O maior desafio do século 21 é fazer cumprir os direitos humanos de 10 bilhões de pessoas, garantindo um ambiente seguro, digno e justo para toda a humanidade e, ao mesmo tempo, proteger os sistemas planetários que sustentam a vida, viabilizando uma economia regenerativa e distributiva. A proposta para o enfrentamento global desse desafio está expressa na Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e no Acordo de Paris, entre outros.
Esse emergente paradigma civilizatório tem na inovação a sua “Alavanca de Arquimedes”, posto que fazer mais do mesmo e da mesma forma só replicará o que nos trouxe até o contexto atual, caracterizado pela deterioração crescente dos ecossistemas ambientais, sociais e econômicos globais. Os efeitos climáticos extremos, a desigualdade exponencial e as guerras são suas mais perversas evidências.
Enfrentar desafios complexos exige uma abordagem sistêmica, e a inovação necessária também precisa ser sistêmica – em todos os setores, formatos, interações e combinações. Podemos olhar para este cenário com a perspectiva do copo cheio – grandes oportunidades – ou do copo vazio – grandes ameaças.
A velocidade da mudança é um indicador interessante para entendermos que a maior parte dos líderes globais públicos e privados escolheram até aqui a perspectiva do copo vazio, resistindo e postergando as transformações necessárias.
Um exemplo? A Agenda 2030, pelo ritmo atual, será cumprida em 2100. Entretanto, a sensação de “turbulência” crescente parece nos indicar que não teremos o tempo para esperar a elevação de consciência que precede a mudança de escolhas. Precisamos de ações concretas, responsivas e contundentes, com um senso de urgência que inflexione a taxa de aceleração da transição.
Neste artigo inaugural como colunista do Reset, convido você a perceber o copo meio cheio, a partir de seis tendências que impulsionarão globalmente e cada vez mais rápido essa evolução civilizatória.
- Tsunami normativo e o ambiente regulatório. Há um movimento crescente sobre regulação e autorregulação para mudanças nas regras do jogo, com penalizações crescentes – legais e/ou mercadológicas – para os agentes econômicos que não estiverem em compliance. Eis alguns exemplos: Sustainable Finance Disclosure Report (SFDR), Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD), Corporate Sustainability Due Diligence Directive (CSDDD), Climate Disclosure da SEC, Better Business Act do Reino Unido, o SEC Climate Disclosure nos EUA, entre outros;
- Padronização das métricas de impacto e da gestão de indicadores. Para construir infraestrutura para a mudança de comportamento dos atores, há um esforço de harmonização das diferentes métricas utilizadas atualmente. A padronização dos indicadores de impacto ampliará a capacidade de mensuração, avaliação e comparação entre projetos, empresas, ativos e afins. As maiores evidências são o Value Reporting Foundation e o International Sustainability Standards Boards (ISSB).
- Novos paradigmas econômicos e movimentos coletivos. Há uma nova “lógica” que transcende a mitigação de impacto negativo e busca a geração de impacto positivo material, como os negócios sociais, os negócios de impacto, as benefit corporations, o Integrated Profit & Loss (IP&L), a Doughnut Economy e a Well Being Economy, entre outros.
- Comportamento de consumo consciente e formação de demanda. As novas gerações sendo empoderadas economicamente e chegando ao mercado com uma consciência ampliada sobre as marcas que são destruidoras ou construtoras de valor ambiental e social, predispostas a favorecer as últimas em suas escolhas;
- Comportamento de investimento consciente e produtos financeiros. Donos de recursos e capacidade de investimento, especialmente os novos herdeiros e as novas gerações empoderadas economicamente, pressionando os gestores do mercado a oferecer produtos alinhados ao impacto positivo e às melhores práticas ESG (ambiental, social e governança);
- Convergência dos atores públicos, sociais e privados e alianças estratégicas. Compreensão crescente de que a ação integrada, coordenada e convergente entre os atores é essencial, posto que nenhum deles é capaz de enfrentar sozinho a complexidade dos desafios presentes.
Toda essa “sopa de letrinhas” nos diz que há luz no fim do túnel. Para os que estão dedicados a essa agenda, é evidente a evolução quando comparamos o presente com o passado e podemos afirmar que estamos no sentido e na direção correta, mas com uma velocidade muito aquém da necessária.
Como podemos apressar a transição? Acelerando todas as tendências citadas acima, da melhor forma possível, com a maior potência possível. Cada um de nós e todos nós, estejamos onde estivermos e exercendo o papel que for, podemos diariamente fazer escolhas e tomar decisões que fortalecem ou enfraquecem a jornada da mudança necessária. Vale para as decisões individuais, familiares, profissionais, organizacionais e institucionais.
No meu caso, dadas as minhas intenções, competências e o papel que exerço organizacional e institucionalmente, escolhi dedicar meu tempo, conhecimento, energia e atenção para a busca incessante de sincronia, sinergia e sintropia entre empreendedorismo, inovação, finanças e impacto positivo. É o que me inspira, move e entusiasma, posto que traz integridade, sentido e significado para quem sou e o que faço.
Este é o ponto de partida. Nos próximos artigos, pretendo compartilhar com você reflexões sobre todos esses temas, com especial atenção e destaque para o tema das finanças sistêmicas a serviço de uma nova civilização.
Marco Gorini é investidor e empreendedor social, com mais de 25 anos de experiência. Co-fundou e é o CEO do Grupo Din4mo, conselheiro da Aliança pelo Impacto e co-líder do grupo de trabalho de mobilização de capital da Estratégia Nacional da Economia de Impacto (Enimpacto)