrigo. 

Durante o levantamento e monitoramento da fauna e flora nas áreas de projeto, é gerado conhecimento sobre a riqueza e distribuição geográfica de espécies em áreas pouco ou nunca antes pesquisadas, como a identificação de espécies endêmicas e ameaçadas de extinção.

É claro que existem bons e maus projetos — e há melhorias a serem feitas nas metodologias e mecanismos para avaliar a integridade e seu impacto com precisão. 

Mas agir como se o conceito de projetos de conservação fossem apenas fumaça mina uma estratégia que vem trazendo resultados líquidos para a manutenção da floresta em pé. 

* Bruno Matta é engenheiro ambiental e CEO da brCarbon, climate tech que desenvolve projetos de créditos de carbono, incluindo REDD+