
“Trabalhando para que a floresta continue sendo floresta.” Pode soar como contrassenso, mas este é o lema da Madeflona, madeireira que opera em 141 mil hectares nas florestas nacionais do Jamari e do Jacundá, em Rondônia. Ela é uma das empresas que atuam na região amazônica sob concessão para manejo florestal sustentável.
Para garantir que de fato ele seja sustentável, com manutenção da floresta em pé e regeneração do que foi extraído, o trabalho é extremamente minucioso e cumpre regras rígidas. Todos os passos precisam ser reportados e aprovados pelo Ibama.
Um financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovado no fim de maio deve tornar a produção da Madeflona mais eficiente. A empresa obteve R$ 43,3 milhões do Fundo Clima, gerido pelo banco e vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
A verba será utilizada para a implementação de uma tecnologia de baixo carbono para secagem de madeira de espécies nativas, um sistema conhecido como kiln drying. Serão vinte câmaras de secagem e capacidade para processar anualmente 20 mil metros cúbicos de madeira tratada. A iniciativa visa aumentar a durabilidade e a qualidade dos produtos, além de reduzir custos. Será o primeiro maquinário desse tipo a ser instalado no norte do país.
Segundo Evandro Muhlbauer, sócio e diretor da Madeflona, o novo investimento será fundamental para a modernização industrial do processo. Na implementação, a empresa contou com capital do Banco da Amazônia, pelo Fundo Constitucional do Norte (FNO).
Como funciona o manejo
A Madeflona nasceu em 2008, quando o governo federal realizou a primeira concorrência pública florestal do país. Atualmente ela explora quatro áreas concedidas, chamadas de Unidades de Manejo Florestal (UMF) – duas na cidade de Itapuã do Oeste e outras duas em Candeias do Jamari e Porto Velho.
Embora atue em 141 mil hectares de floresta, apenas cerca de 2,5% dessa área é explorada. Em 2024, a área efetiva de exploração foi de 3,5 mil hectares, com pouco menos de 9 mil árvores colhidas. A conta pode fazer pouco sentido, mas é assim que funciona a matemática do manejo sustentável.
Antes que a motosserra seja ligada, é feito um mapeamento minucioso da floresta. Cada UMF é dividida em 30 talhões – ou pedaços. “Exploramos uma parte por ano. Quando chegarmos ao 31º ano, retornaremos à primeira”, diz Muhlbauer. Chamadas de Unidades de Produção Anual (UPA), essas áreas são inventariadas e todas as árvores são catalogadas com dados de altura, diâmetro, espécie e posição geográfica.
Com esses dados definidos, é possível selecionar quais árvores serão cortadas. Cada hectare de floresta tem cerca de 580 árvores com troncos com mais de dez centímetros de DAP, ou diâmetro à altura do peito – medida padrão em inventários florestais, o diâmetro do tronco medido a 1,30 metros de altura em relação ao solo.
Apenas de duas a três árvores são escolhidas para o corte, obrigatoriamente as com mais de 50 centímetros de DAP. “Elas não têm a mesma capacidade fértil que as com 20 a 40 centímetros”, explica o diretor.
Com elas escolhidas, um Plano Operacional Anual (POA) é apresentado ao Ibama, que então concede ou não a Emissão da Autorização de Exploração (Autex). Nem sempre é possível seguir com o plano inicial. “Se você percebe que tem um ninho de gavião-real naquela árvore, por exemplo, não dá para cortar”, diz Muhlbauer.
Além de definir quais árvores serão retiradas, é fundamental traçar o ângulo exato para a derrubada e o arraste, para que a floresta sofra o menor dano possível. O processo entre o mapeamento e a extração dura cerca de dois anos. De acordo com o diretor da Madeflona, é preciso tempo e cautela para tomar as decisões que manterão a floresta viva.
Toda a madeira deve ser registrada no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), controlado pelo Ibama. Para atestar o manejo sustentável, a empresa conta com certificações como FSC (Forest Stewardship Council) e PEFC (Programme for the Endorsement of Forest Certification). A madeira vendida para a Europa precisa também do certificado EUTR (Regulamentação da Madeira da União Europeia).
Produto para exportação
Hoje cerca de 70% da produção da Madeflona é destinada ao mercado externo – Alemanha, República Tcheca, Dinamarca, Estados Unidos, Canadá e Nova Zelândia são alguns dos compradores.
A madeira nobre é o principal produto da empresa, que vende especialmente para o mercado moveleiro e também para a construção civil e de linhas rodoviárias e ferroviárias. Os resíduos da produção são vendidos para empresas locais – parte como toretes, seções aproveitáveis da árvore, parte como lenha, utilizada na queima para geração de energia.
Para garantir a procedência e facilitar a rastreabilidade, a madeira leva um QR Code com informações como a data de derrubada da árvore, o número do documento de origem florestal e até mesmo dados sobre os veículos que transportaram as toras. Todos os caminhões são equipados com rastreadores, para que órgãos fiscalizadores possam acompanhar a movimentação da madeira em tempo real.
As regras impostas nas concessões são fundamentais para aumentar o valor da floresta e reduzir o desmatamento. Uma das contrapartidas nas licitações é que a empresa concessionária execute patrulhas periódicas em suas unidades. “Fazemos rondas e relatórios todos os dias. Os documentos são encaminhados para os órgãos de competência”, diz Muhlbauer.
André Vianna, diretor técnico do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), reforça que as concessões reduzem as chances de invasão. “A área está delimitada e tem maior atenção do Estado”, explica.
O manejo sustentável reduz também a exploração ilegal da madeira. “Embora a atividade ilegal não remova toda a floresta, provoca sérios danos ambientais e processos de degradação”, diz Karen Janones, professora da Universidade Federal de Rondônia (Unir).