
O jovem tem, por si só, uma ampla capacidade inovativa e é um ser sonhador. Trazê-lo como parte essencial para a construção de soluções de inclusão produtiva – que serão ofertadas para eles mesmos – não é só um caminho desejável, mas imprescindível. É importante que tenham voz ativa no processo de reverter os desafios de geração de emprego e renda dignos para essa parcela da população.
Ao pensarmos nas juventudes rurais, isso se faz ainda mais urgente e necessário. São jovens que estão, hoje, habitando regiões com potenciais relevantes de desenvolvimento de atividades econômicas do futuro, como nas áreas verde e digital, mas que muitas vezes recorrem aos centros urbanos por falta de perspectivas em seus territórios de origem.
São jovens que demandam alternativas produtivas para que a terra não seja apenas uma área de produção agrícola, mas sim um espaço para a trajetória profissional, de oferta de oportunidades e de qualidade de vida.
O Brasil tem 7,8 milhões de jovens de 15 a 29 anos que residem na zona rural, segundo dados do Censo Demográfico de 2010. Eles são as maiores vítimas dos impactos das mudanças climáticas, encontram obstáculos no crédito para acesso à terra como proprietários ou arrendatários, têm pouca atenção para conseguirem empregos rurais não agrícolas.
Há uma escassez de programas de treinamento e infraestrutura para trabalho por conta própria, sem falar na falta de preparo em torno de temas atuais como a sustentabilidade e inclusão digital. Dados da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) mostram que a oferta de trabalho em áreas rurais é menos qualificada, fazendo com que o percentual de jovens que ocupam vagas de baixa produtividade seja de 57%, enquanto nos centros urbanos a taxa é de 18% para essa parcela da população.
O Brasil perdeu 4,3 milhões de moradores na zona rural e ganhou 16,6 milhões nas áreas urbanas, mostram dados do Censo 2022 divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Caminhos
É importante desenhar programas e políticas que ofereçam oportunidades de trabalho e renda aos jovens que desejem permanecer nas áreas rurais.
No Piauí, por exemplo, jovens que moram em territórios rurais estão tendo a oportunidade de mudar suas perspectivas de vida, de geração de emprego e renda, sem precisarem, para isso, migrar para outras localidades.
É uma nova possibilidade de inclusão produtiva digna que começa a ser desenhada e que pode ser espelho para que mais Estados criem políticas públicas direcionadas para jovens residentes das zonas rurais.
A estratégia faz parte de um plano local para engajamento da juventude rural em um programa de inclusão produtiva rural e sustentabilidade, que será executado em todos os territórios do Estado e que foi elaborado com a participação da Cátedra Itinerante de Inclusão Produtiva Rural, iniciativa cofundada e apoiada pela Fundação Arymax e sediada no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).
Um dos projetos é o ‘Juventude Rural Transformadora’, que selecionou 100 jovens do campo para curso de formação teórica e prática com o objetivo de que se tornem agentes transformadores da realidade socioeconômica e cultural de seus territórios, atuando junto às equipes da Secretaria da Agricultura Familiar do Piauí (SAF). Durante o período do projeto, os participantes receberão também uma bolsa mensal. Trata-se de uma iniciativa conjunta que inclui, além da SAF do Piauí, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí (IFPI), a Secretaria Estadual da Educação e o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).
São muitos esforços envolvidos para abrir novas possibilidades de qualificação profissional e inclusão produtiva para jovens da área rural. Ao olhar para essa experiência, a expectativa é que mais iniciativas assim sejam disseminadas ao redor do país.
O Brasil tem algumas ações em curso que podem contribuir com essa agenda, a exemplo do recém-lançado Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural, que tem como foco articular políticas públicas para promover o desenvolvimento sustentável nas áreas rurais por meio da sucessão familiar, da oferta de educação, saúde, trabalho e renda, para promover a melhoria da qualidade de vida das juventudes.
Há, ainda, os debates promovidos pelo Pacto Nacional da Inclusão Produtiva das Juventudes, que conta com contribuições do Poder Público, empresas privadas, e terceiro setor. Chama a atenção que, das cinco comissões que formam o grupo, uma é exclusivamente voltada para a inclusão produtiva rural, demonstrando a urgência desse tema no país.
O campo é um território que não se restringe a plantar e colher. Há toda uma cadeia de produção, consumo e restauração que pode não só ser mais sustentável, pensando na demanda atual do mundo, mas também mais inclusiva, especialmente para os jovens.
Vale lembrar, ainda, que a janela do bônus demográfico está se fechando. E, ao pensarmos nessa diminuição de jovens em relação à população geral, aqueles do campo também devem ser contemplados por ações intersetoriais e políticas públicas que ouçam suas soluções, assistam às suas demandas e garantam suas autonomias. Para isso, é preciso que os próprios jovens da zona rural sejam parte da transformação de suas realidades e de seus territórios.
* Vivianne Naigeborin é superintendente da Fundação Arymax, organização que atua na inclusão produtiva de pessoas em vulnerabilidade econômica em mercados promissores
* Mireya Perafan é pesquisadora da Cátedra Itinerante sobre Inclusão Produtiva Rural, organização cofundada e apoiada pela Fundação Arymax