Olha o que ele fez! Olha o que ele fez!
O leitor de uma certa idade vai se lembrar da narração histórica de Galvão Bueno em um gol de Ronaldinho Gaúcho. O ex-jogador está credenciado para a COP29, a convite da presidência azerbaijana. Nos tempos de Barcelona, os espanhóis o apelidaram de El Brujo (o bruxo). “O homem fazia chover em campo, quem sabe não corta as emissões de carbono também?”, disse um jornalista brasileiro num grupo de WhatsApp. A COP29 acontece num estádio. Vai que…
O que ele está fazendo na COP?
Ronaldinho veio fazer em Baku ninguém sabe com certeza. Na tarde desta quarta-feira ele foi visto visitando o estande da Azchemco, uma empresa azerbaijana, na Zona Verde. Trata-se de uma área separada de onde acontecem as negociações oficiais e dos espaços montados pelos países.
Outra explicação especulativa – mas plausível – é que ele tenha vindo emprestar seu star power para o evento. O futebol é uma maneira de dar um gás no soft power dos países petroleiros. Cristiano Ronaldo e Neymar (por enquanto, ele estaria negociando uma transferência) jogam em times da Arábia Saudita. O país também lançou uma liga de golfe profissional para concorrer com a americana PGA e a European Tour. Pagando luvas exorbitantes, a LIV roubou vários golfistas internacionais.
Crime ambiental
Ronaldinho já teve o passaporte apreendido por conta de um crime ambiental. Em 2015, ele e o irmão, o ex-atacante Assis, foram condenados por dano ambiental ao rio Guaíba. Os dois ergueram de forma ilegal em Área de Preservação Permanente (APP) um trapiche, um ancoradouro e uma plataforma de pesca. Em 2018, pela falta do pagamento da multa, a Justiça determinou a retenção dos passaportes dos dois. No ano seguinte, fez acordo de R$ 6 milhões com o Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul, pagou a multa e teve o passaporte de volta.
Sportswashing
O investimento massivo em esportes profissionais faz parte de uma “reformulação de marca” da Arábia Saudita, mas segundo este artigo do Atlantic Council o objetivo vai além do marketing. Direitos esportivos são considerados um dos últimos bastiões de defesa da TV linear contra o crescimento do streaming e do entretenimento sob demanda.
Grande Prêmio
Baku, é claro, sedia uma etapa do campeonato de Fórmula 1 desde 2017. O circuito é montado nas ruas da cidade, o que dá ao país a oportunidade de mostrar seus prédios modernos para telespectadores do mundo inteiro. Não tem o mesmo charme e tradição de Mônaco, mas com o ressurgimento do interesse pela modalidade (graças a uma série da Netflix), o Azerbaijão entrou para o calendário esportivo mundial. (Este ano, o vencedor da corrida foi o australiano Oscar Piastri, da McLaren.)
Caiu do céu
Ilhan Aliyev, presidente do Azerbaijão, abriu na terça-feira, 12, a participação de chefes de Estado e governo afirmando que os combustíveis fósseis são um “presente de Deus”. O anfitrião da COP29 introduziu o tema de petróleo e gás em seu discurso com uma admissão: “O tema não é popular em uma conferência do clima, mas sem ele meus comentários não seriam completos”.
‘Fake news’
O país perfurou o primeiro poço de petróleo industrial do mundo, em 1846. Na segunda metade daquele século, chegou a ser responsável por mais da metade da produção petrolífera mundial. “Se na época políticos e a mídia ocidentais nos chamassem de petroestado, provavelmente seria aceitável. Hoje isso não é justo e só demonstra falta de conhecimento político e cultural”, afirmou Aliyev. O Azerbaijão é responsável por somente 0,7% do petróleo e 0,9% do gás natural produzidos globalmente – mas metade do seu PIB e 93% de suas exportações são dependentes de combustíveis fósseis. “Mas a mídia fake news do país número 1 em produção nos chama de petroestado.” Ele estava se referindo, é claro, aos Estados Unidos.
Autocracia
Aliyev está no poder há 20 anos. Ele sucedeu seu pai, Heydar Aliyev, que chegou ao poder em 1993, dois anos após a independência da ex-União Soviética. O Azerbaijão é uma típica autocracia. O país realiza eleições regularmente, mas elas não são consideradas livres por observadores internacionais. Na mais recente, em fevereiro, Aliyev foi reconduzido ao cargo com 92% dos votos. A oposição é perseguida, discordâncias públicas não são toleradas e não há imprensa independente no país.
Mission 1.5
O novo governo britânico, no poder há apenas quatro meses, foi a primeira economia industrializada a submeter seu novo plano de descarbonização (NDC). O país se compromete com um corte de 81% de suas emissões de gases de efeito estufa em 2035, em relação a 1990. Uma comparação direta com a meta brasileira não é possível pois os cálculos usam anos-base diferentes, mas o centro de estudos Climate Action Tracker afirma que o alvo britânico está alinhado com a meta de 1,5°C. O número do Brasil, segundo analistas, não.
Acelerando
Com a eleição de Trump nos Estados Unidos e a extrema direita ganhando força nos países que ancoram a União Europeia, o Reino Unido tem ambições de ocupar espaços vagos na diplomacia climática global. O primeiro-ministro Keir Starmer lidera o primeiro governo do Partido Trabalhista (centro-esquerda) no número 10 da Downing Street em 14 anos. Starmer derrubou a proibição de novos projetos de usinas eólicas em terra e prometeu não conceder novas licenças de exploração de petróleo no Mar do Norte. Em setembro, o berço da Revolução Industrial fechou sua última termelétrica movida a carvão.