Quem entrar na internet hoje procurando hospedagem em Belém para o período da COP30, entre os dias 10 e 21 de novembro, vai tomar um susto. Um anúncio no Booking.com mostra uma suíte com uma cama de casal, na região central da cidade, por R$ 1,3 milhão de reais.
Várias outras opções de residências aparentemente oferecidas pela primeira vez na plataforma, que tem hotéis e aluguéis temporários, mostram preços em torno de R$ 100 mil – cada diária.
Não parece provável que alguém se disponha a pagar por alguns dias de hospedagem uma quantia suficiente para comprar o imóvel. Mas, com hotéis 100% ocupados ou ainda não aceitando reservas (e com enormes filas de espera), estas são algumas das opções disponíveis para quem está se planejando.
Os governos federal e do Pará afirmam que segue como previsto o plano para alojar as dezenas de milhares de visitantes do mundo inteiro que vêm para a conferência do clima da ONU.
A dez meses do início da conferência, entretanto, ainda restam dúvidas sobre a capacidade de Belém acomodar a grande reunião climática global.
Além das delegações nacionais e dos credenciados com acesso à área controlada pela ONU, onde discursam os líderes e acontecem as negociações, espera-se na cidade um enorme fluxo de ativistas, movimentos sociais e povos indígenas.
A COP na Amazônia será a primeira em uma plena democracia depois de três edições em países que reprimem de forma violenta qualquer tipo de protesto e manifestações públicas por parte dos cidadãos: Egito, Emirados Árabes e Azerbaijão. A expectativa por ser ouvido pelas lideranças globais é grande.
Essa “COP do povo”, como dizem alguns, acontece em paralelo à COP “oficial”, que tem uma complexidade logística adicional: lidar com o aparato de segurança e as equipes que acompanham mais de uma centena de chefes de Estado e governo que virão para os dois dias reservados aos líderes.
Entre todos os desafios para Belém, o da hospedagem é que traz mais dúvidas, como reconheceu o governador paraense, Helder Barbalho, em uma apresentação dos planos feita durante a COP29.
Para muitos veteranos dessas conferências, o fim de uma COP marca o início da organização logística para a do ano seguinte. Muitos ouvidos pelo Reset ainda não fazem ideia de onde vão ficar na capital paraense.
Transatlânticos
Belém e região metropolitana têm 17,7 mil leitos de hotel. O número terá de triplicar até o começo de novembro.
Os novos leitos devem vir de diferentes frentes, segundo a Casa Civil, que abriga o órgão responsável pela infraestrutura para o evento. Pelas contas do governo federal, o plano é ter espaço para acomodar 26 mil pessoas a mais do que a capacidade atual da cidade. As soluções incluem:
. Quase 1.100 novos leitos na rede hoteleira, contando reformas e novos empreendimentos;
. Outros 1.200 em alojamentos de igrejas;
. As Forças Armadas fornecerão cerca de 2.300 acomodações;
. Adaptações em escolas devem acrescentar outras 5.200.
Uma parte importante vem pelo mar: o plano é levar transatlânticos no porto de Belém e usá-los como hotéis flutuantes.
Bem, este era o plano. A ideia de dragagem necessária para que os navios tivessem condições de atracar foi abandonada na semana passada, por causa de ameaças ao corpo hídrico e à fauna local.
As embarcações agora ficarão estacionadas no Porto do Outeiro, a 30 quilômetros do Parque da Cidade, onde será realizada a conferência. Sem trânsito, o trajeto toma cerca de 50 minutos.
O Estado está realizando “obras de mobilidade urbana para facilitar a logística de transporte, incluindo uma ponte em construção que vai encurtar a viagem entre Belém e o Distrito de Outeiro”, disse o governo paraense, em nota. A contratação dos navios, por sua vez, cabe ao governo federal.
Airbnb do milhão
A maior contribuição virá do aluguel temporário de casas e apartamentos via serviços como Airbnb e Booking.com. A expectativa é que quase 11,5 mil leitos sejam disponibilizados nessas plataformas online.
O governo do Pará estabeleceu uma parceria com as duas empresas para incentivar o cadastro de novos anfitriões. Desde agosto passado o Airbnb trabalha com o Sebrae para capacitar famílias interessadas em acolher em quartos ou colocar para alugar suas residências durante a COP30.
Já o Booking.com está divulgando materiais informativos e realizando workshops trimestrais para locações de temporada e também para hotéis da região.
“A sociedade está compreendendo a oportunidade que isso significa. Essa será uma injeção de recursos direta nas famílias, que terão uma oportunidade de renda por essa modalidade de aluguéis de temporada”, disse Barbalho em sua fala na COP do ano passado.
Ambas as empresas estão notando um aumento gradual na oferta de imóveis. Mas nada comparado ao que se observa nos preços encontrados por quem faz uma busca.
O anfitrião de um flat com uma única cama de casal anunciado no Airbnb pede R$ 220 mil – mais de 20 vezes o preço para o mesmo intervalo em outra época do ano. Ele afirma ter calculado o preço com base em uma estimativa da administração do condomínio, que prevê diárias em torno de 2 mil euros (ou R$ 12.484).
O preço é comparável ao que se paga para ficar no Four Seasons, um dos hotéis mais luxuosos de Paris.
Airbnb e Booking são marketplaces e não interferem nos valores dos aluguéis – essa é uma responsabilidade dos anfitriões. Pedir por onze dias de uso uma quantia equivalente à compra de um apartamento é uma coisa; encontrar alguém disposto a pagar é outra bem diferente.
‘Vila olímpica’
Os negociadores terão alojamento garantido em uma espécie de “vila olímpica” próxima ao local onde acontecerão as reuniões. Com cerca de 500 quartos com padrão de hotéis cinco estrelas, o prédio depois será convertido em escritórios do governo estadual.
Mas muitos dos outros credenciados para a COP30 – representantes de universidades, ONGs, universidades, governos subnacionais, bancos e empresas – terão de recorrer a outras alternativas.
Não se sabe com exatidão nem sequer quantos serão os inscritos para a chamada Zona Azul, onde ocorrem as reuniões oficiais e é montada a “feira”, com estandes nacionais.
No ano passado, o governo federal falou de um limite de 50 mil crachás. A COP29, em novembro passado, no Azerbaijão, teria o mesmo teto, mas o total de credenciais emitidas chegou a 65 mil. Na COP de Dubai, no final de 2023, houve mais de 100 mil pessoas credenciadas.
Investimentos
O Governo Federal destinou R$ 172 milhões do Fundo Geral de Turismo (Fungetur) para melhorar os serviços turísticos e ampliar a rede hoteleira da região de Belém, informou a Casa Civil.
Já a administração estadual está incentivando a modernização da rede hoteleira atual e isentou o setor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS, imposto estadual) nas compras internas e interestaduais equipamentos como frigobar, televisão e ar-condicionado, e mobiliário.
“A rede hoteleira da capital está sendo ampliada com a construção de novos empreendimentos hoteleiros por grupos internacionais que vão atender as categorias de público A e B. Um dos hotéis vai ocupar três galpões na área do Porto Futuro II, outro será instalado em um antigo prédio que pertencia à Receita Federal, o terceiro no bairro do Reduto, em Belém, e o quarto em Castanhal, na Região Metropolitana de Belém”, informou o governo paraense.
O Estado também firmou uma parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Sustentável (BNDES) para fornecer crédito para diferentes ramos do turismo, de hotéis a restaurantes.