As bactérias (do bem) de R$ 1,2 bi que invadem o agro brasileiro

Em sete anos, a SuperBac multiplicou em mais de 40 vezes seu faturamento colocando biotecnologia nos fertilizantes tradicionais

Cientista trabalha no laboratório de inovação da SuperBac
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A história de uma das empresas que mais crescem no agronegócio brasileiro começou 27 anos atrás, nas tubulações de uma fábrica de chocolates obstruídas por acúmulo de gordura.

Luiz Chacon Filho teve a ideia de usar microorganismos para fazer o serviço de limpeza, e ali foi gerado o embrião da SuperBac, companhia que hoje fatura R$ 1,2 bilhão com a venda de fertilizantes biotecnológicos.

Os primeiros anos de vida foram inteiramente voltados ao setor industrial (um dos produtos é um composto de bactérias que “comem” óleo de vazamentos), mas o negócio cresceu de forma explosiva nos últimos sete anos, quando a companhia decidiu voltar suas atenções ao campo.

A combinação inovadora de bactérias com fertilizantes tradicionais, o que aumenta o aproveitamento dos nutrientes, multiplicou a receita da companhia em mais de quarenta vezes nesse período.

Em meados de julho, a SuperBac recebeu um aporte de R$ 300 milhões do fundo de private equity da XP Asset para entrar em outro mercado bilionário das grandes fazendas: os defensivos agrícolas.

O propósito segue o mesmo, diz o diretor de inovação, Giuliano Pauli: “Aprender com a natureza”. A empresa busca microorganismos em terra e nos oceanos para desempenhar as mesmas funções de produtos químicos.

Além do ganho de performance, a empresa aposta numa agricultura cada vez mais preocupada com a saúde geral do solo, o que inclui o sequestro de carbono. “A ideia geral é usar bioinsumos sempre que possível e compostos químicos só quando necessário”, diz Pauli, 

Meio a meio

O carro-chefe da SuperBac é a linha de fertilizantes Supergan, que une os três principais macronutrientes usualmente consumidos pela agricultura – nitrogênio, fósforo e potássio, trio conhecido como NPK – e um blend de bactérias.

Ou seja, o produto não dispensa os macronutrientes tradicionais, mas os organismos vivos ajudam a melhorar a absorção desses minerais pelas plantas, diz Pauli. 

Dependendo das condições do solo, as plantas só costumam aproveitar de 30% a 50% do fertilizante comum. “Quando acoplamos nossa tecnologia, o percentual sobe para até 80%.”

O mix de bactérias foi selecionado de uma biblioteca de mais de 4 000 espécies isoladas e sequenciadas geneticamente pela SuperBac.

Essa coleção, um dos maiores ativos da companhia, fica guardada num freezer a -80°C no laboratório de biologia molecular da empresa em Mandaguari, no norte do Paraná.

Os microorganismos vêm todos da biodiversidade brasileira, e nenhum deles é modificado geneticamente. Não são, portanto, patenteáveis.

Mas os processos para combiná-los e garantir que eles possam seguir vivos depois da mistura com os fertilizantes tradicionais são exclusivos, diz Pauli.

“Você está basicamente colocando o organismo vivo num meio que o agride. Esse processo para estabilização e compatibilidade tem muita ciência.”

Agricultura regenerativa

Além do laboratório, a SuperBac tem três plantas: uma de fermentação, onde são cultivadas as bactérias, outra que as transforma em pellets (misturadas com matéria orgânica) e finalmente a que realiza a mistura com os compostos NPK.

A fórmula do blend de bactérias é sempre a mesma e corresponde a 50% do produto final. A linha tem cerca de 300 variações com diferentes combinações da metade que leva o NPK.

O produto tem preço similar ao de um fertilizante premium. Um dos argumentos de venda da empresa é que o componente biotecnológico traz benefícios adicionais.

“Falamos não só em nutrir a planta, mas também regenerar o solo”, afirma Pauli.

Ele enxerga um ponto de inflexão na agricultura brasileira.  “Até bem pouco tempo atrás, só se olhava para as características químicas [da terra]. Tenho X quilos de nutriente, minha planta vai extrair Y, preciso colocar Z.”

Em parte com a disseminação das ideias da agricultura regenerativa, os aspectos físicos e de diversidade biológica vêm recebendo mais atenção.

Mas o trabalho de convencimento do agricultor é lento. “Ele começa em 1% da área. Tem bons resultados, mas diz que é porque choveu bastante naquele ano. Depois passa para 3%, aí para 5%…”

Mais de 5 milhões de hectares já receberam aplicação dos produtos biotecnológicos da SuperBac. Os maiores clientes são plantadores de soja (responsáveis por metade dos fertilizantes consumidos no Brasil), seguidos pelas culturas de milho, cana e trigo.

Mesmo sendo uma das líderes desse segmento, a empresa detém apenas 0,7% do mercado nacional. “Olhe a janela que temos para crescer.”

Defensivos biológicos

A companhia aguarda a liberação sanitária de dois novos produtos para entrar em outro negócio crucial para o agronegócio: a proteção da lavoura.

Um bionematicida e um biofungicida foram submetidos para a aprovação do Ministério da Agricultura. A empresa afirma não ter previsão de quando receberá o OK.

A diferença dos defensivos para os biofertilizantes é que eles são de base 100% biológica. Mas Pauli afirma que é irreal esperar uma agricultura sem o uso de produtos químicos.

“Os dois sempre vão trabalhar juntos. Não existe panaceia para uma agricultura brasileira, que é enorme e tem alimento para pragas e doenças o ano inteiro.”

Pauli acredita que o produtor tende a um manejo mais integrado, para otimizar a eficácia dos dois tipos de defensivos e também com vistas a uma possível remuneração pela fixação de CO2 no solo. “Hoje ele ainda não consegue monetizar o carbono, mas em algum momento isso vai acontecer.”

Volta às origens

O aporte recém-fechado com o fundo da XP também vai permitir à Superbac voltar as atenções para o segmento em que começou a atuar, o industrial. Setores como petróleo e gás e tratamento de resíduos, por exemplo, receberão mais recursos para investir em estrutura comercial e inteligência de mercado.

Vender serviços utilizando a capacidade ociosa das plantas também será uma fonte de receitas, segundo Pauli.

“Montamos uma das maiores biofábricas da América Latina, com um horizonte de 10 a 15 anos. Enquanto não atingimos a capacidade total, ajudamos outras companhias a desenvolver e escalonar seus próprios produtos.”

Os equipamentos de fermentação podem ser utilizados para a cultura de bactérias probióticas para a indústria de alimentos ou então de matérias-primas para fabricantes de cosméticos.

O potencial do mercado brasileiro significa que a exportação não está nos planos, pelo menos por enquanto. Mas, quando estiver, ela certamente vai se beneficiar da biodiversidade nacional.

“Não existe lugar melhor para uma empresa de biotecnologia que o Brasil”, afirma Pauli.