A parisiense NetZero, startup que tem plantas em Minas Gerais e Espírito Santo para produzir biochar, um bioinsumo feito a partir de resíduos agrícolas, acaba de captar cerca de R$ 97 milhões (€ 18 milhões) com o fundo francês de impacto STOA, focado em investimentos em infraestrutura e energia em mercados emergentes.
O biochar é o resultado de um processo em que a biomassa é submetida a altas temperaturas, sem oxigênio, e solidifica o carbono. A aposta da NetZero e outras startups é que o material contribua para o sequestro do gás poluente da atmosfera e ajude a reduzir o uso de fertilizantes químicos.
A NetZero chegou ao Brasil em abril do ano passado, com uma planta de biochar na cidade de Lajinha, em Minas Gerais, transformando cascas de café no carvão vegetal. Outra unidade, em Brejetuba (ES), entra em operação em abril, e recentemente foi anunciada uma terceira fábrica, em Machado (MG) – esta em uma joint-venture com a EISA, gigante do trading de café e algodão.
“Os recursos vão permitir que invistamos em novas plantas e em pesquisa e desenvolvimento”, diz Axel Reinaud, co-fundador e presidente da NetZero, em entrevista ao Reset. “Esse aporte também traz credibilidade, porque este é um fundo muito profissional, com experiência em investir em grandes títulos, em projetos de infraestrutura”.
O STOA foi criado em 2017 pela instituição financeira pública Caisse de Dépôts e pela Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) e conta com € 900 milhões sob gestão – 25% alocados no Brasil, o maior receptor de recursos do fundo entre países, diz Mathieu Lebègue, gerente regional do fundo para a América Latina.
O anúncio foi feito durante a passagem do presidente francês, Emmanuel Macron, pelo Brasil. A agenda oficial previa sua participação em um evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo na tarde desta quarta-feira.
O fundo espera que o aporte na NetZero tenha impacto positivo para o clima. Os indicadores acompanhados serão a remoção de carbono, a utilização de resíduos agrícolas e a redução do uso de químicos no campo. O biochar funciona como um condicionador do solo e permite a melhor absorção de nutrientes.
O STOA contará com uma participação na startup – o percentual não foi divulgado.
“A NetZero nos atraiu por sequestrar carbono de maneira rápida e pela ambição de escalar em outras geografias nas quais atuamos”, afirma Lebègue. Além do Brasil, a startup tem uma fábrica em Camarões.
O objetivo da NetZero é ter pelo menos 12 plantas instaladas até o fim de 2025 – cada uma custa cerca de R$ 20 milhões. A maioria deve ficar no Brasil.
No ano passado, a NetZero já havia captado outros € 18 milhões, em uma rodada que contou com a Stellantis Ventures, da multinacional fabricante de automóveis, o fundo de regeneração da natureza da L’Oréal e a CMA CGM, de logística marinha.
Um ano de Brasil
Na planta de Lajinha, inaugurada em abril, o biochar começou a ser produzido de maneira industrial em agosto. Desde então, foram 1600 toneladas do material. “A meta é produzir 3700 toneladas de biochar até o fim do ano”, diz Pedro de Figueiredo, co-fundador e CEO da NetZero Brasil.
A expectativa da startup é comercializar o biochar produzido aqui por um quinto do valor que prevalece na Europa, de € 1000 a € 2000 por tonelada.
Nesta primeira fase, a empresa opera numa espécie de ciclo fechado com cooperativas agrícolas. Os produtores cedem os resíduos que são a matéria-prima da NetZero e, em troca, podem comprar o biochar com desconto.
Hoje, a empresa trabalha com cafeicultores, mas o plano é replicar o modelo com plantadores de cana-de-açúcar ou milho.
A produção em Lajinha recebeu a certificação da Puro.earth, especializada em soluções de sequestro de gases de efeito estufa, para a geração de créditos de carbono de remoção.
A expectativa da NetZero é vender 6 mil créditos por ano. A primeira leva já foi pré-acordada com o banco de investimentos Rothschild & Co e o Boston Consulting Group (BCG).