
O financiamento global de projetos socioambientais de impacto enfrenta grandes desafios, sendo um deles o volume de investimento necessário para adaptação e mitigação das mudanças climáticas. Só para a recuperação de áreas degradadas na Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica, por exemplo, seriam necessários US$ 1 bilhão por ano até 2030, segundo estimativas da The Nature Conservancy.
Outro obstáculo relevante a ser superado é a assimetria na relação entre risco, retorno e liquidez desses projetos em relação a investimentos tradicionais, o que dificulta a indispensável participação do capital privado nessas iniciativas, com especial espaço ao capital filantrópico.
Sem o alinhamento entre essas variáveis, investidores relutam em alocar capital em projetos de impacto devido às incertezas sobre o retorno financeiro.
É nesse sentido que aumenta a importância do desenvolvimento de instrumentos inovadores de financiamento catalítico, ou seja, que combinem recursos de diversos agentes, como bancos multilaterais, organizações do terceiro setor, investidores privados e filantrópicos.
Nesse contexto, mecanismos de blended finance (ou finanças mistas) vêm se estruturando como um potencial alternativo para adequar as operações financeiras ao nível de risco do setor privado, visando proporcionar escala e atratividade para essas oportunidades.
Estudo recente realizado pela iniciativa colaborativa Go!Blended conclui que o blended finance traz impactos diretos na cadeia tributária, uma vez que gera novos fluxos de caixa e, ao mesmo tempo, contribui para a arrecadação de impostos. Com base na análise de experiências internacionais, para cada R$ 1 em investimento catalítico, outros R$ 4 são originados em capital comercial. Isso amplia o impacto dos projetos e cria um círculo virtuoso de geração de receita pública e impacto socioambiental positivo.
Uma iniciativa de blended finance que o Fundo Vale já apoiou, com aporte de R$ 3 milhões, foi o Amazônia Viva, um inovador mecanismo de financiamento lançado pela Natura, com a colaboração do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e da Violet. Com R$ 12 milhões em recursos, ele fortalece organizações, cooperativas e cadeias da sociobiodiversidade na região amazônica.
A atuação da iniciativa é híbrida. O Fundo Facilitador ECF (Enabling Conditions Facility), gerido pelo Funbio, entra com recursos não reembolsáveis voltados para a estruturação e o fortalecimento de cadeias da sociobiodiversidade amazônica. Já a Violet, por meio da emissão de um Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), oferece financiamentos com taxa de juros mais atrativas.
Outro projeto que recebeu apoio do Fundo Vale foi a emissão de CRAs da Belterra Agroflorestal no total de R$ 17 milhões. Os recursos foram destinados como capital de giro para 22 negócios comunitários, de culturas como cacau, castanhas e açaí, e quatro pequenas e médias empresas de impacto nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.
Mesmo com todos esses avanços, é preciso enfatizar que o blended finance não é uma solução única para a viabilidade do investimento em projetos socioambientais de impacto. Embora tenha mostrado resultados promissores, seu uso ainda está longe de ser plenamente explorado.
Apenas 10% dos investimentos de venture capital no Brasil são direcionados a teses de floresta e clima, segundo um estudo da KPTL, que teve suporte do Fundo Vale. A maior parte dos recursos se concentra em setores como energia, transporte e agropecuária, que possuem mercados mais consolidados. Realizado em parceria com a Impacta Finanças e apoiado pela Climate Ventures, o estudo foi baseado em um amplo levantamento de informações primárias e secundárias, com a participação de diversos atores dos ecossistemas financeiro e de impacto.
Há também desafios para o desenvolvimento de estratégias de governança que evitem o que já tem sido chamado de “blended washing“, ou seja, práticas nas quais o modelo é mal utilizado e não gera o impacto desejado. Tanto no Brasil quanto no mundo, é necessário o aprimoramento de processos de governança, com base em experiências práticas bem-sucedidas no financiamento da transição para uma economia sustentável e de baixo carbono.
Rodrigo Lauria é diretor de mudanças climáticas da Vale e Gustavo Luz é diretor do Fundo Vale