UE recua em metas de emissões para o agro depois de protestos

Setor é excluído de plano de redução de gases de efeito estufa com objetivos para 2040; extrema-direita tenta capitalizar insatisfação de fazendeiros

Protesto de agricultores em Bruxelas, Bélgica
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A União Europeia fez concessões importantes em seus ambiciosos planos de descarbonização depois de protestos de agricultores que chacoalharam as principais capitais do continente nos últimos dias.

A proposta apresentada nesta terça-feira prevê um corte de 90% nas emissões de gases de efeito estufa do bloco até 2040, em comparação com os níveis de 1990.

Mas a meta de redução de 30% nas emissões de metano, nitrogênio e outros gases associados à produção agrícola foi excluída do documento, elaborado pelo braço executivo da UE e submetido ao Parlamento Europeu.

A decisão é interpretada como uma manobra para apaziguar os produtores rurais às vésperas das eleições europeias, em junho. Existe o temor de que a insatisfação com as regras impostas por Bruxelas se traduzam em votos na extrema-direita.

O candidato mais votado na eleição parlamentar da Holanda, em novembro passado, foi o radical direitista Geert Wilders, cuja campanha se baseou no sentimento antiimigração e na rejeição das políticas climáticas europeias.

O novo pacote cobre todos os setores da economia e é parte central da estratégia de atingir a neutralidade de carbono em 2050, em linha com os compromissos assumidos no Acordo de Paris.

Agricultura e pecuária respondem por cerca de 10% dos gases de efeito estufa que os 27 países do bloco lançam na atmosfera – no Brasil o setor responde por 27% das emissões totais. A versão inicial do documento apontava o campo como “uma das áreas centrais para redução de emissões até 2040”, segundo o Financial Times.

Apesar da pequena participação relativa em termos de impacto climático, os agricultores são uma importante força eleitoral em diversos países da UE – a dificuldade de aprovar o acordo comercial com o Mercosul é uma das demonstrações disso.

“Sempre soubemos que os fazendeiros são cidadãos, e não queremos que ideologias de esquerda ditem o que eles têm de fazer”, afirmou Manfred Weber, líder do Partido Popular Europeu.

Ursula von der Leyen, que busca se reeleger presidente da Comissão Europeia na votação de junho, vai criar grupos de trabalho para ouvir as queixas dos produtores. Ela também voltou atrás em uma proposta que impediria plantações em determinadas áreas para permitir a regeneração natural da vegetação nativa.

O Parlamento Europeu – provavelmente com uma nova configuração mais conservadora depois do pleito de junho – terá a palavra final sobre as medidas apresentadas nesta terça.

O processo de aprovação das novas metas de corte nas emissões deve levar um ano. Além da resistência dos agricultores, são esperados embates sobre o prazo para o fim da venda de carros novos movidos a gasolina ou diesel (muitos países, porém, já anunciaram cronogramas próprios).

Caso implementado, o plano resultará em uma redução de 80% no consumo de combustíveis fósseis (incluindo o fim da queima de carvão para gerar eletricidade). O investimento necessário é estimado em € 1,5 trilhão anuais.

O custo adicional de ultrapassar o limite de 1,5°C no aumento da temperatura global ficaria em torno de € 2,4 trilhões na metade do século, segundo a proposta.