Lula elegeu-se, foi à COP27 e iniciou seu governo prometendo recolocar o Brasil nos trilhos da corrida global para zero carbono. Seus ministros precisam agora construir as condições para que essa entrega vá além de marcar uma trilha diferente da percorrida pelo governo antecessor.
Recentemente, o Ministério da Fazenda sinalizou à imprensa que está gestando um pacote de transição, contendo uma diversidade de instrumentos econômicos – ainda sem detalhar como eles vão funcionar na prática.
Entre bioeconomia, indústria verde, mercado regulado de carbono, adaptação climática da infraestrutura, o gesto do governo é bem-vindo.
Mas essa proposta precisa ser mais que um balão de ensaio para fins de posicionamento político, e ter efeitos concretos sobre as políticas públicas.
Haddad e os demais ministros do novo governo têm a missão de criar os instrumentos de alinhamento da nossa economia com o Acordo de Paris. Isso inclui regulamentação, planos e, por favor, carteiras de projetos e financiamento estratégico que acelerem nossa descarbonização para cumprir as metas de curto prazo da NDC e rumo à net zero.
Longe da meta
O tempo urge. Apesar de sermos um país com matriz elétrica majoritariamente limpa e com alto potencial de conservação natural, estamos muito mais distantes de descarbonizar do que imaginamos.
Essa foi a conclusão da primeira medição do Índice da Nossa Descarbonização (INDC), que agrega os setores emissores para indicar qual o ritmo da transição no Brasil, pelo olhar do esforço governamental.
A primeira rodada do INDC, contemplando os anos de 2021 e 2022, diz o seguinte: numa escala de 0 a 100, sendo 100 o cenário de redução das emissões até 2030 em linha com neutralidade climática em 2050, registramos um esforço de apenas 19,5 pontos por parte da União no fim de 2022. Do ponto de vista de impacto, não passamos de 9,8 pontos.
Isso significa que mesmo que o Brasil tenha metas climáticas no papel e com força de lei, ainda não atua nem investe para alinhar nossa economia a zero emissões.
A expectativa é que o novo governo mude essa situação ao longo dos seus quatro anos de mandato, com algum efeito já visível no INDC a ser rodado antes da COP 28, em novembro próximo.
E quem pode fazer isso é o governo federal, a quem cabe leilões de energia elétrica, embargos de propriedades desmatadas, acesso a dados críticos sobre regularização ambiental, entre outros. E são esses indicadores de política pública que precisam se alinhar, um a um e em conjunto, com os objetivos do Acordo de Paris.
Acelerando o passo
Até hoje, o Brasil não perdeu a chance de descumprir metas climáticas voluntárias: não alcançou a redução de 80% do desmatamento amazônico em 2020, apesar de ter passado perto lá em 2012.
A próxima meta a (des)cumprir — agora vinculante — é a que consta da NDC submetida pelo país junto ao Acordo de Paris para o ano de 2025. Mesmo com as “pedaladas” dos anos Bolsonaro, ela se mantém distante.
Ano passado, nosso nível de emissões foi duas vezes maior do que o prometido para o período.
Tendo em vista que o Brasil almeja sediar uma Conferência das Partes da ONU em solo amazônico justamente em 2025 (a COP30 ou Paris+10) e que um dos assuntos inevitáveis dela será o cumprimento do primeiro ciclo de NDCs, está mais do que na hora do governo brasileiro acelerar o passo.
A liderança federal importa: o governo Lula-Alckmin precisa apertar todos os botões que tem à mão para colocar a política climática em operação, em todos os setores. E programar o desenho de uma estratégia de longo prazo capaz de guiar ações e financiamento para alcançarmos o net zero real, o quanto antes for possível e sem sacrifícios.